Título: Um atraso em alta velocidade
Autor: Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 14/07/2010, Economia, p. 21

Após demora de quase 2 anos, leilão do trem-bala será a 14 dias do fim do governo Lula

Com um ano e dez meses de atraso em relação ao cronograma original, o governo marcou para o dia 16 de dezembro, na Bolsa de Valores de São Paulo, o leilão do Trem de Alta Velocidade (TAV), que ligará o Rio de Janeiro a São Paulo e Campinas. Ao custo de R$33,1 bilhões - 65% superior aos R$20 bilhões estimados em janeiro de 2008 - as obras na Estrada de Ferro 222, nome oficial do trecho ferroviário Rio-Campinas, começarão no fim de 2011. O vencedor do leilão terá até dezembro de 2017 para concluir a empreitada.

O presidente Lula lançou ontem um desafio aos vencedores: ele acha possível que a obra do trem-bala esteja pronta em 2016 para as Olimpíadas.

- Aqui faz muito sol, a gente pode trabalhar, se quiser, em três turnos, aos sábados e domingos, pode acertar qualquer coisa, desde que o objetivo seja entregar a obra da melhor qualidade possível - disse Lula, durante o lançamento do edital de licitação.

Japoneses já partem em vantagem na licitação

A ministra da Casa Civil, Erenice Guerra, disse que, se perguntassem por que construir trem de alta velocidade no país, a resposta seria simples:

- Porque podemos. Porque temos ousadia. É um sinal de amadurecimento do Brasil, de um país que vem num processo de crescimento.

Segundo o diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Bernardo Figueiredo, os empreendedores consideram que o tempo de construção pode variar de quatro a cinco anos. Os seis anos serão tolerância máxima. Por isso, disse ser possível que uma parte da obra, como o trecho entre Campinas e São Paulo, esteja operando até a Copa do Mundo de 2014. Mas o governo quer que ela já esteja pronta a tempo para as Olimpíadas de 2016.

- Nós buscaremos com os investidores criar condições para a obra sair num prazo de quatro anos. Até porque é interesse do concessionário. Os investidores terão interesse em buscar as Olimpíadas como data para construção do projeto.

A decisão sobre onde será iniciada a obra, se será feita em etapas e do trajeto definitivo caberá ao consórcio vencedor.

O texto do edital estará disponível a partir de hoje, mas desde ontem ficou claro o interesse internacional na obra. Estiveram na solenidade os embaixadores de Canadá, França, Alemanha, Coreia do Sul, Japão e China. Segundo o ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, grupos italianos voltaram a manifestar ontem interesse pela obra.

Os japoneses já partem em vantagem na licitação. O edital estabelece que, em caso de empate entre os valores da tarifa teto - critério para escolha do vencedor - será classificada em primeiro lugar a que provar maior tempo de operação comercial de trens de alta velocidade. Bernardo admitiu que o Japão tem o sistema mais antigo do mundo. Mas o ministro dos Transportes frisou que não há favorecimento a concorrente:

- Pode haver um misto de tecnologias numa única proposta, como a coreana aliada à francesa. A licitação está aberta e não tem vício de engenharia ou tecnologia.

A tarifa teto será de R$0,49 por quilômetro, o que significa que o bilhete entre Rio e São Paulo, na classe econômica, será de no máximo R$199. O valor será cobrado mesmo se o passageiro for do Centro do Rio ao Galeão. Segundo Figueiredo, não é intenção do governo estimular viagens nos trajetos aeroporto-centro. Os preços para a classe executiva serão liberados. O tempo de viagem entre os centros carioca e o paulista será de 93 minutos. Estima-se um intervalo de 20 minutos entre um trem e outro.

Obra terá R$19,9 bi do BNDES, que poderá reduzir juros

A obra toda terá financiamento de R$19,9 bilhões do BNDES e outros R$5,7 bilhões do Eximbank do país de origem dos fornecedores de equipamentos. O financiamento do BNDES vai prever cláusulas para compensar a baixa demanda nos primeiros dez anos. O risco será do empreendedor, mas o contrato terá duas revisões. Nelas, o BNDES poderá reduzir a os juros cobrados - TJLP (hoje em 6% ao ano) mais 1% - ou até rever a carência de pagamento, de cinco a 12 anos. O BNDES já gastou R$10 milhões com estudos e projetos até agora.

O edital também estabelecerá índices de nacionalidade para a obra. Segundo o assessor da presidência do BNDES, Paulo Lins, para o material rodante, por exemplo (locomotivas, vagões), até o fim do projeto 25% devem ser produzidos no Brasil. A parte de infraestrutura será 100% brasileira. Devem ser criados 12 mil empregos na fase de construção, 30 mil diretos e indiretos nos primeiros dez anos de operação do trem e outros 30 mil entre o décimo e o 30º ano.