Título: A crise do Senado
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Fonte: Correio Braziliense, 18/06/2009, Opinião, p. 30

Depois de quatro meses de desgaste, o presidente José Sarney subiu à tribuna para se pronunciar sobre a série de denúncias que desmoralizam o Senado. Sarney mirou dois públicos. De um lado, o interno. Precisava apaziguar os ânimos dos pares e funcionários da Casa. De outro, o externo. Os brasileiros, indignados com as ilegalidades, o descontrole e a farra administrativa da Câmara Alta, esperavam o anúncio de medidas saneadoras. Frustraram-se.

Sarney disse que a crise não é dele. É do Senado. Confundiu a instituição com os hóspedes de gabinetes e donos temporários dos assentos de comissões e plenário. Dezesseis deles, vale lembrar, são suplentes. Exercem o mandato sem o aval de um voto sequer. Com parlamentares ungidos pelo sufrágio popular, agem sem compromisso com o parlamento. Em vez de servir à nação, servem-se da nação. Com orçamento milionário, lançam mão dos recursos públicos para benefícios privados. Confiantes na impunidade, pisam a Constituição ao recorrer a atos secretos para ocultar práticas de nepotismo e malversação do dinheiro do contribuinte.

O presidente acerta ao dizer que o enfraquecimento do Congresso ¿ um dos pilares da democracia ¿ abre espaço para outros exercerem o papel que lhe pertence. Erra ao não assumir a responsabilidade. É verdade que o Executivo abusa das medidas provisórias e o Judiciário toma decisões que caberiam ao Legislativo. A hipertrofia dos demais poderes à custa da hipotrofia do parlamento se deve à inapetência de deputados e senadores para apresentar projetos, discuti-los com a sociedade e chegar a normas que sintonizem o país com as urgências dos novos tempos. Há quem diga que, se a remessa de medidas provisórias cessasse, Câmara e Senado ficariam sem pauta.

A biografia de José Sarney obriga-o a agir com determinação, em sintonia com os anseios da sociedade. Os brasileiros esperam mais que palavras do presidente do Senado. Impõem-se medidas concretas capazes de moralizar a Casa. Uma delas: enxugar o quadro de servidores. Não há mágica que explique a necessidade de 10 mil funcionários para atender 81 senadores. Outra: racionalizar a estrutura administrativa. Mais uma: dar publicidade aos atos secretos e punir os responsáveis pelos desmandos. A crise não é do Senado. É dos homens que compõem o Senado. Eles, à frente o presidente, precisam debelá-la não com analgésicos, mas com cirurgias profundas e dolorosas.