Título: Irã deixa negociações em suspenso até agosto
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Fonte: O Globo, 29/06/2010, O Mundo, p. 29

Ahmadinejad pede inclusão de independentes nas conversas, em referência a Brasil e Turquia. Mais firmas cortam negócios

TEERÃ. Mesmo isolado politicamente e cada vez sob maiores restrições econômicas, o Irã não dá sinais de se dobrar e anunciou ontem que só voltará a negociar o seu programa nuclear em agosto, como forma de punir as grandes potências por imporem sanções ao país. E para isso, o presidente Mahmoud Ahmadinejad impôs três condições: que os países participantes esclareçam se são contra ou a favor de Israel ter um arsenal nuclear; se apoiam o Tratado de Não Proliferação de Armas; e se desejam ser amigos ou inimigos do Irã.

Ahmadinejad sugeriu ainda que "países independentes que acreditam na justiça e no respeito" sejam convidados para as negociações. A declaração foi interpretada como um pedido para que Brasil e Turquia - que votaram contra a quarta rodada de sanções na ONU no início do mês - juntem-se ao grupo, formado atualmente pelos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas mais a Alemanha. Ele advertiu também que o Irã vai retaliar se seus navios forem inspecionados em busca de cargas suspeitas, como determinam as novas punições da ONU.

- Nós nos reservamos o direito de retaliar - disse Ahmadinejad. - Se alguns insistirem, a experiência mostra que podemos defender nossos direitos. Vão se arrepender fortemente.

Total e Repsol seguem sanções e suspendem contratos

As negociações entre o governo iraniano e a Agência Internacional de Energia Atômica estão paradas desde outubro. Em fevereiro, Teerã anunciou que começara a enriquecer urânio a 20% - deixando preocupados os países que temem que Teerã enriqueça a níveis ainda maiores para produzir uma bomba. Brasil e Turquia conseguiram, em maio, que o governo iraniano aderisse à proposta de enriquecimento de urânio no exterior, mas as potências responderam que o país já aumentara seu estoque e seguiram adiante aprovando novas sanções.

Ontem, Ahmadinejad voltou a afirmar que preferia comprar o urânio enriquecido no exterior. Mas disse que o país não estaria preparado para conversar antes da segunda metade do mês sagrado do Ramadã, no final de agosto. Para ele, essa demora "é uma punição" ao Ocidente.

Além das sanções da ONU - que adicionam mais 40 empresas do país a uma lista negra -, o Irã enfrenta ainda restrições adicionais dos Estados Unidos e da União Europeia.

Apesar da pressão, Ahmadinejad zombou das declarações do chefe do serviço de inteligência americano, Leon Panetta, de que o país já tem material para produzir duas bombas, e advertiu sobre possíveis acidentes no estoque nuclear americano, perguntando como um país que não consegue conter um vazamento de petróleo pode estocar milhares de bombas atômicas.

- Eles estão com tanto medo de duas bombas? Há 20 mil bombas estocadas e eles estão preocupados com a possibilidade da existência de duas? - perguntou.

A pressão econômica sobre o país cresceu ontem, depois que mais duas companhias de petróleo suspenderam negócios com o país. Embora exporte petróleo, o Irã precisa importar combustível.

A empresa francesa Total suspendeu a venda de gasolina, e a espanhola Repsol cancelou um contrato para desenvolver a exploração de gás no país. Antes, a Royal Dutch Shell, BP, Reliance Industries e a suíça Glencore já estavam entre os fornecedores de combustível que suspenderam os contratos com o Irã, já que as sanções aprovadas pelo Congresso americano punem quem forneça gasolina ao país.

Emirados congelam contas de empresas na lista negra

Complicando mais o cenário iraniano, o Banco Central dos Emirados Árabes Unidos ordenou às instituições financeiras que congelem as contas de empresas citadas na resolução da ONU. Os emirados e o Irã têm relações comerciais próximas, além de dezenas de milhares de iranianos viverem e trabalharem na região, principalmente em Dubai, mas os EAU estavam sob forte pressão para implementar as sanções - numa decisão que deixa o Irã ainda mais isolado.

- Os Emirados Árabes Unidos, Dubai especialmente, estavam sob muita pressão. Agora dão sinais de que estão do lado da comunidade internacional - disse Gala Riani, analista de Oriente Médio do IHS Global Insight.