Título: Câmara, a síndica generosa
Autor: Torres, Izabelle
Fonte: Correio Braziliense, 25/06/2009, Política, p. 6

Casa passou a gastar quase R$ 15 mil mensais para manter dez apartamentos que eram ocupados por ¿apadrinhados¿

Apartamento na 203 Sul era ocupado por sobrinho de ex-deputado. Hoje, Câmara paga aluguel mensal de R$ 650

Depois de travar uma briga pelo despejo dos antigos apadrinhados que viviam em 24 imóveis funcionais da Câmara constantes da reserva técnica, os custos da desocupação já começam a aparecer na lista de gastos da Casa. Desde abril, o órgão passou a pagar condomínios e taxas de pelo menos 10 apartamentos vazios. A conta chega a quase R$ 15 mil somente nos meses de abril e maio, segundo dados de um sistema oficial de controle do orçamento. Apesar da despesa, o quarto-secretário, Nelson Marquezelli (PTB-SP), estuda desistir de devolver os bens para a União e mantê-los sob comando da Câmara.

Para isso, precisa que a Mesa aprove novas regras para a ocupação desses imóveis e sua distribuição entre os funcionários. Há um mês, o secretário propôs um texto de regulamentação no qual servidores em cargos de confiança que ocupassem funções de chefias poderiam morar nesses apartamentos. Os integrantes da Mesa, no entanto, não simpatizaram com a ideia. A proposta continua em análise.

Os parlamentares se preocupam com a repercussão da medida e com o aumento da conta com taxas extras e com a manutenção desses apartamentos. Em tempos de artilharia contra o Congresso, aumentar despesas não é visto como um ato inadiável. Não é para menos. Manter os imóveis em poder da Câmara já custou este ano R$ 4,4 milhões. A conta tem sido crescente ao longo dos anos. Em 2008, a rubrica de manutenção dos bens registrou despesa de R$ 17 milhões em serviços e outros R$ 2 milhões com a compra de material de limpeza. No ano anterior, foram R$ 15 milhões. Isso somente com serviços de limpeza, portaria e zeladores.

O pagamento de condomínios e de taxas extras também não economiza números. Nos primeiros seis meses de 2009 foram gastos R$ 38,9 mil. Se a despesa continuar no mesmo ritmo, fechará o ano em mais de R$ 77 mil. O acumulado no ano passado ficou em R$ 67 mil. Esse aumento se explica pelos reajustes das taxas de condomínio e só é reduzido quando os imóveis são ocupados por outros órgãos ou por servidores, já que a Casa paga todas as contas dos apartamentos ocupados por parlamentares.

Auxílios e mordomias O quadro de despesas da Câmara com moradia não se restringe à manutenção dos imóveis ou aos condomínios pagos. Some-se a isso cerca de R$ 1,3 milhão mensais que a Casa repassa a pouco mais de 400 deputados como auxílio-moradia. São R$ 3 mil para cada parlamentar que optou por não viver em um dos imóveis funcionais. Eles podem utilizar esse dinheiro da forma como preferirem. Quase 100 embolsam a quantia, mesmo possuindo residência própria em Brasília.

Além disso, há também as despesas com as reformas dos dois prédios de apartamentos funcionais da Câmara. A obra foi iniciada há pouco mais de um ano e pretende remodelar 96 imóveis. Depois de passar três meses paralisada por conta de dificuldades financeiras da empreiteira Palma, a reconstrução dos blocos F, G, H e I da SQN 302 foi retomada no mês passado. Essa etapa da obra deve custar para a Câmara mais de R$ 30,2 milhões.

O número R$ 1,3 milhão é quanto a Câmara gasta por mês para pagar auxílio-moradia a pouco mais de 400 deputados

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Briga de longa data

Nelson Marquezelli (PTB-SP)

Os gastos com os imóveis funcionais da Câmara são discutidos há anos. Presidentes que antecederam Michel Temer (PMDB-SP) ameaçavam providências, mas somente em 2008 o então presidente Arlindo Chinaglia (PT-SP) decidiu pedir de volta 24 apartamentos ocupados por servidores no universo de 33 que formavam a reserva técnica da Casa. Eram 18 de dezembro quando um ato da Mesa determinando a desocupação foi editado sob a justificativa de que todos os imóveis seriam devolvidos à União.

De acordo com a norma, os 33 apartamentos funcionais que estavam em poder da Câmara deveriam voltar para a Secretaria de Patrimônio do Ministério do Planejamento. O ato concedeu 90 dias para que os servidores dos 24 desses imóveis que ainda estavam ocupados deixassem os apartamentos. O prazo acabou em 23 de março, mas apenas três imóveis foram desocupados dentro do período estabelecido. O Correio visitou os apartamentos que continuavam com moradores e encontrou diversas irregularidades. Três dos que insistiam em permanecer já tinham sido exonerados dos cargos de confiança que ocupavam na Câmara e um deles estava em poder de um ex-deputado. Mesmo assim, a desocupação foi lenta e a Casa precisou entrar com processo judicial.

A insistência dos moradores deflagrou uma crise e a Câmara entrou com pedido judicial de desocupação. À época, o quarto-secretário Nelson Marquezelli (PTB-SP) disse que faria todo esforço para retomar a posse dos imóveis e devolver os bens à União para evitar novos gastos. Agora, já estuda permanecer com eles e apenas criar normas para distribuí-los novamente a servidores.