Título: Sem tutela
Autor:
Fonte: O Globo, 07/06/2010, Opinião, p. 6

TEMA EM DISCUSSÃO: O papel dos municípios

No primeiro debate entre Dilma Rousseff (PT), José Serra (PSDB) e Marina Silva (PV), durante a 27aConferência da Associação dos Municípios Mineiros, no início de maio, em Belo Horizonte, os três principais postulantes ao cargo de presidente da República se posicionaram a favor de uma melhor distribuição de recursos entre os entes da federação brasileira. Embora esse seja um bom sinal, está longe de ser uma vitória.

Nos últimos 12 anos, o movimento municipalista brasileiro acumulou muitas conquistas, entre elas o aumento de repasse do Fundo de Participação dos Municípios, a criação de linhas de crédito e as assinaturas de decretos e portarias facilitando investimentos e liberando recursos.

A mobilização dos prefeitos de todo o país, concentrandose com secretários e vereadores em Brasília, anualmente, tem se mostrado uma eficiente estratégia de sensibilização de parlamentares e governantes para as necessidades urgentes de adequar e regulamentar leis que garantam a autonomia municipal.

A luta dos gestores municipais não é uma novidade e já ultrapassou vários governos.

Ela foi impulsionada por movimentos que há décadas clamam por uma reforma tributária e fiscal que desonere a população e dê mais recursos aos municípios ¿ o lugar onde todos os cidadãos residem.

No calendário de manifestações públicas, o mês de maio é também o mês escolhido para que empresários se mobilizem em protesto contra a carga excessiva de tributação. Celebra-se, por exemplo, o Dia da Liberdade de Impostos, para lembrar que os cidadãos brasileiros precisam trabalhar 145 dos 365 dias do ano ¿ ou seja, 4,8 meses ¿ exclusivamente para pagar tributos.

Na outra ponta, a legislação brasileira é rígida e engessa a gestão pública com uma série de exigências e limitações para evitar o desperdício e o mau uso do dinheiro público.

As leis garantem a transparência dos atos de governança, mas minimizam a autonomia fiscal dos prefeitos, burocratizam a administração e atrasam a implantação de projetos e a aprovação de obras.

Enquanto isso, e apesar de várias vezes anunciada por diferentes governos, a reforma tributária e fiscal não avança e sai da pauta de discussões do Congresso Nacional ¿ assim como continua sendo adiada a regulamentação de leis que permitam uma distribuição de maneira mais equilibrada das receitas públicas entre os diferentes níveis de governo.

É o caso, por exemplo, da Emenda Constitucional número 29, que estabelece os percentuais dos orçamentos de União, estados e municípios que devem ser destinados às áreas de prestação de serviços de saúde.

Os municípios brasileiros ¿ e eles são cerca de 5.500 ¿ não precisam da tutela dos estados e da União. Precisam, sim, de parcerias, autonomia e agilidade com os estados e a União para avançar no seu desenvolvimento.

A legislação é rígida e engessa o administrador público

JOSÉ SACIDO BARCIA NETO (ZÉ NETO) é prefeito de São Lourenço (MG) e primeirosecretário da Associação Mineira de Municípios.