Título: Chuvas deixam mil desaparecidos em Alagoas
Autor: Rios, Odilon; Lins, Letícia
Fonte: O Globo, 22/06/2010, O País, p. 13

Autoridades têm dificuldades para resgatar os corpos; até agora, há 31 mortos no estado e em Pernambuco

Odilon Rios, Letícia Lins e Chico de Góis

MACEIÓ, RECIFE e BRASÍLIA. As chuvas no Nordeste, que já duram uma semana, deixaram 19 pessoas mortas em Alagoas e outras 12 em Pernambuco, mas este número deve aumentar mais. A Defesa Civil de Alagoas informou ontem que havia 1.078 pessoas desaparecidas, levadas pela correnteza dos rios ou atingidas por desabamentos.

O número de desaparecidos é baseado em relatos de sobreviventes de áreas atingidas pelas enchentes. Há famílias inteiras desaparecidas, e as autoridades de Alagoas estão tendo dificuldades no trabalho de resgate de corpos.

¿ Achamos 13 corpos na cidade.

Pelo menos 30 devem ser encontrados nos próximos dias ¿ disse o prefeito de União, Areski Freitas (PTB), a mais atingida pelas chuvas.

Alagoas está com 15 cidades em situação de calamidade e 70 mil desabrigados ou desalojados.

Casas, ruas, pontes, canos de água e móveis foram arrastados pela força das águas dos rios Mundaú e Paraíba, o que mais encheu por causa da chuva. Os prédios públicos da cidade de Branquinha desmoronaram; cartórios das cidades de Murici, União dos Palmares e Rio Largo submergiram, destruindo os documentos de comprovação de posse das residências destas cidades atingidas pela água.

O governo do Rio enviou ontem dois hospitais de campanha para Alagoas. Governadores de São Paulo, Minas e Rio Grande do Sul disseram ao governador Teotônio Vilela Filho (PSDB) que ajudarão com mantimentos e roupas.

Em Pernambuco, 49 municípios atingidos O primeiro dia de sol ¿ depois de quase uma semana de chuvas fortes ¿ serviu apenas para mostrar o tamanho do estrago da inundação que varreu 49 municípios pernambucanos, e que havia deixado até ontem à tarde 42.360 pessoas desabrigadas ou desalojadas, com um número oficial de doze mortos.

Em cidades como Palmares e Barreiros, ambos na Zona da Mata, o rastro da destruição é muito grande: há pontes caídas, casas derrubadas, pedaços de edificações e móveis espalhados pelas ruas e automóveis emborcados depois de terem sido levados pela correnteza.

E um rio de lama.

O g o v e r n a d o r E d u a rd o Campos (PSB) viajou à tarde para Brasília para fazer um relato da situação ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Antes de embarcar, Campos disse ser necessária uma verba de pelo menos R$ 100 milhões para recuperar parte dos estragos, que deixaram nove municípios em estado de calamidade e quatro em situação de emergência.

De acordo com o governador, 1.449 quilômetros de estradas foram destruídos, e 69 pontes e 6.407 casas sucumbiram à correnteza ou ao deslizamento de barreiras. Ele especificou, ainda, que 17.808 pessoas estão desabrigadas (perderam suas casas) e que 24.552, desalojadas (tiveram que deixar as residências, mas vão retornar assim que as águas baixarem).

Na capital, a Comissão de Defesa Civil de Recife (Codecir) concluiu ontem o cadastramento das 167 famílias desalojadas e das 38 desabrigadas.

Elas vão receber auxíliomoradia, segundo assegurou o prefeito João da Costa (PT).

¿Minha cidade está lembrando o Haiti¿ O prefeito informou que houve 157 deslizamentos de barreiras na capital. Ontem, a prefeitura disponibilizou oito endereços para coleta de doações.

Uma rede de supermercados doou dez toneladas de alimentos, e a prefeitura enviou parte para as populações flageladas do interior. A cidade deve receber duas pontes móveis do Exército para ajudar na ligação de bairros alagados.

Em Palmares, a 125 quilômetros da capital, a água começou a baixar, deixando marcas de até cinco metros de altura nas paredes. O principal hospital da cidade transferiu os pacientes para outra unidade e colocou equipamentos no primeiro andar, mas perdeu tudo porque o pavimento foi invadido pela enchente do rio Una. A principal praça da cidade virou uma cratera e carros ainda eram vistos no meio da água. A ponte que liga a cidade à BR101 ruiu e os escombros ontem estavam em todos os lugares.

Em Barreiros, a 110 quilômetros da capital, o radialista Jailton Messias fez ontem uma descrição dramática da situação de sua cidade em entrevista à Rádio Jornal do Commercio, de Recife: ¿ Minha cidade está lembrando as cenas que vi pela televisão do terremoto do Haiti.

Está tudo devastado, a prefeitura, o hospital, o posto de saúde. A gente só faz chorar.

Caiu uma cidade inteira.

Segundo a Comissão de Defesa Civil de Pernambuco, a Zona da Mata, onde se concentra a agroindústria açucareira do estado e também uma das mais miseráveis, foi a mais afetada. O secretário de Recursos Hídricos, João Bosco de Almeida, disse que 37 localidades de 28 municípios tiveram o abastecimento afetado, e, em cerca de 30 deles, o colapso foi total. Dos 28, 18 ficam na área canavieira. Entre os problemas apresentados, estão 13 estações elevatórias inundadas e oito adutoras rompidas pelas águas.

Os governadores de Alagoas e de Pernambuco reuniramse ontem à noite com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Eles pediram que o governo federal envie mais tropas do Exército para ajudar na entrega de mantimentos e água. Lula disse que já há cerca de R$ 300 milhões disponíveis no Orçamento federal e que poderão já ser liberados a partir de hoje para despesas emergenciais. Hoje, o Gabinete de Crise, integrado por nove ministérios, reúne-se para ver que outras medidas podem ser tomadas.

Teotônio Vilela disse que a utilização do FGTS para a reconstrução de casas beneficiará poucas pessoas. Ele observou que a área mais atingida no seu estado também é a Zona da Mata, onde a maioria dos trabalhadores não tem vínculo empregatício e, desta maneira, não tem FGTS. O presidente disse que vai visitar a região, mas não marcou uma data.