Título: Enxurrada de impugnações
Autor: Farah, Tatiana
Fonte: O Globo, 19/06/2010, O País, p. 3

Especialistas preveem que Ficha Limpa barrará muitos candidatos, mas que haverá recursos

SÃO PAULO

A decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que na noite de anteontem julgou que a Lei da Ficha Limpa atinge também os condenados antes da sanção da legislação (no dia 4 de junho), foi uma evolução e levará a inúmeras impugnações de candidaturas, na avaliação do presidente do colegiado de presidentes de Tribunais Regionais Eleitorais (TREs), o desembargador Luiz Carlos Santini, de Mato Grosso do Sul. O TSE decidiu que a lei, que valerá já para as eleições de outubro, atingirá todos os condenados por colegiado (mais de um juiz).

¿ A lei é uma evolução na nossa estrutura e na nossa vida política ¿ disse o desembargador. O Congresso Nacional (que aprovou o projeto) atendeu a um anseio da sociedade. Foi o segundo projeto de iniciativa popular, pois o primeiro foi a Lei do Crime Hediondo.

Agora, as candidaturas devem ser analisadas caso a caso.

Para o desembargador, embora advogados eleitorais afirmem que há brechas para recursos na Justiça e que tentarão derrubar a aplicação da lei este ano junto ao STF (Supremo Tribunal Federal), haverá muitas impugnações.

¿ Primeiro é importante dizer que a lei não está retroagindo: ela foi sancionada antes do processo eleitoral.

Esta não é uma lei de processo eleitoral, é uma lei de inelegibilidade. É uma lei de direito material. Mas vai ter muito recurso, sim, porque faz parte da cultura brasileiro o ¿recorrismo¿.

O desembargador repetiu os argumentos de ministros do TSE ao dizer que a inelegibilidade ¿não é pena, é limitação¿: ¿ Em caso de inelegibilidade você não pode ampliar aquilo que a lei estabeleceu como impedimento para ser candidato. Você não pode impor uma restrição ao direito político maior que a lei estabelece. Não pode haver uma aplicação extensiva, ou seja, aumentar a lei. A lei identifica improbidade administrativa, corrupção eleitoral, vários artigos e crimes.

O desembargador afirmou ainda que os TREs deverão analisar com cautela, em cada caso, a condenação anterior ao pedido de homologação de candidatura: ¿ Vamos ter de fazer uma interpretação de caso a caso. O que seria o entendimento daquele administrador que joga dinheiro público pela janela e faz um ato que deixa o erário público prejudicado? Para cada caso vamos ter de pegar a sentença da condenação e estaremos presos, limitados à sentença.

Para o juiz eleitoral de Imperatriz (MA) e integrante do comitê nacional do MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral), Marlon Reis, a decisão do TSE não deixou dúvidas e não será reformada no STF: ¿ Antes, não podiam se candidatar os que ficaram inelegíveis nos últimos três anos. O novo critério eleitoral estabelece: os que foram inelegíveis nos últimos oito anos. Inelegibilidade não é pena, não é sanção nem punição.

Segundo Marlon Reis, o STF tem o mesmo entendimento sobre inelegibilidade que o TSE.

¿ Quem arriscar contra esse entendimento, misturando direito penal com direito eleitoral, vai perder muito dinheiro com advogados e não vai sair candidato ¿ advertiu o juiz eleitoral, prevendo que os tribunais ficarão ¿abarrotados¿ de recursos dos pretendentes a candidatos.

A Transparência Brasil também elogiou a nova lei, mas avaliou que apenas quando os candidatos começarem a buscar sua homologação é que o país poderá saber como ela vai funcionar. O coordenador da entidade, Fabiano Angélico, destacou ainda que os eleitores deverão ficar atentos para conferir se a ficha judicial divulgada pelo TSE e fornecida pelos candidatos será verdadeira.

¿ Já temos precedentes de outras eleições em que os candidatos forneceram dados errados.

Para tentar driblar a falta de informações, o MCCE vai lançar no mês que vem um portal, mas da Ficha Limpa. Os candidatos sem problemas na Justiça deverão se cadastrar na entidade e fornecer suas certidões jurídicas de ¿nada consta¿.