Título: Presidente da Eletrobras garante que Belo Monte será muito rentável
Autor: Lopes, José Muniz
Fonte: O Globo, 15/05/2010, Economia, p. 26

Executivo da estatal afirma que custos vão cair e lucro será atraente ENTREVISTA

Há 25 anos, José Antonio Muniz Lopes se dedica a estudar a construção da usina de Belo Monte. Em 1989, então presidente da Eletronorte, chegou a ser ameaçado por uma índia com um facão. Ela e sua tribo se opunham à hidrelétrica no Rio Xingu. Agora, como presidente da Eletrobras, ele é encarregado de viabilizar a usina que é a segunda maior obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Rompendo o silêncio que mantinha desde o leilão, no dia 20 de abril, Muniz Lopes disse ao GLOBO que a desistência de algumas construtoras às vésperas da licitação deveu-se ao estresse pré-leilão e afirmou que o projeto deverá ter uma taxa de retorno superior a 10%.

Ramona Ordoñez

O GLOBO: O senhor acredita na execução desse projeto, apesar da forte oposição? JOSÉ ANTONIO MUNIZ LOPES: Tenho plena convicção de que vamos conduzir esse projeto como uma referência positiva decorrente do aprendizado que o Sistema Eletrobrás teve ao longo do tempo.

Quais são os próximos passos do consórcio vencedor? MUNIZ LOPES: A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) deve aprovar até o próximo dia 25. A partir daí, o consórcio terá 30 dias para formar a empresa que vai realizar o projeto. E nessa empresa é que poderão entrar novos sócios.

As grandes construtoras que ficaram fora do consórcio devem entrar na formação da empresa? MUNIZ LOPES: Não estou acompanhando as negociações.

O certo é que a Eletrobrás e a Eletronorte entrarão como sócios estratégicos junto com a Chesf, que é a líder do consórcio. As três juntas ficarão com os 49,98% do projeto.

Mas espero que tenhamos um conjunto bastante forte de participantes.

Por que no dia do leilão surgiu a notícia de que um dos participantes desistiria? MUNIZ LOPES: Foi estresse natural da fase pré-propostas.

é natural nessa fase os participantes brigarem por espaço dentro do consórcio.

Por que o governo chamou o grupo Bertin para entrar no consórcio? MUNIZ LOPES: Alguns componentes do consórcio buscaram mais parceiros. Não foi o governo que formou o consórcio Norte Energia. O que o governo fez foi criar um ambiente favorável para que essas empresas entrassem no leilão.

Uma das críticas é de que o consórcio Norte Energia venceu por ter aceito uma baixa rentabilidade. Teria sido de 4,5% ou 8,5% ao ano, como eles pretendiam? MUNIZ LOPES: Nós queremos a taxa interna de retorno acima de 10%, e vamos conseguir.

Como, considerando que os investimentos previstos vão de R$ 20 bilhões a R$ 30 bilhões? MUNIZ LOPES: Após a formação da nova empresa que tocará o projeto vai realizar o projeto básico de engenharia.

O projeto tem muito espaço para maximizar seus custos.

O projeto de viabilidade de Belo Monte foi entregue à Aneel em 2002. Já o projeto de viabilidade da construção da casa de força, que inicialmente prevê a instalação de 18 turbinas, foi feito em 1989. Ou seja tem muito espaço para redução de custos.

Para quanto podem cair os investimentos? MUNIZ LOPES: Não quero falar em números, mas poderemos reduzir custos.

Alguns investidores privados desistiram de Belo Monte com receio de o projeto não conseguir ficar pronto nos prazos previstos.

MUNIZ LOPES: Todo projeto tem riscos. Mas, na medida em que obras estão sendo feitas com Parceria Público-Privadas, há bons resultados. Estão em andamento inúmeros projetos do setor elétrico e desconheço atrasos. Ao contrário, os cronogramas estão sendo antecipados. Belo Monte, por sua história e por todo esse tempo sendo discutida, faz com que alguns tenham mais temor, mas acredito que as dúvidas serão eliminadas.

Muitos também criticam a pressa do governo Lula em fazer o leilão de Belo Monte, apesar de existirem ainda muitas dúvidas.

MUNIZ LOPES: O aproveitamento do Rio Xingu começou a ser estudado em 1975. E eu participo dos estudos do projeto de Belo Monte há 25 anos. É um dos projetos mais discutidos.

Mas, no passado, o projeto era outro, bem maior.

MUNIZ LOPES: Sim, em 1986, estudou-se o aproveitamento no Xingu de Babaquara/ Kararaô, que teria 17 mil megawatts (MW) de capacidade e alagaria uma área de 7 mil quilômetros quadrados.

Mais tarde se pensou em construir a usina de Kararaô (Belo Monte) com 11 mil MW.

Foi quando o projeto começou a ter oposição pelos impactos ambientais...

MUNIZ LOPES: Em fevereiro de 1989, numa apresentação do projeto, fui ameaçado com uma faca por uma índia. Me falaram que Kararaô significava grito de guerra. Então, troquei o nome para Belo Monte.

Outra crítica é que, apesar de 11.233 MW instalados, a usina só vai gerar 4.300 MW de energia elétrica.

MUNIZ LOPES: Belo Monte é estratégica para o sistema elétrico brasileiro por sua complementariedade. Quando a vazão dos rios, principalmente do Sudeste e do São Francisco, é menor, e as usinas têm que reduzir sua produção e o Rio Xingu está com sua vazão maior. Isso acontece principalmente nos meses de abril e maio. A outra alternativa é usar térmicas a óleo.