Título: Para estancar a crise grega
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Fonte: O Globo, 11/05/2010, Opinião, p. 6

A cooperação internacional, se possível com ação rápida, mostrou-se mais uma vez a melhor forma de enfrentar uma grave situação financeira como a vivida atualmente pela Grécia.

Na atual economia globalizada, o crédito tem origem em diversas partes do planeta, e, assim, uma situação crítica de um país é capaz de se alastrar e assumir grandes proporções, mesmo que tenha sido detonada por um mercado considerado pouco relevante, em termos relativos.

O rombo acumulado pela Grécia de fato causa perplexidade, não só pela proporção que tomou, mas principalmente porque foi se agigantando sem que as regras do pacto pela estabilidade monetária de Maastricht, em cujas bases o euro se apoia, tivessem sofrido alteração.

A maquiagem feita pela Grécia em seus indicadores econômicos poderia até iludir credores longínquos, mas não parceiros tão próximos como os demais membros da União Europeia, em especial os que aderiram à moeda única.

A Grécia quebrou em decorrência do agravamento de um quadro de desequilíbrio que já existia antes da pior crise financeira com que o mundo se deparou em cinquenta anos.

Ou seja, o euro estava sob risco, mas isso não era visível para os de fora do pacto da estabilidade monetária europeia.

Teria sido possível agir antes que a situação se agravasse? Sempre é mais fácil criticar e apontar as decisões que deveriam ter sido tomadas, depois do fato acontecido e mensurado (é a chamada engenharia de obras feitas). Mas a verdade é que os parceiros da Grécia acharam que a própria dinâmica estabelecida pelo euro acabaria resolvendo os problemas, o que não se confirmou na prática, em face de um momento tão conturbado como o causado pela crise financeira de 2008/2009.

A relutância em agir, quando a Grécia deu sinais de que caminhava para a insolvência, espalhou a crise pelo Mediterrâneo, e a conta agora aumentou.

Mas ainda há tempo para se dissipar o rastilho de pólvora, e evitar que a Grécia arraste para o fundo do poço outros países e mercados.

Uma ação coordenada da até então reticente União Europeia, lado a lado com o Fundo Monetário Internacional, será capaz de garantir o refinanciamento das dívidas soberanas (governamentais) até que os mercados se sintam mais seguros.

Paralelamente, o Banco Central Europeu, em iniciativa inédita para a instituição, mas inspirada nas atitudes tomadas por diversos bancos centrais, a começar pelo Federal Reserve americano, passou a aceitar como garantia títulos privados em poder do sistema financeiro, que estavam ameaçados de perder a liquidez.

Tais providências, a julgar pela reação de ontem nas bolsas de valores, podem ter interrompido o efeito dominó sobre as economias e mercados financeiros europeus.

O Brasil, que usufrui hoje de uma situação mais confortável em suas contas externas (embora não totalmente imune ao risco), fez bem em integrar o esforço de cooperação internacional para estancar essa crise.

É ilusão achar que não seríamos atingidos se a tragédia grega ganhasse escala mundial.

Não há mais economia em condições de se salvar sozinha.

No mundo globalizado de hoje, ninguém mais se salva sozinho