Título: 'A pessoa pode pensar em desistir'
Autor: Freire, Flávio; Menezes, Maiá
Fonte: O Globo, 09/05/2010, O País, p. 3
No Ceará, medicamento sumiu das prateleiras no início de janeiro
Para a dona de casa Credileuda Costa de Azevedo, de 39 anos, diagnosticada soropositiva desde 1993, a troca de medicamentos provocou efeitos colaterais severos. Para completar o coquetel de três medicamentos que utiliza diariamente, passou a usar o Didadosina desde fevereiro, quando seu estoque de Abacavir terminou. Foi quando começaram as náuseas, dores de cabeça intensas e diárias, e uma tosse persistente que a fez pensar que estaria com tuberculose.
Credileuda decidiu suspender a ingestão do medicamento por uma semana, por conta própria, para testar se era a causa do mal-estar. Depois da confirmação, voltou à medicação normalmente.
¿ Chega a desestimular. Se não tiver alguém para incentivar, a pessoa pode até pensar em desistir ¿ disse a dona de casa, contaminada pelo marido, já falecido.
Anastácio Queiroz, diretor do Hospital São José, onde ela recebe tratamento, procurou amenizar a queixa.
¿ Todo medicamento tem efeito colateral. O próprio Abacavir tem ¿ afirmou.
O Abacavir sumiu das prateleiras dos hospitais e postos de atendimento no Ceará no início de janeiro.
Só no Hospital São José, referência estadual para tratamento de doenças infectocontagiosas, onde 2.240 soropositivos recebem acompanhamento, cerca de 140 pessoas faziam uso do remédio. Em Fortaleza, três hospitais e um centro de especialidades médicas distribuem os medicamentos. A Secretaria estadual de Saúde alegou que não houve prejuízo porque o remédio em falta foi substituído por outros disponíveis.
No principal posto de atendimento a pacientes com Aids da prefeitura de Fortaleza, o Centro de Especialidades Médicas José de Alencar (Cenja), até sexta-feira pela manhã não havia previsão de quando chegaria uma nova remessa. No Hospital São José, da rede estadual, a resposta foi a mesma.
Francisco Edvando Oliveira, de 39 anos, espécie de ouvidor na Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV (RNP), foi uma das vítimas da falta do remédio. Há quatro anos, costumava tomar dois comprimidos diariamente.
Nesse período, sua saúde melhorou e os exames mostram que a carga viral não está detectável. Edvando tinha 27 anos quando se descobriu contaminado, em 1998.