Título: Crescimento chinês, mas com poupança baixa
Autor: Almeida, Cássia
Fonte: O Globo, 09/06/2010, Economia, p. 29

Financiar investimentos é desafio para economia brasileira. País poupa 15% do PIB, contra 45% na China

Cássia Almeida

O crescimento da economia brasileira no primeiro trimestre se aproximou ao da China. O Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos pelo país) avançou 9% frente ao início de 2009. Enquanto o da China no mesmo período foi de 11,9%. As semelhanças com a economia chinesa param aí. Quando se olha a poupança do país asiático e a brasileira, a diferença é abismal. Enquanto a taxa de poupança aqui está em 15,8% em relação ao PIB, na China a taxa chega a 45%. No investimento, a mesma distância. Enquanto investimos 18% da economia, lá a taxa também é 45%.

- O nosso problema é a falta de poupança doméstica. Eles poupam mais de 40%. A nossa é muito baixa. Se lá, com essa poupança, o crescimento superior a 10% já está gerando inflação, imagina aqui - afirma Armando Castelar, economista da Gávea Investimentos.

Com taxa de poupança baixa, o Brasil tem que recorrer a recursos externos para financiar seus investimentos, o que pode criar vulnerabilidades. A taxa de investimento do primeiro trimestre deste ano, de 18%, voltou aos patamares do início de 2008, antes da crise. Mas a taxa de poupança, não. Ficou em 15,8% agora e era de 17,5% no primeiro trimestre de 2008.

Para o professor da Unicamp, o economista Ricardo Carneira, a alta poupança chinesa está sustentada em dois pilares: câmbio desvalorizado e salário baixo.

- A maior parte da poupança vem das empresas. Na China, o lucro fica maior com essas variáveis. A poupança das famílias responde por um terço desse volume de recursos - explica Carneiro.

Na China, famílias poupam por falta de previdência

O economista Paulo Levy, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), lista três fatores que estimulam a poupança das famílias na China: compra da casa própria, educação superior e pecúlio para velhice.

No Brasil, há o crédito imobiliário em expansão, tomando lugar da poupança. Como as universidades públicas são gratuitas, a classe média investe na formação básica privada, o que se transforma em gasto corrente e não em poupança. Por último há Previdência Social, que assegura a velhice:

- Há ainda a redistribuição de renda. Quando se transfere renda por meio de aposentadorias e benefícios para classes de renda mais baixa, essa renda vai para o consumo.

Na China, o cenário é bem diferente. Levy lembra que não há previdência social para a maioria da população do país asiático, o que leva a uma poupança maior das famílias.

- Ela é limitada aos trabalhadores formais urbanos. A universidade é paga e, na saúde, somente o básico é garantido para a população. Uma cirurgia, por exemplo, é paga.

Mas a principal diferença entre os dois países, para Levy, é que o estado chinês poupa, ao contrário do brasileiro.

- Por isso, o Brasil não tem condições de aumentar seu investimento, sem recorrer à poupança externa.

Carneiro não vê esse entrave ao crescimento provocado pela baixa poupança doméstica. Para ele, o crédito seria o caminho para financiar os investimentos