Título: Dilma em meio à briga com aposentados... na França
Autor: Berlinck, Deborah
Fonte: O Globo, 17/06/2010, O País, p. 9

Petista é recebida por Sarkozy no dia em que governo francês apresentou projeto que eleva idade para aposentadoria Correspondente

PARIS e BRASÍLIA. A candidata petista, Dilma Rousseff, se encontrou ontem com o presidente francês, Nicolas Sarkozy, no Palácio do Eliseu, num dia em que a França anunciou um projeto que vai na contramão do que fez o governo Lula: aumento da idade da aposentadoria dos franceses de 60 para 62 anos, para tentar tapar o rombo de C32 bilhões no sistema previdenciário.

Ela chegou de terninho preto no carro da embaixada do Brasil, acompanhada do embaixador José Bustani, e foi recebida pelo ministro das Relações Exteriores, Bernard Kouchner. Na saída, como de praxe, Sarkozy a acompanhou até as escadas, deu dois beijinhos, acenou para os fotógrafos e se retirou.

Mas Dilma não teve tratamento de chefe de Estado. A Guarda Republicana do Eliseu posicionouse para receber outra pessoa: o líder da igreja maronita, cardeal Nasrallah Boutros Sfeir.

Dilma diz a socialista que Lula reajustou aposentados Por causa do rigor protocolar, a saída de Dilma foi um estresse.

Um minuto e 40 segundos depois que começou a falar com a imprensa no pátio, assessores do Palácio fizeram sinal à equipe de Dilma para ela ir embora. Enquanto não saísse, o visitante seguinte não poderia entrar.

¿ Foi uma conversa muito boa, muito gentil sobre a parceria estratégica entre Brasil e França ¿ disse a candidata.

Ela só teve tempo de dizer que os temas foram meio ambiente, interesses comerciais e ação conjunta no G-20. E que não se falou nos 35 caças Rafale fabricados pela Dassault que os franceses querem vender para o Brasil ¿ um negócio de R$ 12 bilhões.

O cinegrafista contratado pela candidata não pôde registrar o encontro com Sarkozy.

Dilma começou o dia ontem em Paris dando uma entrevista ao ¿Le Monde¿ no quarto do hotel Champs Elysée Plaza, onde está hospedada. A reportagem ¿De Paris, a herdeira de Lula se projeta sobre a cena internacional¿ diz que Dilma aproveitou a Copa para se projetar, e que escolheu Paris para assistir à estreia da seleção. O jornal destaca que a candidata nunca concorreu em uma eleição e que seu ¿principal ativo é a imensa popularidade de seu mentor¿.

Ao ¿Le Monde¿, Dilma afirma que o Brasil vive um momento especial e que pode se transformar em uma nação desenvolvida.

A reportagem lembra que ela ganhou de Lula a alcunha de ¿mãe do PAC¿, para que fosse associada à gestão do programa.

Por fim, o jornal ressalta que a candidata petista está à frente do tucano José Serra nas pesquisas, mas que, ¿como na Copa¿, nada é ganho antecipadamente ¿ na verdade, os dois estavam empatados.

Por causa da entrevista, Dilma deixou Martine Aubry, secretáriageral do maior partido de oposição da França, o Partido Socialista, esperando 20 minutos no lobby do hotel. Martine anunciou o apoio a Dilma e rasgou elogios ao governo Lula.

Martine contou que Dilma lhe perguntou a respeito do projeto de Sarkozy sobre aposentadoria.

A socialista afirmou que as medidas de Sarkozy eram ¿irresponsáveis¿ e ¿injustas¿. Dilma, segundo a francesa, disse que Lula estava fazendo o inverso: dando aumento a aposentados.

¿Fingi que era uma confusão com argentinos¿ Depois, Dilma foi passear e, literalmente, parou o trânsito, ao atravessar fora da faixa uma das mais movimentadas ruas de Paris ¿ a Boulevard Haussmann.

Os carros tiveram que frear. Dilma fez um comentário sobre como os motoristas eram educados, quando, na realidade, não tiveram opção.

A candidata foi ao museu JacquesmartAndré e assistiu à exposição ¿De El Greco a Dalí¿, dos mestres da pintura espanhola.

Sua passagem enlouqueceu a gerência. Enquanto seguranças do museu batiam boca com cinegrafistas e fotógrafos no andar de baixo, Dilma seguia a visita no andar de cima, olhando e comentando os quadros.

¿ Olhei para o teto, fingi que não era comigo, que era (uma confusão) com estrangeiros, argentinos.

Ministério diz que apoio da embaixada é ¿normal¿ Na saída, quando um jornalista lhe contou que repórteres brasileiros foram chamados de argentinos no dia anterior por portugueses que passavam na porta do hotel, ela brincou.

¿ Só mesmo português para achar que brasileiro com camisa do Brasil (ela se confundiu, ninguém estava com camisa do Brasil) é argentino ¿ disse Dilma, arrependendo-se depois e pedindo para ¿não registrar¿ sob alegação de que ¿essas coisas a gente só fala na Copa¿.

A assistência de embaixadas brasileiras no exterior a candidatos à Presidência é considerada normal pelo Ministério das Relações Exteriores. Segundo o Itamaraty, cabe ao embaixador definir a quem dará apoio e que tipo de apoio será. E que é ¿absolutamente normal¿ essa assistência, porque a embaixada é uma repartição política e cabe à representação diplomática no exterior acompanhar todos os eventos de natureza política.

Segundo a assessoria do Itamaraty, é de interesse da embaixada acompanhar uma figura de expressão política, sobretudo se tem encontros marcados com líderes e chefes de Estado. Os assessores informam que se os outros candidatos forem ao exterior receberão tratamento igual.

Qualquer um poderá, até, se hospedar na casa do embaixador, se desejar