Título: Receita de uma Justiça rápida
Autor:
Fonte: O Globo, 13/06/2010, Opinião, p. 6

Não há no Estado brasileiro segmento em que se sucedam tantas mudanças estruturais em normas e regimentos como o Poder Judiciário.

Justo aquele cuja imagem é mais contaminada pelas mazelas características da burocracia pública, como a lentidão.

A aprovação, em fins de 2004, da Emenda Constitucional no45, da reforma do Judiciário, serviu para colocar em marcha um rico processo de modernização dos tribunais.

Na semana passada, mais um passo foi dado nesta direção com a entrega ao presidente do Senado, José Sarney (PMDBAP), da proposta de reforma do Código de Processo Civil, uma das peças-chave nas engrenagens judiciais.

Nela estão algumas das causas da ideia disseminada durante muito tempo de que é preciso ter dinheiro para arriscar-se nos meandros do Judiciário. Só bons advogados, bem pagos, conseguem transitar por todo o cipoal das leis. De fato, é o labirinto existente nos diversos códigos que emperra a máquina e facilita manobras advocatícias.

Foi com o objetivo de desatar nós que o ministro Luiz Fux, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), coordenou por seis meses uma comissão criada para encaminhar ao Congresso, o que acaba de ser feito, um novo Código de Processo Civil. Com mais de 1.200 artigos, o atual código vigora desde 1973, e passou por 64 mudanças.

Do trabalho de Fux e comissão, durante o qual foram feitas várias audiências públicas e recebidas, apenas pela internet, 13 mil sugestões, saiu um código mais enxuto, com 977 artigos. Os aperfeiçoamentos buscam atingir alguns objetivos-chave, um deles o aumento na velocidade de julgamento das ações.

Assim, o projeto é coerente com um dos eixos centrais das mudanças realizadas logo após a promulgação da Emenda 45. Ali aprovaram-se, para as altas Cortes, a instituição da súmula vinculante, o princípio da repercussão geral e normas para conter o excesso de recursos.

As súmulas, aprovadas por maioria qualificada de ministros, estendem o mesmo veredicto para litígios idênticos nas instâncias inferiores; e o conceito da repercussão geral permite ao Supremo optar por julgar apenas processos de conteúdo relevante para a sociedade.

Tudo isso já cortou de maneira brutal o número de processos na instância final da Justiça.

Agora, o novo Código de Processo Civil fará o mesmo nas demais instâncias. A restrição no número de recursos ¿ o projeto limita a apenas um ¿ deverá, esperam os autores da reforma, cortar pela metade o tempo de duração dos processos.

O princípio das súmulas será reforçado, outra ajuda no esvaziamento de arquivos e prateleiras, uma garantia ao usuário da Justiça de que seu processo não mofará em arquivos.

A medida terá especial utilidade em litígios envolvendo serviços públicos ¿ reajustes de tarifas, pedidos de indenização por serviço não prestado etc.

O código, a ser apreciado inicialmente pelo Senado, também incentivará o uso de meio eletrônico na tramitação dos processos, outro avanço, coerente com as preocupações do Conselho Nacional de Justiça, também criado a partir da Emenda 45, com a má qualidade administrativa dos tribunais. É otimismo demasiado prever sua aprovação neste ano eleitoral. Mas quanto antes o novo código entrar em vigor, melhor.