Título: BC reafirma combate à inflação
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Fonte: O Globo, 11/06/2010, Opinião, p. 6

Na mesma semana em que o IBGE divulga o PIB do primeiro trimestre do ano, com números reluzentes ¿ o principal deles o crescimento de 9% em comparação com o mesmo período de 2008 ¿, o Conselho de Política Monetária (Copom), do Banco Central, decreta a segunda alta consecutiva dos juros básicos da economia (Selic), outra remarcação para cima de 0,75 ponto percentual.

Com isso, o Brasil volta a praticar taxas de dois dígitos (10,25% anuais), e o país lidera o ranking dos juros reais, ou seja, descontada a inflação ¿ 5,2%, numa projeção para os próximos doze meses. O novo PIB e a reunião do Copom não foram apenas uma coincidência de calendário, pois guardam intrínseca relação entre eles. Afinal, os juros subiram mais uma vez devido ao risco de superaquecimento da produção, confirmado pelas estatísticas do IBGE.Não adiantou o Ministério da Fazenda, uma espécie de bunker ¿desenvolvimentista¿, ter, nas últimas semanas, emitido análises e pareceres tranquilizadores sobre a inflação. O BC, como qualquer autoridade monetária que mereça o nome no mundo, tem de ser conservador, ainda mais diante de sinais preocupantes de escassez de produtos e do engarrafamento em alguns ponto da infraestrutura ¿ terminais aeroviários de carga, como o de Manaus, por exemplo.

A última estimativa do mercado para a inflação deste ano, divulgada pelo relatório Focus, do BC, é de 5,6%, pouco mais de um ponto percentual acima do centro da meta de 4,5%. Mesmo que os últimos índices tenham apontado para a redução de pressões em cimade preços de alguns setores, o aconselhável é mesmo manter a pressão do pé no freio.

Um dos pontos centrais na questão da inflação e crescimento é saber qual a velocidade máxima de expansão do PIB, sem provocar alta da inflação e graves desequilíbrios externos, considerando-se a capacidade de produção do país e os investimentos na sua ampliação.

É consenso que os mais de 10% ao ano projetados com base no ritmo do primeiro trimestres são inviáveis. E que a taxa de investimento de 18% do PIB ¿ o último dado disponível, referente a 2009 ¿ é muito baixa para ambições maiores do governo. Convencionase que, para uma expansão em voo de cruzeiro na faixa de 5%/6% ao ano, as inver-sões precisarão chegar a 25%. Faz, então, todo sentido o BC continuar a pôr os juros nas alturas, infelizmente. Prova disso é a velocidade de aumento do déficit externo da economia, pressionado pelas importações, decorrente da expansão interna. Nada ainda que assuste, mas é um indicador.

O resultado da reunião de anteontem do Copom reafirma uma conquista da sociedade brasileira: a autonomia técnica com que o BC continua a atuar, ainda mais em ano eleitoral.

Em princípio, não interessa à candidatura oficial acabar mais cedo a farra do consumo.

Porém, quanto mais longa ela for, maiores serão as sequelas na inflação e contas externas.

Para evitar a contaminação político-eleitoral da economia, existe a instituição do BC autônomo.

Entre os méritos de Lula está o de ter compreendido a importância estratégica da atuação de um verdadeiro Banco Central.

Precisa ser coerente por mais seis meses.