Título: Senado debate missão brasileira
Autor: Vaz, Viviane
Fonte: Correio Braziliense, 18/06/2009, Mundo, p. 33

Organizações não governamentais haitianas denunciam em Brasília ¿sistema de tutela do país¿ e exploração econômica. Itamaraty garante cooperação bilateral e Exército sustenta que ilha está segura

Soldado brasileiro monta guarda no bairro de Cité Soleil, em Porto Príncipe: 1,3 mil militares e 250 engenheiros permanecem no país caribenho A Comissão de Relações Exteriores do Senado brasileiro foi palco ontem de um debate sobre a presença do Brasil na Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (Minustah). Duas visões completamente antagônicas foram apresentadas na audiência pública: a missão como forma de ocupação econômica e militar do país, defendida por alguns movimentos sociais; e como forma de garantir a estabilidade e o desenvolvimento do país caribenho, segundo o Itamaraty. Apesar de a Minustah contar com 50 países e estar sob o comando das tropas brasileiras, não havia representantes do Exército nem do Ministério da Defesa entre os palestrantes. A assessoria de imprensa do Ministério da Defesa explicou à reportagem que será marcada uma nova audiência na comissão para ouvir a posição do ministro da Defesa, Nelson Jobim, que está em viagem oficial pela Espanha e Portugal.

A haitiana Carole Pierre Paul-Jacob, dirigente da ONG Solidariedade das Mulheres Haitianas (Sofa, em francês) disse ao Correio que ¿o verdadeiro objetivo da Minustah corresponde muitas vezes a um sistema de tutela do país, em um plano de dependência econômica ligada a multinacionais e a um projeto capitalista mundial¿. ¿A estabilidade que justifica a Minustah é a de como se estivéssemos em estado de guerra. A população haitiana diz não a isso¿, afirmou. Para Carole, o Brasil não tem o verdadeiro comando da missão. ¿É uma falsa liderança, orientada pelos norte-americanos e canadenses¿, opinou.

Didier Dominique, líder do movimento de trabalhadores haitiano Batay Ouvrier, também acusou os Estados Unidos e o Canadá de buscarem mão de obra barata para suas fábricas têxteis no Haiti. ¿Acabaram com o açúcar que o país exportava e agora estão acabando com a produção de arroz haitianos.¿ Para ele, a construção das zonas francas segue a mesma ideia. ¿Esse é um projeto imperialista, do qual participa o vice-presidente, José Alencar, dono de empresas têxteis, que enviou seu filho para conhecer as zonas francas do Haiti¿, acusou.

Já o senador Geraldo Mesquita Júnior (PMDB-AC) explicou que foi contra o envio de tropas brasileiras ao Haiti em 2004, pensando na debilidade da ONU à época da intervenção militar norte-americana no Iraque, mas que mudou de ideia após visitar a ilha. ¿Um país destroçado, mas que tinha o apoio de tropas latino-americanas¿, definiu. Segundo ele, os parlamentares haitianos dizem que as tropas não devem deixar o país, pois entre os brasileiros há médicos, assistentes sociais e engenheiros.

Ações sociais A chefe da Divisão das Nações Unidas do Ministério das Relações Exteriores, conselheira Gilda Motta Santos Neves, destacou que o governo brasileiro também tem promovido diversas atividades de cooperação bilateral com o Haiti, como a promoção da saúde da mulher, a ajuda no processamento do caju e a construção de cisternas. ¿Concordamos com o argumento de que nada vai se resolver pela força. Mas o objetivo da missão é o de criar um clima estável, que permita a atração de investimentos e ações sociais¿, defendeu Gilda.

Procurado pelo Correio, o coronel Gerson Pinheiro Gomes, chefe da Seção de Comunicação Social do Batalhão de Infantaria Força de Paz Haiti (Brasbatt), avaliou que ¿a parcela da população haitiana que reside nas áreas sob responsabilidade das tropas do Brasbatt tem a noção concreta de que o ambiente seguro e estável foi uma conquista importante da sociedade, obtida em parceria com os militares brasileiros¿. O debate terminou sem pender para nenhum dos lados. O senador José Nery (PSol-PA) propôs que um grupo de parlamentares visite o Haiti. A proposta foi aprovada e a Comissão de Relações Exteriores ainda definirá a data da viagem.