Título: Agaciel Maia no rumo da forca
Autor: Lima, Daniela; Foreque, Flávia
Fonte: Correio Braziliense, 24/06/2009, Política, p. 6

Relatório da comissão que analisou os 663 atos secretos tem repercussão dupla: parlamentares negam envolvimento e pensam em delegar culpa ao servidor que dirigiu o Senado por 15 anos

Serão investigados pela comissão de sindicância os diretores Agaciel Maia e José Carlos Zoghbi Arthur Virgílio (PSDB-AM)

Iano Andrade/CB/D.A Press - 15/7/08

Quem tem responsabilidade deve ser punido. Seja senador, seja servidor Aloísio Mercadante (PT-SP)

Os senadores querem lavar as mãos. Na tarde de ontem, às vésperas da publicação de relatório da comissão que investigou o conteúdo de 663 atos secretos, os parlamentares, em romaria, foram à tribuna do Senado alegar que não sabiam, não conheciam e nunca tinham tomado ciência de nomeações, exonerações e concessões de privilégios que feriram a lei ao não ganharem publicidade. A cena ilustrou a vontade do plenário em apresentar a fatura dos atos secretos ao ex-diretor-geral da Casa Agaciel Maia. A análise, feita até por aliados do presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), é de que o conteúdo desses atos resultará na demissão do homem que dirigiu o Senado por 15 anos.

A avaliação é de que Agaciel se tornou um problema incontornável: alguém que acabou maior do que o próprio Senado. No entanto, ao atribuírem a crise ao servidor, os parlamentares criam um bode expiatório, o que abre as portas para a impunidade de senadores envolvidos com a não publicação desses documentos.

Mostra clara da disposição do plenário em sangrar Agaciel para pagar a conta da crise foi a reação de alguns senadores, à noite, após a distribuição do conteúdo dos 663 atos secretos à imprensa. O senador Demóstenes Torres (DEM-GO), por exemplo, formalizou pedido de suspensão, a bem do serviço público, de Agaciel Maia. Munido de atos secretos que nomearam em seu gabinete uma servidora que, na verdade, prestava serviços na Secretaria de Recursos Humanos na Casa, ele pediu a abertura de processo administrativo contra o ex-diretor-geral do Senado. ¿O fato é que Agaciel nomeou e lotou em meu gabinete uma servidora sem que eu tivesse conhecimento¿, disse Demóstenes.

Foi por meio dos atos secretos que 350 servidores do Senado passaram a receber mais do que o teto do serviço público, de R$ 24,5 mil; e que foi estendida a diretores-gerais e secretários-gerais da Casa a assistência médica vitalícia, que até 2000 era prerrogativa exclusiva dos parlamentares. Até o momento, este será o único dentre os 663 atos que será anulado.

Os atos também criavam cargos na estrutura da Casa e escondiam nomeações de parentes e afilhados políticos, por exemplo. Ontem, a comissão apresentou relatório conclusivo dos trabalhos. O nome do ex-diretor-geral do Senado não é mencionado em nenhuma das 16 páginas.

Indícios As conclusões da comissão amenizam o impacto da revelação de que, nos últimos quinze anos, foram elaborados 663 atos secretos. O texto, apresentado pelo primeiro-secretário do Senado Heráclito Fortes (DEM ¿ PI), se limita a afirmar que a não publicação dos boletins ¿pode ter sido originada por simples falha humana, erros operacionais e deficiências na tramitação¿.

A conclusão do relatório indica, no entanto, que as centenas de atos secretos representam ¿indícios¿ de uma ¿deliberada falta de publicidade de ações¿ e assim, recomenda a abertura de sindicância para investigar os responsáveis. Doris Marise, servidora que chefiou a comissão dos atos secretos, disse que não precisou citar nomes no relatório. ¿Eu não precisei citar nomes. Eles ocupavam cargos. O regimento diz que o diretor-geral é responsável pela publicação dos boletins em um primeiro momento¿, justificou ela, que foi nomeada ontem nova diretora de Recursos Humanos do Senado.

ESSÊNCIA DO DOCUMENTO

Conclusões

Houve 663 atos secretos identificados entre 1º de janeiro de 1995 e 12 de junho de 2009. Para a comissão, eles podem ser resultado de falha humana, de erros operacionais ou de deficiências na tramitação e publicação dos atos

O relatório aponta que, devido ao número limitado de servidores encarregados de levantar os atos, não foi possível ¿emitir juízo acerca da autenticidade e do conteúdo dos boletins¿

Recomendações

Abertura de sindicância para apurar os possíveis responsáveis pela edição dos atos secretos

Criação de um Boletim Administrativo Eletrônico de Pessoal, a ser divulgado na intranet da Casa, para publicação de todas as decisões ligadas à administração de pessoal do Senado

Proibição da edição de boletins com datas retroativas ou sem a correspondente publicação

Verificação de existência de atos secretos nos arquivos dos órgãos de administração do Senado Federal

Convidado a se ausentar

Outro servidor que vê sua permanência no Senado ameaçada é João Carlos Zoghbi. Ex-diretor de Recursos Humanos do Senado, ele tinha entre as atribuições a publicação dos atos administrativos. A oposição reivindicou ontem, em reunião da Mesa Diretora, que não só Agaciel, mas também Zoghbi seja afastado do Senado durante os trabalhos da sindicância.

Para frustração da oposição, no entanto, a reivindicação acabou descartada pela Mesa Diretora, que alegou não poder proibir servidores de trabalhar. A recusa em formalizar os afastamentos de Agaciel e Zoghbi resultou em resolução inusitada. De acordo com o líder do PSDB na Casa, Arthur Virgílio (AM), José Sarney (PMDB) se comprometeu a fazer um apelo para que ambos não trabalhem enquanto as apurações estiverem em andamento.