Título: BC da Venezuela contralizará câmbio
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 13/05/2010, Economia, p. 24

Nova lei reforça poder do Estado nas operações com o dólar no país

CARACAS. Quatro meses após desvalorizar o bolívar frente ao dólar o que não apenas pressionou a inflação como também fez a moeda americana bater recorde de mais de 8 bolívares no mercado paralelo o governo da Venezuela anunciou uma nova medida regulatória. Com a justificativa de controlar a especulação, a Assembléia Nacional aprovou, na terçafeira à noite, uma reforma da chamada Lei contra os Ilícitos Cambiais. Agora, caberá exclusivamente ao Banco Central da Venezuela (BCV) regular a compra e venda de divisas de qualquer valor na moeda americana, evitando, assim, distorções no sistema e reforçando o poder do Estado no controle do mercado de câmbio, como declarou o deputado Ricardo Sanguino, presidente da Comissão de Finanças. A medida, entre outras coisas, dá ao BCV o poder de escolher as casas de câmbio e as operadoras de bolsa com quem desejará operar. Quem não cumprir a lei fica sujeito a fortes penalidades, inclusive uma multa, que corresponderá ao dobro do valor da operação. O BCV passa a controlar o chamado dólar permuta, uma forma legal de obter a moeda americana na Venezuela via venda de títulos e bônus, cujo valor é fixado pela lei de oferta e procura. A decisão gerou dúvidas entre analistas e empresários, muitos prevendo que ela pode agravar a crise. A economia recuou 7% só no primeiro trimestre de 2010, e a Venezuela é o único país da América Latina sem previsão de crescimento para este ano. Segundo o economista Nicolas Toledo, da Consultores XXI, o governo precisava tomar uma atitude referente ao câmbio porque, além da alta inflação, o fluxo de dólares está menor, limitando a capacidade que o BCV tem de atuar. Os ativos caíram 22% no primeiro trimestre, e atualmente estão em US$ 27 bilhões. Além do mais, existe uma grande insegurança no mercado de importações e exportações, porque nunca se sabe em qual câmbio os pagamentos serão efetuados diz Toledo. Para o economista Orlando Ochoa, se o objetivo da reforma for supervisionar melhor o mercado, ela é positiva porque exclui os intermediários. Mas, se for aumentar o poder estatal, pode agravar a corrupção e criar mais distorções: Medidas punitivas aumentam a ansiedade e levam à fuga de investidores. A inflação dispararia e o mercado negro dominaria. José Guerra, ex-funcionário do BCV, prevê uma explosão do mercado negro e da burocracia no fluxo cambial: Imagina uma empresa como a (brasileira) Odebrecht querendo investir aqui. Até conseguir divisas com o BCV, vai demorar meses para iniciar suas obras. Isso se ela não desistir antes. A moeda venezuelana perdeu cerca de 25% de seu valor desde que a desvalorização, anunciada em janeiro, fixou os valores de US$ 1 em 2,6 bolívares (para setores prioritários, como saúde e alimentação) e em 4,3 para artigos não essenciais. Por causa do acesso restrito ao dólar oficial, mais de 70% das importações, segundo economistas, são realizadas via mercado paralelo. Este sistema enrolado causa distorções macroeconômicas, cria oportunidades de se fazer dinheiro de maneiras escusas, por causa do câmbio flutuante, e alimentam a inflação, que em abril foi de 5,2%, a maior da América Latina, gerando acumulado anual de 30,4% diz Toledo. A reforma na lei contra ilícitos cambiais ocorre após Hugo Chávez ter declarado, semana passada, que a elevada taxa do dólar no mercado paralelo era provocada pela especulação da burguesia.