Título: STF rejeita intervenção no Distrito Federal
Autor: Carvalho, Jailton de
Fonte: O Globo, 01/07/2010, O País, p. 17

Para sete dos oito ministros da sessão, medidas tomadas após descoberta de mensalão do DEM foram suficientes

BRASÍLIA. Mesmo depois de comparar o esquema de desvio de dinheiro público supostamente chefiado pelo ex-governador José Roberto Arruda a um câncer, o Supremo Tribunal Federal rejeitou ontem, por sete votos a um, o pedido de intervenção no Distrito Federal. Os ministros presentes à sessão que votaram contra entenderam que as denúncias sobre o chamado mensalão do DEM são graves, mas a sangria dos cofres públicos já estaria sendo controlada a partir da reação do Ministério Público Federal e das instituições atingidas pelas acusações do procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Manifestantes ergueram faixas na entrada do STF pedindo a medida.

O plenário rejeitou o pedido de intervenção a partir do voto do relator do caso, o presidente do STF, Cezar Peluso. Para o ministro, a intervenção seria uma medida drástica demais para o princípio de autonomia federativa, e só deveria ser adotada se o governo local e a Câmara Legislativa não tivessem tomando nenhuma providência contra a corrupção.

- Os fatos recentes não deixam dúvidas de que a metástase da corrupção já foi controlada por outros mecanismos institucionais menos agressivos ao organismo distrital, revelando agora a desnecessidade de se recorrer ao antídoto extremo da intervenção - afirmou.

Peluso citou as mudanças na cúpula do governo, a decisão do novo governador, Rogério Rosso, de pedir auditoria sobre os contratos assinados na gestão de Arruda, e as investigações internas da Câmara que, na semana passada, resultaram na cassação do mandato da deputada Eurides Brito (PMDB), acusada de envolvimento com o mensalão.

"A solução está na mão dos eleitores", diz Peluso

O ministro mencionou ainda a decisão do Tribunal de Contas do Distrito Federal de rejeitar as contas de Arruda. Ele lembrou, no entanto, que o combate à corrupção depende especialmente do aprimoramento "da cultura cívica" e da " ação consciente do povo de, pelo voto, desfazer amanhã as más escolhas de ontem":

- Não há soluções mágicas. A decisão está nas mãos dos eleitores do Distrito Federal.

O voto do relator foi endossado praticamente com os mesmos argumentos pelos ministros José Antônio Dias Tóffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Celso de Mello. O único a votar pela intervenção foi Carlos Ayres Britto. Terceiro a votar, ele afirmou que boa parte da reação das autoridades locais é apenas estratégia de sobrevivência política e não de uma projeto de recuperação moral.

- O Distrito Federal padece de leucemia ética, democrática e cívica. O caso é de hecatombe institucional. E a intervenção serve como uma luva encomendada. Acho a oportunidade excelente para se fazer uma profilaxia.

O ministro argumentou que Arruda e o ex-vice-governador Paulo Octávio renunciaram apenas para embaraçar a investigação de fatos ainda mais escandalosos que estão sendo apurados pela Operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal. Um dos últimos a votar, Marco Aurélio disse que a intervenção teria péssima repercussão para a imagem do país no exterior. Ayres Britto também discordou do colega:

- Poderia haver muitas interpretações sobre a intervenção. Uma delas é de que o Brasil é um país sério e resolveu cortar na própria carne.

A reação de Ayres Britto provou um acirramento do debate. Mas o ministro acabou isolado. Um dos últimos a se manifestar, o ministro Gilmar Mendes disse que a "metástase da corrupção" estava debelada. Para ele, o simples pedido de intervenção já teve o papel de induzir a reação das instituições locais. Segundo Gilmar, a medida poderia trazer complicações até para as eleições de outubro.

- Nas circunstâncias atuais, foram tomadas providências e o sistema institucional encontrou respostas para as mazelas apontadas pelo procurador-geral. A intervenção seria um salto no escuro nesse momento - disse.

Ministério Público agora vai atrás dos acusados

Depois do julgamento, Roberto Gurgel disse que respeita a decisão do STF. Segundo ele, o Ministério Público se concentrará agora na ação penal para responsabilizar todas as pessoas envolvidas nos desvios de dinheiro investigados na Operação Caixa de Pandora. O pedido de intervenção foi feito no início do ano depois da primeira etapa das investigações da Caixa de Pandora. Para o procurador-geral, o esquema de propina supostamente chefiado por Arruda atingiu em cheio o governo local e a Câmara Legislativa.