Título: E deu... vermelho!
Autor: Wurman, Osias
Fonte: O Globo, 29/06/2010, Opinião, p. 7

E deu o que todos, menos três países, previam: uma enxurrada de votos contra o Irã no Conselho de Segurança da ONU (12 a favor das sanções ao Irã, dois contra e um neutro). Até o Líbano, sede do "afilhado predileto" iraniano - o movimento guerrilheiro Hezbollah - manteve a tradição dos perdedores e votou neutro.

Brasil e Turquia desafinaram e quase criaram sérios empecilhos aos objetivos maiores na geopolítica mundial: um mundo sem novas armas nucleares, especialmente nas mãos de patrocinadores do fundamentalismo cego e ameaçador. O resultado da votação foi bom para o mundo, melhor para a paz, e ruim para Brasil e Turquia.

O governo brasileiro vinha acumulando fichas, há décadas, credor de ações equilibradas e construtivas do Itamaraty no cenário da diplomacia mundial, apesar das recentes derrotas em Honduras, OMC e Unesco. Apostou todas as fichas acumuladas numa aventura político-diplomática que se baseou em acreditar e apoiar o governo que acumula, atualmente, o maior descrédito diplomático internacional: o Irã.

Países árabes, ligados ao Ocidente, trabalharam pela derrota do Irã, como Egito, Arábia Saudita, Kuwait e até o presidente da ANP, Mahmoud Abbas, pois temem o agressivo Irã dos aiatolás e, indiretamente, torceram pela derrota do Brasil e da Turquia.

Todas as fichas no preto. E deu... vermelho! Nada a ganhar, só a perder. Voltamos à estaca zero em nossa pretendida coliderança diplomática mundial. Roleta viciada ou "birra" do cassino?

As reações de Ahmadinejad demonstram bem o perigo que seus rompantes representam para a democracia. Logo após a divulgação do resultado da votação, Ahmadinejad disse que a resolução tratava-se de "simples papel para ser jogado no lixo", expressando seu desrespeito à ONU. Depois, ameaçou a Rússia caso esta não entregasse ao Irã os mísseis S-300 que havia comprado e que Putin disse estarem embargados pela resolução da ONU.

No aniversário das eleições de 2009, dezenas de iranianos desafiaram as ordens da Guarda Revolucionária iraniana e saíram às ruas para lembrar e protestar pelo massacre de ativistas e estudantes que se opuseram à suposta fraude eleitoral que reelegeu o presidente iraniano. Doze estudantes foram presos na Praça da Revolução, em Teerã, e mais seis na Universidade Sharif. Outras manifestações ocorreram em Mashaad, Shiraz e Isfahan.

Na verdade, Ahmadinejad procurou, desesperadamente, apoiar-se em duas nações que integram o Conselho de Segurança da ONU e que gozam da simpatia mundial por terem regimes democráticos e serem países laicos: Brasil e Turquia. Mas parece que, no balanço final dos acontecimentos, tratou-se de um "abraço de afogado".

OSIAS WURMAN é jornalista e cônsul honorário de Israel no RJ. E-mail: owurman@globo.com.