Título: Medidas, sim, poderão fazer o Irã hesitar
Autor: Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 19/05/2010, O Mundo, p. 30

Ex-assessor especial de dois ministros britânicos de Relações Exteriores, além de uma das principais autoridades do país em geopolítica nuclear, o consultor Malcolm Chalmers acredita que, apesar das boas intenções, Brasil e Turquia se esbarram nas más intenções iranianas.

O GLOBO: O senhor se surpreendeu com a inversão de expectativas dos últimos dias? MALCOLM CHALMERS: Não, pois o anúncio do Brasil e da Turquia, embora tenha sido uma iniciativa positiva, esbarra na desconfiança histórica de países que há muito mais tempo lidam com o Irã e já passaram por vários momentos em que Teerã deixou de cumprir compromissos. O Brasil e a Turquia entraram agora no circuito, mas me pareceu claro que foram usados pelo regime iraniano para ganhar tempo e evitar novas sanções. É compreensível o ceticismo do P5+1.

Como avaliar a participação de Brasília e Ancara? CHALMERS: Não se deve cometer o erro de subestimar o que Brasil e Turquia fizeram, pois deram ao mundo uma indicação de flexibilidade dos iranianos, ao mesmo tempo em que criaram um clima de mais confiança junto a Teerã, que não se viu numa situação de Ocidente contra Oriente. Foi útil, mas não se pode superestimar.

Veremos sanções? CHALMERS: O Irã está tentando ganhar tempo e cada dia fica mais perto da bomba.

Ainda creio que seja uma questão de anos, não de meses, mas seria desastroso para o Oriente Médio. Detonaria uma corrida armamentista que poderia levar outros poderes regionais, como Egito e Arábia Saudita, a desenvolverem armas. A ameaça de sanções já não parece ser suficiente para coibir o Irã. Medidas, sim, poderão fazer o Irã hesitar.

O Brasil e a Turquia argumentam o contrário...

CHALMERS: Basicamente, o Irã já passa por problemas econômicos, que poderiam ser agravados por sanções e forçar seu governo a negociar. Apenas a garantia dada por Mahmoud Ahmadinejad não deixa ninguém seguro, pois o país já voltou atrás antes. Sanções econômicas medianas, implementadas de forma gradual, seriam de grande valia. Mas tampouco seria de bom senso criar algo mais draconiano, como um embargo.

E o argumento de que as potências ocidentais buscam mudança de regime com as sanções, já ventilado pelo Brasil e pela Turquia? CHALMERS: A questão do poderio nuclear é maior que divisões políticas iranianas.

O nacionalismo no país continua forte e, no momento, seria bastante difícil que sanções mais potentes criassem qualquer tipo de movimento do gênero. (F.D.)