Título: G-20 se mostra flexível diante do futuro
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Fonte: O Globo, 29/06/2010, Opinião, p. 6

Depois da reunião de fim de semana do G-20, o grupo das economias mais desenvolvidas do planeta, pode-se concluir que Toronto, no Canadá, local do encontro, ficou no meio termo entre Washington e Berlim.

Nos últimos meses, com o agravamento da crise europeia, turbinada pela virtual insolvência da Grécia e, como decorrência, o grande aumento do custo de rolagem dos títulos das dívidas espanhola, portuguesa e irlandesa, entre outras, a Alemanha, tradicional bastião da responsabilidade fiscal num continente formado por estados gastadores por excelência, endureceu sua posição a favor do aperto de cintos. Enquanto isso, o governo americano, às voltas com uma economia com alta taxa de desemprego, ainda sem sinais fortes de que há uma sólida recuperação a caminho - e num ano eleitoral -, registra preocupações com o risco de um aperto fiscal generalizado gerar mais uma recessão mundial, embora não deixe de reconhecer a necessidade de cortar o próprio déficit público, construído na operação para evitar o derretimento de Wall Street - com sérias implicações globais.

O documento final da reunião do G-20 ficou na coluna do meio: recomenda o corte pela metade do déficit nos países desenvolvidos até 2013, a estabilização ou redução do endividamento dentro de mais três anos, ou seja, 2016; e ainda formaliza, como não poderia deixar de ser, o compromisso do grupo com o crescimento. Há bons argumentos de lado a lado. Quando o governo de Angela Merkel, chanceler alemã, anuncia um pacote de cortes de 80 bilhões de euros, do qual constam demissões de 15 mil servidores e corte de 40 mil nas forças armadas, ele dá um exemplo prático do que considera ser o caminho para a Europa. E tem razão, pois, se as dívidas nacionais no bloco europeu não puderem ser renovadas a taxas suportáveis, de fato não haverá retomada de crescimento. Para isso, é preciso seriedade fiscal, para que o mercado financeiro volte a adquirir títulos de dívida soberana, sem exigir juros escorchantes.

Há, porém, o outro lado, e talvez não exista, nos Estados Unidos, porta-voz mais credenciado dos críticos ao que seria a inoportunidade de apertos fiscais do que o economista Prêmio Nobel Paul Krugman. Ontem, em sua coluna no "New York Times", mais uma vez Krugman comparou a situação atual com o que aconteceu em 1933, quando a economia americana deu sinais de recuperação e as autoridades da época apertaram as políticas fiscal (gastos) e monetária (juros). Resultado: veio a Grande Depressão. Ele teme que o erro se repita. Talvez Krugman esteja sendo muito pessimista.

O encontro de Toronto deu espaço para quem se preocupa em manter os estímulos ao crescimento. A rigor, existem aspectos em países e regiões que precisam ser considerados, mesmo sendo de extrema importância este tipo de coordenação mundial que parece ter encontrado seu fórum no G-20.

O Brasil, por exemplo, depois de ter errado nos estímulos fiscais - porque preferiu inflar gastos em custeio e não investimentos, e, ainda por cima, gastos que se eternizam - está em situação oposta à americana: tem de puxar as rédeas, para evitar um descontrole da inflação.