Título: Investir na pequena agricultura é essencial para o desenvolvimento
Autor: Nwanze, Kanayo F.
Fonte: Correio Braziliense, 16/06/2009, Opinião, p. 2

Presidente do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida), uma instituição financeira internacional e agência especializada das Nações Unidas.

O impacto da crise financeira sobre a América Latina e Caribe tem sido grave e amplo. Prevê-se redução geral do PIB regional: queda de 1,5% em 2009, após ganhos de 5,5% e 4,3% nos últimos dois anos. Os exportadores de produtos primários estão sendo afetados pelo declínio nas relações de troca. A redução da receita está aumentando a pressão sobre o orçamento dos governos.

As remessas, que beneficiam particularmente famílias e comunidades rurais e representam mais de 12% do PIB em sete países da ALC, registrará em 2009 sua primeira queda.

Embora a região ainda esteja no rumo certo para atingir o primeiro objetivo de desenvolvimento do milênio de reduzir pela metade a proporção de pessoas que vivem em situação de extrema pobreza e fome até 2015, alguns países provavelmente não o conseguirão, pois a crise global ameaça anular o progresso que eles fizeram em termos de redução da pobreza. A situação é particularmente crítica nas áreas rurais, onde mais da metade dos habitantes são pobres.

Agora mais do que nunca, é vital o investimento na agricultura, particularmente na pequena produção. As pequenas propriedades familiares fazem contribuição fundamental para a economia e a segurança alimentar dos países da região. Elas representam cerca de 40% da produção agrícola no Brasil e México e mais de 60% na América Central.

No entanto, os pequenos agricultores ainda estão entre os mais pobres da América Latina devido à falta de acesso à terra, tecnologias, serviços financeiros e mercados. O investimento na pequena agricultura é maneira eficaz de assegurar crescimento sustentável e inclusivo. Ele não só dá um forte impulso à produtividade e produção agrícola, contribuindo para a segurança alimentar e redução da pobreza, mas, também, apoia as comunidades rurais e promove um crescimento econômico mais amplo.

A agricultura familiar há muito constitui prioridade baixa na formulação de políticas; agora mais do que nunca é preciso corrigir esse desequilíbrio. A crise financeira demanda medidas de curto prazo, acompanhadas de uma visão de longo prazo, para proteger as famílias rurais vulneráveis.

Necessita-se urgentemente de quatro conjuntos de intervenções: primeiro, aumento do investimento em agricultura e desenvolvimento rural em todos os aspectos do ciclo de produção. Isso inclui infraestrutura, assistência técnica e serviços financeiros rurais. Segundo, o fortalecimento das capacidades, em cada país, em termos de políticas para reduzir a pobreza rural e promover instituições públicas eficazes. Terceiro, maior participação do setor privado nos serviços agrícolas, como financiamento e comercialização, e a formação de parcerias público-privadas. Quarto, a promoção da pesquisa agrícola para permitir o desenvolvimento e compartilhamento de tecnologias novas e melhoradas.

Com a função singular de ajudar os pobres a saírem da pobreza, o Fida tem compromisso firme com os governos e os agricultores de toda a região. O Fida contribuiu para o desenvolvimento da Reunião Especializada sobre Agricultura Familiar (Reaf), do Mercosul, como a plataforma regional das organizações nacionais de agricultores familiares, que se tornou um modelo de diálogo sobre políticas e cooperação Sul-Sul. O Ministério do Desenvolvimento Agrário do Brasil atribui prioridade às famílias agricultoras, servindo de exemplo para outros países da região.

Nas suas três décadas de existência, o Fida investiu mais de US$ 1,5 bilhão em programas de desenvolvimento rural e agrícola nos 32 países membros da região. Esses investimentos focalizados e direcionados, catalisando outros recursos humanos e financeiros, deram contribuição importante para a vida de milhares de pessoas. Algumas intervenções foram ampliadas por outras organizações, aumentando substancialmente seu impacto global. O Fida está preparando dois programas de desenvolvimento rural nos estados do Piauí e da Paraíba.

Há um imenso potencial não aproveitado nos habitantes rurais da América Latina e do Caribe. Os agricultores familiares precisam de insumos (fertilizantes, sementes, equipamento agrícola), recursos financeiros, acesso aos mercados locais e internacionais e conhecimentos técnicos. Se os governos nacionais, doadores, organizações internacionais, grupos da sociedade civil e organizações de agricultores puderem fornecer esses elementos essenciais, os agricultores da região têm a capacidade não só de sair da atual recessão, mas, também, contribuir para a recuperação das economias nacionais.