Título: Blindagem na crise
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Fonte: Correio Braziliense, 18/06/2009, Economia, p. 21

No mais ambicioso plano de regulamentação do sistema financeiro desde 1930, governo dos Estados Unidos amplia poder do BC para fiscalizar bancos e cria uma agência destinada a proteger consumidores

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, anunciou ontem o plano americano para reforma do setor financeiro, após anos de desregulação, destacando que se trata da mais ampla reforma desde a Grande Depressão ocorrida nos anos 30. ¿Não fomos nós quem escolhemos a forma como surgiu esta crise, mas podemos escolher os meios para lidar com ela¿, declarou Obama ao apresentar o projeto considerado uma das prioridades de seu governo.

¿Minha administração propõe uma ampla reforma do sistema de regulação financeira, uma transformação inédita desde as reformas que se seguiram à Grande Depressão¿, acrescentou. ¿O livre mercado foi e continuará sendo o motor do progresso americano¿, destacou, explicando que o setor empresarial é mais eficaz do que o governo na criação de empregos.

Segundo o presidente americano, o papel do Estado não é o de reprimir o mercado, ¿mas dar asas à sua criatividade e inovação¿, dentro do objetivo da reforma de reforçar o sistema financeiro dos Estados Unidos, cuja vulnerabilidade ficou demonstrada pela crise.

Vigilância A finalidade das propostas, que ainda terão de ser aprovadas pelo Congresso, é dar mais poder ao Banco Central (Federal Reserve, Fed) para fiscalizar as maiores instituições financeiras do país cuja falência afetaria a economia americana. A Casa Branca destacou que a reforma permitirá introduzir mais disciplina e transparência nos mercados financeiros.

Como havia sido anunciado anteriormente, o projeto também incluirá a criação de ¿uma nova e poderosa agência com um único trabalho: o de proteger os consumidores¿, encarregada de supervisionar especificamente os créditos imobiliários e os créditos ao consumo. ¿Esta nova agência terá o poder de fixar padrões de modo que as companhias concorram ao oferecer produtos inovadores que os consumidores de fato queiram e entendam¿, ressaltou.

A reforma deverá, ainda, incluir a criação de um conselho de vigilância dos serviços financeiros. Este órgão, que será presidido pelo Departamento do Tesouro, será encarregado de avaliar os riscos que ameaçam o conjunto do sistema financeiro e de coordenar as ações empreendidas pelos diferentes organismos de regulação para enfrentar estes riscos. Ao anunciar o plano, Obama salientou a falta de uma base apropriada para lidar com abusos e excessos.

O presidente americano também lembrou que nos últimos anos houve multiplicação dos instrumentos financeiros complexos, como os ativos respaldados por hipotecas, com o objetivo de distribuir o risco, mas que acabaram por concentrá-lo ¿ esquemas estes que, nas palavras dele, ¿foram construídos sobre areia movediça, alimentando o apetite de risco desenfreado, levando as entidades de crédito a diminuir seus padrões para atrair novos mutuários¿. ¿Muitos americanos compraram casas e pediram dinheiro emprestado sem se informar de forma adequada sobre os seus termos e sem arcar com suas responsabilidades, com frequência, uma falha de todo o sistema¿, complementou.

Exigências Para garantir a estabilidade do sistema, o governo elevará a exigência de capital em posse de todas as instituições financeiras. Os fundos especulativos, que fogem ao controle das autoridades, terão que se registrar em um órgão regulador. Também serão editadas normas para a operação que consiste em transformar ativos financeiros em títulos. Essa operação foi parcialmente responsabilizada pela disparada dos créditos imobiliários de risco que provocaram a crise atual. As agências de classificação, acusadas de má avaliação dos riscos inerentes a estas operações, também serão supervisionadas. E a reforma deverá dar ao governo meios para permitir um desmantelamento ¿suave¿ das grandes instituições financeiras ameaçadas de bancarrota.

A despeito da abrangência das propostas, duas das três bolsas americanas encerraram a quarta-feira em queda devido, segundo analistas do mercado, a incertezas sobre a eficácia da reforma do sistema regulatório financeiro. A redução da nota de riscos de 22 bancos também contribuiu negativamente. Em Nova York, o Dow Jones teve desvalorização de 0,09% e a S&P 500, queda de 0,66%. No Brasil, a Bovespa seguiu o ceticismo nos EUA, fechando com baixa de 0,31%.