Título: Turquia enterra ativistas em clima de revolta
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Fonte: O Globo, 04/06/2010, O Mundo, p. 27

Presidente diz que relações com Israel nunca mais serão as mesmas. Para premier, houve um erro histórico ISTAMBUL. Num clima de comoção, milhares de pessoas lotaram ontem uma mesquita de Istambul para o funeral dos ativistas turcos mortos na segundafeira pelo Exército israelense, depois tentar furar o bloqueio humanitário à Faixa de Gaza. Enquanto a população homenageava os nove mortos ¿ oito turcos e um americano com cidadania turca ¿ aos gritos de ¿Deus é grande¿, as lideranças do país emitiram duras declarações contra Israel, afirmando que as relações entre as duas nações nunca mais voltarão a ser as mesmas.

¿ Israel cometeu um dos maiores erros de sua História.

Com o tempo, verá que erro enorme cometeu ¿ disse o presidente Abdullah Gul numa entrevista coletiva a leste de Ancara, sobre o ataque de Israel à flotilha com 682 ativistas que tentava entrar na Faixa de Gaza com ajuda humanitária. ¿ A Turquia nunca vai esquecer o ataque a seus navios e a seu povo em águas internacionais.

Os laços da Turquia com Israel nunca mais serão os mesmos.

¿Israel arrisca perder seu maior amigo na região¿ A afirmação fez eco ao que o primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan, já havia anunciado pouco antes.

Segundo ele, Israel cometeu um ¿erro histórico¿ e ¿arrisca perder seu maior amigo na região se não mudar sua mentalidade¿.

Moderado, o país muçulmano é um dos principais aliados do Ocidente no Oriente Médio.

O presidente dos EUA, Barack Obama, classificou ontem o incidente como ¿trágico¿, mas disse à rede CNN ter esperanças de que o episódio de alguma forma possa prover uma abertura para impulsionar os esforços de paz no Oriente Médio.

Centenas de ativistas presos no incidente chegaram ontem a Istambul, depois de libertados por Israel, sendo recebidos como heróis no país.

Alguns desembarcaram na cidade e se juntaram horas depois à multidão que homenageou os mortos. Envoltos nas bandeiras turcas e palestinas, os caixões dos oito dos nove mortos foram levados à mesquita Fatih, em Istambul.

¿Vocês vão para o céu. Que Deus abençoe o seu martírio¿, lia-se numa enorme faixa num dos lados da praça que acolhia as pessoas.

¿ Estamos profundamente tristes, mas ao mesmo tempo estamos furiosos ¿ disse Hulya Sekerci, de 36 anos, trabalhadora voluntária de Istambul.

Um dos maiores cartazes dizia ¿israelenses assassinos: Tirem as mãos de nossos navios¿. Outros, na multidão, diziam ¿De agora em diante, nada será o mesmo¿ e ¿Intifada está por todos os lados, em terra e no mar¿, numa referência ao levante palestino contra a ocupação israelense.

Um dos nove ativistas mortos era Furkan Dogan, um jovem de 19 anos nascido em Nova York e com cidadania turca. Autoridades americanas entraram em contato com o pai do rapaz e lhe ofereceram condolências e assistência consular. O Departamento de Estado americano anunciou que ele foi morto por tiro, mas não confirmou a informação de que Dogan teria sido alvejado com várias balas na cabeça. O Departamento de Estado afirmou que ainda é cedo para anunciar que medida tomará diante da morte do jovem.

Três homens ainda estão desaparecidos, diz ONG Todos os mortos eram homens.

Segundo a fundação de direitos humanos Human Rights and Freedoms and Humanitarian Relief (IHH), três ativistas ainda estão desaparecidos: Aydin Atac, Celebi Bozan e Osman Kurt.

A informação foi corroborada por Iara Lee, única brasileira na flotilha. Em entrevista à BBC Brasil, de Istambul, onde chegou ontem junto com cerca de 450 ativistas deportados de Israel, Iara contou ter ouvido relatos de outros ocupantes de seu barco de que soldados israelenses tinham sido vistos ¿atirando corpos no mar¿.

Ontem, o porta-voz da Casa Branca, Robert Gibbs , disse acreditar que o Conselho de Segurança votará e aprovará já na semana que vem a proposta de uma quarta rodada de sanções contra o Irã. A medida encerraria meses de esforços dos EUA para punir Teerã por seu programa de enriquecimento de urânio, que Washington acredita ter fins bélicos.