Título: Controle externo do Legislativo?
Autor: Feuerwerker, Alon
Fonte: Correio Braziliense, 21/06/2009, Política, p. 4

Parece que nossos parlamentares procuram exercitar na farra com o dinheiro do cidadão a independência e altivez que não exibem na relação com o Executivo. Os espantosos atos secretos do Senado são a expressão mais acabada do descontrole administrativo e político na instituição. Aliás, eu deveria ter escrevido ¿supostamente¿, já que o Senado afirma não haver medidas secretas. Há apenas alguns atos, até agora uns 600, que por um ou outro motivo não chegaram a ser divulgados ao público. Espero que você tenha entendido a diferença, porque eu não entendi.

Vamos falar sério, excelências. O Poder Legislativo vem fazendo uma leitura errada da imunidade parlamentar estabelecida na Constituição. Não está nas prerrogativas do deputado ou senador fazer festa com o dinheiro do povo sem prestar contas a ninguém. Isso nada tem a ver com a democracia.

Quando a Constituição de 1988 deu ao Congresso superpoderes, em algum grau estendidos às assembleias legislativas e câmaras municipais, foi para contrapor a um período, que acabava ali, de excessiva hipertrofia do Executivo. Como já escrevi nesta coluna, alguma coisa deu muito errado. Produziu-se um Poder Legislativo submisso ao Palácio do Planalto (e a realidade é igual em estados e municípios).

Pensando bem, parece que nossos parlamentares procuram exercitar na farra com os impostos pagos pelo cidadão a independência e altivez que não exibem na relação com o governo. Seria mesmo sensacional se os senadores e deputados empregassem na luta contra as medidas provisórias e contra o caráter faz de conta do orçamento a energia que dedicam para desperdiçar o dinheiro do povo. Não custa sonhar.

Aliás, é notável que todo esforço de investigação dos intestinos do Congresso desencadeie invariavelmente lamentações sobre as (aí sim) supostas ¿tentativas de enfraquecer o poder mais transparente da República¿. Nada disso. Não são pressões para fechar as Casas. São para abri-las.

A tentação mais imediata do crítico é debitar aos ¿maus políticos¿ a fatura pela situação. É uma armadilha. Políticos bons e ruins há em qualquer país, em qualquer período histórico. O que talvez nos falte é algo a mais no sistema de freios e contrapesos estabelecido pela Constituição. O Legislativo controla os demais poderes. Mas quem controla o Legislativo? Pelo jeito, ninguém.

Não é o caso de impor ao Congresso, de fora para dentro, o controle sobre atividades-fim de suas excelências, como fazer leis e acompanhar a execução do Orçamento. Mas está evidente que os mecanismos atuais não são um freio suficiente contra os abusos administrativos. O Senado e a Câmara dos Deputados só se movimentam para corrigir problemas quando a conta política começa a ficar salgada demais.

Nada há o que faça o Parlamento zelar rotineiramente pela boa administração. Isso precisa mudar.