Título: Clamor mundial contra Israel
Autor:
Fonte: O Globo, 01/06/2010, O Mundo, p. 26

Ataque a navios com ajuda a Gaza mata 9 ativistas e aprofunda isolamento do país

JERUSALÉM Um ataque a embarcações levando ajuda humanitária à Faixa de Gaza deixou nove mortos e mergulhou o governo de Benjamin Netanyahu em sua pior crise diplomática. O ataque israelense foi repudiado tanto por países islâmicos como por europeus e latino-americanos; levou nações como Grécia e Turquia a cancelarem exercícios militares conjuntos com Israel; fez Suécia, Egito e Espanha convocarem embaixadores israelenses para explicações, enquanto o Conselho de Segurança das Nações Unidas realizava uma reunião de emergência e a União Europeia pedia uma investigação independente e o fim do embargo à Gaza.

Numa linguagem incomumente dura, o secretáriogeral da ONU, Ban Ki-moon, condenou ¿o derramamento de sangue¿ e pediu explicações.

A Turquia usou expressões como ¿terrorismo de Estado¿ e ¿pirataria¿ para classificar o ataque à chamada Flotilha da Liberdade. Montado por organizações internacionais, o comboio era composto por seis navios, com dez mil toneladas de ajuda e 700 pessoas, entre elas turcos, gregos e espanhóis, além de uma brasileira, a cineasta Iara Lee. Também estavam a bordo a ganhadora do Prêmio Nobel da Paz Mairead Corrigan Maguire, da Irlanda do Norte, e o escritor sueco Henning Mankell. Soldados israelenses desceram de helicópteros por cordas no deck do principal navio na madrugada de ontem (noite de domingo no Brasil), aparentemente em águas internacionais. Segundo os ativistas, eles abriram fogo contra os civis desarmados. Já Israel afirma que seus militares foram atacados.

¿ Fico impressionado com as informações sobre mortos e feridos que levavam ajuda a Gaza, aparentemente em águas internacionais ¿ disse Ban em Kampala, Uganda. ¿ É vital que haja uma investigação completa para determinar como ocorreu este derramamento de sangue. Israel deve dar urgentemente uma explicação.

Antes da reunião a portas fechadas, alguns membros do Conselho de Segurança criticaram o ataque enquanto outros pediam uma investigação rigorosa. Outros setores da ONU não usaram meias palavras para condenar a ação. A alta comissária para Direitos Humanos, Navi Pillay, destacou que ¿nada pode justificar o resultado terrível da operação¿, classificando o bloqueio a Gaza de ¿desumano e ilegal¿.

O relator especial sobre Direitos Humanos nos territórios palestinos, Richard Falk, afirmou que ¿Israel é culpado por um comportamento chocante, usando armas contra civis em navios em alto-mar, onde há liberdade de navegação¿.

Obama pede explicações sobre ação a Netanyahu

A ação pode isolar Israel internacionalmente e fez Netanyahu, que estava no Canadá, cancelar a visita aos EUA, onde se reuniria com o presidente Barack Obama. O encontro seria uma tentativa de reaproximar os dois países, enquanto Obama tenta reavivar as negociações de paz entre Israel e palestinos. Numa ligação telefônica, Obama pediu uma pronta investigação do ataque.

¿ O presidente manifestou pesar pela perda de vidas e também a importância de conhecer os fatos e circunstâncias que cercam esse trágico episódio ¿ disse um porta-voz da Casa Branca.

A resposta americana, no entanto, foi considerada cautelosa em comparação com a forte reação internacional. A Turquia chamou o seu embaixador, o presidente da França, Nicolas Sarkozy, considerou desproporcional o uso da força, e o Reino Unido pediu informações. Tony Blair, representante do Quarteto (EUA, Rússia, ONU e UE) para as negociações entre israelenses e palestinos, se disse chocado. Argentina, Venezuela, Chile e Brasil também condenaram o ataque.

Para Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP) o ataque foi ¿um massacre¿, enquanto o Irã, tradicional inimigo de Israel, chamou o fato de desumano.

¿ O ataque indica que Israel não está pronto para a paz ¿ disse Amr Moussa, secretáriogeral da Liga Árabe, organização que condenou a ação como ¿um ato terrorista¿.

Milhares de pessoas protestaram de Washington a Istambul. Na França, a polícia usou gás lacrimogêneo para dispersar cerca de 2 mil manifestantes.

Em Istambul, 10 mil foram às ruas.