Título: Kosovo: Sérvia rejeita decisão de corte da ONU
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Fonte: O Globo, 23/07/2010, O Mundo, p. 39
Tribunal de Haia apoia independência da província. EUA pedem que países sigam recomendação, mas Rússia se opõe
NA CAPITAL, Pristina, kosovares de etnia albanesa comemoram com bandeiras nas ruas a decisão do Tribunal Internacional de Haia: revés sérvio
HAIA. Depois de sofrer um revés no Tribunal Internacional de Justiça de Haia, o governo da Sérvia rejeitou ontem a decisão de reconhecer como válida e legal a independência do Kosovo ¿ proclamada unilateralmente em 2008. Em Belgrado, o presidente Boris Tadic convocou uma reunião de emergência para discutir a questão. Apesar do tom duro, Tadic prometeu reações no campo diplomático e sem incitar à violência.
¿ A Sérvia nunca vai reconhecer a independência proclamada unilateralmente pelo Kosovo. Foi uma decisão dura, mas Belgrado vai continuar a tentar nas Nações Unidas uma solução para que os dois lados possam iniciar um diálogo ¿ disse o presidente.
A declaração de Tadic foi uma reação à decisão do tribunal de aprovar a legalidade da independência kosovar por dez votos a quatro, com uma abstenção. A sentença foi anunciada pelo presidente da Corte, Hisashi Owada, após uma sessão de três horas diante dos chanceleres sérvio, Vuk Jeremic, e kosovar, Skender Hyseni.
A Sérvia reivindica a soberania sobre a região e vem contestando na ONU a validade da secessão unilateral, declarada em 2008 após anos de negociações frustradas no rastro da intervenção da Otan na província para conter a violenta repressão sérvia na região. A sentença não obriga os membros da ONU a acatarem a posição, mas endossa a autonomia kosovar e pode favorecer o reconhecimento do novo país por outras nações.
A Otan, que ainda mantém tropas no Kosovo, afirmou estar de prontidão caso a decisão judicial provoque reações violentas. A população predominantemente de etnia albanesa foi às ruas de Pristina comemorar a decisão ¿ rejeitada pela minoria étnica sérvia, estimada em 120 mil pessoas, que vive no norte, junto à fronteira com a Sérvia.
Apenas 69 dos 192 países-membros da ONU são favoráveis à independência kosovar. O Brasil faz parte do grupo que não reconhece o Kosovo como uma nação independente ¿ ao contrário de países como Estados Unidos, Turquia, Reino Unido, França e Alemanha. O governo americano manifestou apoio ao anúncio, e a secretária de Estado, Hillary Clinton, exortou a comunidade internacional a reconhecer a independência kosovar. ¿Agora é hora de colocarem de lado suas diferenças e seguirem adiante, trabalhando juntos de forma construtiva para resolver problemas práticos e melhorar a vida dos povos do Kosovo, da Sérvia e da região¿, disse Hillary num comunicado.
Rússia: Corte não deu base legal à independência
Por sua vez, a chefe da política externa da União Europeia, Catherine Ashton, exortou Sérvia e Kosovo a trabalharem juntos para melhorar suas relações e aumentarem suas chances de entrar no bloco.
¿ A reconciliação é vital. Boas relações entre vizinhos, cooperação regional e diálogo são as fundações sobre as quais a UE é construída ¿ ressaltou.
Entre os maiores opositores de um Kosovo independente está a Rússia. Além de temer a expansão da Otan nos Bálcãs, Moscou considera a região sua área tradicional de influência de cultura eslava e cristã ortodoxa. Os russos temem ainda que Kosovo inspire movimentos separatistas em seu território. Ontem, o Kremlin alegou que a decisão de Haia se referia somente à legalidade da declaração de independência, e não ao direito de Kosovo de separar-se da Sérvia.