Título: Para governo, turbulência moderada no Brasil
Autor: Bôas, Bruno Villas
Fonte: O Globo, 07/05/2010, Economia, p. 33
Equipe econômica prevê desvalorização pequena do real. BC admite que cenário externo pode afetar juros
BRASÍLIA. O Brasil deverá viver, a curto prazo, uma turbulência financeira moderada, cujo primeiro sinal foi o estresse de ontem nos mercados, segundo avaliação da equipe econômica. Este período será caracterizado pela fuga de capitais e um possível enxugamento do crédito no exterior. Mesmo assim, os técnicos projetam uma leve desvalorização do real frente ao dólar, sem efeito profundo sobre a inflação e as contas externas. A equipe econômica está confiante em relação à capacidade de o Brasil superar eventual transtorno nos mercados e, por isso, não está preocupado com o cenário europeu ¿ embora parte dos técnicos creia em contágio na zona do euro, o que poderá elevar a tensão nas próximas semanas. O principal muro de contenção são as reservas internacionais, que hoje somam US$ 249,655 bilhões. Pesam também a boa condição de solidez e liquidez dos bancos nacionais, a baixa exposição a ativos europeus do sistema financeiro, das instituições públicas e do governo, a atratividade do país para investimento produtivo (ante projetos de infraestrutura e a expansão do consumo das famílias) e o volume de dólares que os exportadores mantêm no exterior. ¿ Com a crise na Europa, é natural o efeito manada do mercado, avesso a riscos. Muitos investidores vão querer correr para o dólar, que é porto seguro. Mas isso não significa que o real sofrerá uma desvalorização abrupta ¿ disse um técnico. Outra fonte da equipe lembra que os indicadores financeiros, ainda que tenham oscilado nos últimos dias, não demonstraram uma tendência firme de deterioração. Inclusive o câmbio. Em alguns casos, a moeda brasileira vai se desvalorizar mais pela influência das operações nos mercados futuros, por exemplo, do que exatamente pelo saque em massa dos investidores. O cenário internacional turbulento está no radar do Banco Central (BC) para orientar a condução da política monetária no país e, se houver um agravamento, poderá ter peso ainda maior do que o atual na definição futura dos juros. Por ora, o que norteia as decisões da autoridade monetária é o mercado interno, que vive sob forte pressão de demanda, gerando inflação. Foi isso que levou o BC a decidir-se, na semana passada, por uma alta de 0,75 ponto percentual na taxa Selic. Ao divulgar, ontem, a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que elevou a Selic de 8,75% para 9,5% ao ano e interrompeu período de 19 meses sem altas, o BC deixou claro que o nível de atividade está bastante elevado. Por isso, agiu de forma ¿incisiva¿ na semana passada. A exposição de motivos e do cenário deixou o mercado certo de que novas altas ¿ e na mesma proporção ¿ virão nos próximos encontros. O economista-chefe do banco Fator, José Francisco Gonçalves, disse estar claro que o BC enxerga uma inflação de demanda no Brasil. Ou seja, o consumo está crescendo mais rapidamente do que a oferta de bens e serviços, pressionando a inflação. O mercado vê o IPCA este ano em 5,42% e, em 2011, em 4,8%. Ambos acima do centro da meta do governo, de 4,5%.