Título: Fome de verba pública
Autor: Pariz, Tiago
Fonte: Correio Braziliense, 21/06/2009, Política, p. 4

Pelo menos 21 deputados usaram recursos públicos para pagar despesas com alimentação no DF, o que é proibido desde 7 de maio na Câmara.

Sou contra e vou continuar gastando porque é um absurdo. Não tem razão a proibição. Vou reapresentar todas as notas que eles devolverem Vieira da Cunha, deputado federal

O apetite de alguns parlamentares por dinheiro público parece difícil de ser contido. Nos últimos dois meses, 21 deputados ignoraram as regras impostas pela Mesa Diretora da Câmara para pagar alimentação. Eles fizeram a Câmara bancar irregularmente porções de pão de queijo, cafezinho e até rodízios em churrascarias de Brasília.

Em 7 de abril, a Câmara editou uma portaria. O texto determinava que, a partir de 7 de maio, os deputados não poderiam utilizar a verba indenizatória para despesas com alimentação no DF. Mas alguns parlamentares ignoraram a regra. Os 21 flagrados pela reportagem do Correio podem ser divididos em duas categorias. Numa primeira, os nove que admitiram a irregularidade e prometem devolver o dinheiro. Há, também, 12 que delegam a culpa pela situação à Câmara.

¿Se o Nuvep pagou, está certo¿, disseram alguns dos entrevistados. Nuvep, no caso, é Núcleo de Fiscalização e Controle da Verba Indenizatória do Exercício Parlamentar, a repartição que analisa as notas fiscais dos deputados e devolve o dinheiro pago.

No grupo que usou a verba irregularmente estão Dagoberto (PDT-MS), Emília Fernandes (PT-RS), Henrique Afonso (PT-AC), José Rocha (PR-BA), Marcelo Guimarães Filho (PMDB-BA), Márcio França (PSB-SP), Rogério Marinho (PSDB-RN), Saraiva Felipe (PMDB-MG) e Vieira da Cunha (PDT-RS).

O deputado Vieira da Cunha, presidente em exercício do PDT, não só admitiu a ilegalidade como disse que continuará tentando ser ressarcido pela Câmara. Afirmou ter se insurgido contra uma regra absurda. ¿Sou contra e vou continuar gastando porque é um absurdo. Não tem razão a proibição. Vou reapresentar todas as notas que eles devolverem¿, afirmou o pedetista. Cunha usou a verba em cinco estabelecimentos que mostram a predileção dele por churrasco. Gastou um total de R$ 200,20.

Nessa mesma turma, Guimarães Filho gastou R$ 182,38 em dois almoços em dias diferentes em junho. Nesse mesmo mês, Saraiva Felipe desembolsou R$ 25,80 numa lanchonete e pediu para a Câmara o ressarcir. Maio é quando aparece a maior parte das despesas. Rogério Marinho gastou R$ 35,39 num restaurante típico de comida goiana. Márcio França, líder do PSB na Câmara, pediu e recebeu R$ 86 por um almoço no restaurante que o Senac mantém ao lado do plenário da Câmara. O Senac, aliás, é o local preferido dos parlamentares. José Rocha, por exemplo, gastou R$ 17 lá.

Emília Fernandes utilizou a verba para ser ressarcida de lanche de R$ 22,45 numa rede fast food. Dagoberto investiu R$ 63 numa churrascaria na Câmara. Henrique Afonso não quis pagar do próprio bolso um almoço de R$ 21,20 numa casa vegetariana. Todos disseram que devolverão o recurso aos cofres públicos. Apenas Rogério Marinho encaminhou ao Correio cópia do comprovante de pagamento.

Culpa na Câmara

Entre os integrantes do Legislativo que jogaram a culpa na Câmara pelo ressarcimento de verba indenizatória(1),três casos se destacam. Dois pela gula e um pela avareza. Edinho Bez (PMDB-SC) foi ressarcido em R$ 271,50 em três vezes no Senac da Câmara, e outras três em restaurantes. Pastor Pedro Ribeiro (PMDB-CE) é fã de fast food. Usou R$ 216,58 do dinheiro público para comer em sete locais de comidas rápidas. Na contramão, João Almeida (PSDB-BA) pediu reembolso de R$ 8,73. Takayama (PSC-PR) disse que checaria as notas e, se houvesse irregularidade, devolveria o dinheiro.

Além deles, outros acusaram a Casa: Antônio Carlos Chamariz (PTB-AL), Bilac Pinto (PR-MG), Celso Maldaner (PMDB-SC), Fátima Pelaes (PMDB-AP), Íris de Araújo (PMDB-GO), João Campos (PSDB-GO), Neilton Mulin (PR-RJ) e Vinícius Carvalho (PTdoB-RJ). O Correio fez um cruzamento entre a prestação de contas disponível no site da Câmara em maio e junho e dados dos CNPJs das notas fiscais apresentadas à Receita Federal.

1 - REGRAS DE USO Em maio, a verba passou a fazer parte do chamado ¿cotão¿ que unificou os benefícios pagos aos parlamentares para despesas com passagens aéreas, correio, telefones, alimentação fora de Brasília, etc. O ¿cotão¿ vai variar entre R$ 23 mil e R$ 34 mil, dependendo do estado de origem do deputado.