Título: Festejado, Amorim rebate críticas e pede tempo para o Irã
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Fonte: O Globo, 18/05/2010, O Mundo, p. 23
Chanceler brasileiro não acredita que enriquecimento prejudique acordo e diz a Hillary que agora há um fato novo
Enviados especiais
MADRI e TEERÃ. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, criticou ontem as respostas negativas de países como Estados Unidos e Reino Unido ao acordo sobre o programa nuclear do Irã. Numa teleconferência pouco antes de viajar da Espanha para o Brasil, Amorim queixou-se do ceticismo e afirmou ser necessário dar um voto de confiança ao Irã para que as negociações evoluam. O ministro pareceu especialmente incomodado pelas declarações do chanceler britânico, William Hague, para quem as sanções ainda são necessárias. Ele destacou que esta foi a primeira vez que o Irã assinou um documento comprometendo-se com a essência do que havia sido proposto pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) e rechaçou o argumento de que a diplomacia brasileira teria lucrado com a exposição na participação no acordo. Se analisarmos com racionalidade, os principais pontos levantados pelos países mais interessados nas sanções foram totalmente atendidos. Pode-se até dizer não confio que o Irã vá fazer. Mas é preciso dar um tempo para ver as coisas acontecerem explicou. Perguntado se o anúncio de que o Irã continuará a enriquecer urânio era um banho água fria, o chanceler sugeriu que isso foi uma resposta interna: Não foi banho nenhum. Não discutimos esse assunto, cada um tem seu público interno. Cada um tem que dizer suas coisas para atender preocupações. Mas se você criar confiança, haverá condições de discutir essa questão. No programa de rádio Café com o presidente, gravado da Base Aérea de Teerã pouco antes de ir para Madri, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva elogiou a atuação de Amorim: Eu acho que foi uma resposta de que é possível, com diálogo, a gente construir a paz, construir desenvolvimento. A diplomacia sai vencedora.
Medvedev vê vitória pessoal de Lula
Segundo uma fonte da Presidência, houve uma conversa telefônica entre Dmitri Medvedev e Lula, na qual o presidente russo afirmou que o resultado das conversas em Teerã foi uma vitória pessoal do brasileiro. Amorim contou que a negociação tomou muitos meses desde novembro, quando o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, visitou o Brasil: Esse acordo não vai resolver todas as questões. Mas é o passaporte para que possa haver discussões mais amplas que criem a confiança na comunidade internacional e permita ao Irã exercer o direito legítimo à energia nuclear para fins pacíficos, inclusive com enriquecimento. O chanceler teve ontem uma conversa telefônica com a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, que expressou dúvidas sobre o comprometimento de Ahmadinejad: Disse a Hillary nossa visão: temos um fato novo. O Irã botou no papel coisas que nunca havia posto antes. Nós não criamos esse acordo, apenas sugerimos uma maneira de possibilitar o que já havia sido proposto pela AIEA e o grupo de seis países. O acordo foi assinado ontem, às 10h10m ( 2h40m em Brasília) por Amorim e os chanceleres iraniano Manouchehr Mottaki e Ahmet Davutoglu, turco, diante dos presidentes Lula, Ahmadinejad e do premier da Turquia, Tayyip Erdogan. Politicamente, o acordo coloca o Brasil como um país ativo em negociações internacionais que fogem às questões da América Latina. O documento deixa claro o compromisso com o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, mas reconhece o direito dos signatários do tratado de desenvolverem pesquisas, produção e uso de energia para fins pacíficos. O Irã concorda em enviar em um mês 1.200 quilos de urânio enriquecido a 3,5% à Turquia. Em sete dias, o Irã vai notificar a AIEA sobre o acordo. Depois de enriquecido a 20% na Rússia, a França o transformará em combustível e devolverá 120 quilos em um ano. COLABOROU: Luiza Damé, de Brasília