Título: 'Um médico do SUS pediu R$ 900'
Autor: Alencastro, Catarina; Fabrini, Fábio
Fonte: O Globo, 23/05/2010, O País, p. 3
passam por extorsão ou têm de recorrer à Justiça
A diarista Neusa Donizeti Gomes, de 48 anos, sofre com constantes irritações no olho e começa a ter sua visão afetada.
Ele tem pterígio, patologia que faz crescer um tecido sobre a córnea, e há três anos tenta sem sucesso uma cirurgia corretiva.
¿ Já perdi vários dias de trabalho por isso.
Um médico do SUS chegou a pedir R$ 900 para fazer a cirurgia, e só depois outra médica me explicou que não tinha que pagar. Se eu tivesse dinheiro, teria pagado e resolvido.
O desabafo de Neusa não é isolado, e a diarista faz parte da lista de 45.372 pessoas que aguardam cirurgia eletiva de média complexidade na capital mineira. O quadro já foi pior.
Diante dos baixos valores pagos pelo SUS, que desincentivam profissionais a fazerem os procedimentos, a prefeitura de Belo Horizonte firmou, em meados do ano passado, o Plano Operativo de Cirurgias Eletivas, acordo com 23 hospitais e mais de 500 médicos para complementar os pagamentos do SUS.
Com isso, os valores chegam aos mesmos patamares do que é pago pelos planos de saúde, e, em alguns casos, o incremento é bem superior à tabela do SUS, como no caso de uma histerectomia (retirada do útero).
O SUS paga R$ 460,08, incluindo custos do médico e do hospital. Se o profissional e a instituição cumprirem as metas, a prefeitura complementa o pagamento com R$ 1.006,82, o que representa acréscimo de 118,83% no valor pago pelo governo federal.
Desde que o sistema foi adotado, segundo a Secretaria municipal de Saúde, foram feitas 25.952 cirurgias eletivas na cidade, o que resultou na redução de 10.851 pessoas à espera de um procedimento. Mas há quem apele para a Justiça para poder ser submetido a uma cirurgia. Foi o que fez José Wilson Coelho. Em junho de 2008, foi autorizada a realização de uma artroscopia no menisco de seu joelho direito, mas o caso não foi considerado urgente.
Diante do laudo médico, a central de internação do município informou que ¿o referido pedido já está priorizado, no entanto, ainda existem outros pacientes que foram cadastrados antes dessa data¿.
Em agosto do ano passado, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais confirmou sentença de primeira instância e obrigou o município a fazer a cirurgia.
As dificuldades não se restringem a cirurgias eletivas. Com problema de visão, a faxineira Edna Custódio, de 44 anos, conta que aguarda por exame para verificar se terá de passar por procedimento cirúrgico ou se um par de óculos pode resolver o caso.
¿ Tem um ano que estou esperando um exame. Tenho dor de cabeça o tempo todo e não consigo mais ler nada de perto. Eles não têm nenhuma preocupação com a gente.