Título: Governo recua e 'Segurobrás' agora terá de ser aprovada pelo Congresso
Autor: Martha Beck e Cristiane Jungblut
Fonte: O Globo, 14/07/2010, Economia, p. 22

Campo de ação da 12ª estatal será menor e criação não é mais via MP

BRASÍLIA. Diante das fortes críticas da oposição, de empresários e especialistas à criação de mais uma estatal - a Empresa Brasileira de Seguros S.A. (EBS) - o governo recuou e desistiu de editá-la por meio de medida provisória (MP). A decisão agora é enviar um projeto de lei ao Congresso Nacional. O campo de ação da empresa também será menor. A minuta que será enviada ao Legislativo estabelece em quais áreas a EBS vai atuar.

Segundo os técnicos da área econômica, a seguradora pública vai trabalhar nos ramos de infraestrutura, interesse social (como crédito para micro e pequenas empresas) e exportação. De acordo com um assessor do Ministério da Fazenda, embora estivessem sobre a mesa minutas que tratavam da atuação da estatal no mercado de forma genérica, o governo preferiu deixar claro que vai agir apenas onde for necessário.

- Da forma como estava, havia espaço para que a seguradora pudesse fazer até seguro de carro e de viagem - disse.

Essa fonte lembrou que, na área de exportações, por exemplo, a seguradora só vai atuar em negócios de valor elevado e em contratos superiores a dois anos. Já no setor de infraestrutura - onde há maior preocupação em função de obras do PAC - a estatal sempre atuará em consórcio com o setor privado.

Mantega defende criação da EBS para suprir deficiências

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, saiu ontem em defesa da EBS. Segundo ele, a ideia da equipe econômica é suprir uma deficiência que existe hoje no país, uma vez que o setor privado não teria condições de garantir grandes projetos previstos para os próximos anos.

- Estamos criando a empresa para dar apoio a todos esses projetos de investimento que estamos fazendo. Todos eles precisam de seguros. Mas temos uma estrutura pouco eficiente no Brasil - disse o ministro, que se reunirá com representantes do setor privado semana que vem para discutir o assunto. - Eu espero que o setor privado cresça o suficiente para poder suprir a demanda. Se ele já estivesse dando conta, não precisaríamos criar a seguradora.

Mantega afirmou que não se trata de competir com o setor privado na área de seguros ou de estatizar o segmento. O que o governo quer, diz, é fazer parcerias com as empresas para garantir obras de grande porte:

- Vamos fazer consórcios. Isso significa fazer operações em conjunto com as seguradoras brasileiras. Não tem nada de estatização. Isso é uma bobagem.

O ministro disse que não é intenção do governo ter o monopólio do setor, tanto que está trabalhando para privatizar o Instituto de Resseguros do Brasil (IRB). O IRB está sendo negociado com Bradesco, Itaú e Banco do Brasil, que já são sócios.

Segundo técnicos da área econômica, uma prova de que o setor privado não tem fôlego para toda a demanda do mercado é a necessidade de o país ter tantos fundos garantidores. Eles hoje são sete, somam R$18 bilhões, e estão voltados para áreas como habitação, parcerias público-privadas (PPPs) e indústria naval. Isso faz com que a sua alavancagem seja pequena, pois os recursos ficam concentrados em fundos específicos e não podem ser transferidos de um setor econômico para outro.

Oposição critica criação de nova empresa pública

Por isso, a intenção da EBS é unificar esses fundos, deixando de fora apenas aquele voltado para exportações. Essa fusão permitiria que mais operações fossem garantidas simultaneamente em vários setores distintos. A fonte inicial de recursos para esse fundo seria o que está depositado hoje no Fundo Garantidor de Parcerias Público-Privadas (FGP), cerca de R$4 bilhões. Desse total, uma parcela menor (R$1 bilhão) serviria para capitalizar a seguradora pública.

Parlamentares da oposição criticaram a intenção do governo de criar mais uma estatal. O líder do DEM na Câmara, deputado Paulo Bornhausen (SC), considerou a ideia "um deboche".

- Devem estar com falta de emprego para a "companheirada". É mais um absurdo, o Estado-empresário - disse.

Na mesma linha, o líder do PSDB na Câmara, deputado João Almeida (BA), disse que a empresa criaria mais empregos para pessoas ligadas ao governo.

No Senado, a reação mais forte foi de Álvaro Dias (PSDB-PR).

- Uma das críticas contumazes ao governo Lula diz respeito ao gigantismo da máquina pública. O que mais preocupa é o cunho estatizante que essa medida contempla - disse.