Título: Salário alto em duas versões
Autor: Ribeiro Jr., Amaury
Fonte: Correio Braziliense, 26/06/2009, Política, p. 4

Sérgio Gabrielli afirma que remunerações da Petrobras estão congeladas desde 2008. Mas, segundo blog da empresa, houve reajuste de 32,41% no mesmo ano. Gabrielli: explicação diferente da do blog da Petrobras

O presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, confirmou ontem os altos salários pagos aos diretores da estatal, divulgados pelo Correio/Estado de Minas. ¿É isso mesmo: em 2007, o salário médio anual foi de R$ 710 mil¿, disse Gabrielli em entrevista à Rádio CBN. Mas, ao tentar explicar o aumento de 90% nos vencimentos dos executivos da empresa no período de 2003 a 2007, Gabrielli acabou desmentindo a versão da própria assessoria de imprensa da estatal, divulgada no blog da empresa.

De acordo com o diretor da Petrobras, até 2007 os vencimentos dos diretores eram reajustados em dissídio coletivo no mesmo parâmetro dos demais funcionários da empresa. Segundo ele, a partir de 2008, uma assembleia dos acionistas decidiu congelar os salários dos diretores da empresa. O blog da Petrobras conta uma história diferente.

O aumento dos salários dos diretores e dos membros dos conselhos fiscal e de administração teria sido fixado numa assembleia dos acionistas em 2 de abril de 2007. A reunião decidiu elevar o montante de recursos destinados aos salários e outros benefícios do executivos de R$ 4,8 milhões para R$ 7,4 milhões. Esse montante destinava-se ao pagamento de salários, bônus e férias de 35 membros da diretoria e dos conselhos fiscal e de administração. Mas, segundo o blog, a maior parte da bolada ficou mesmo com os membros da diretoria.

Os membros do conselho fiscal receberam apenas 10% do valor dos vencimentos dos diretores da estatal. Diferentemente do que Gabrielli informou à rádio, o blog explica ainda que os acionistas decidiram, em assembleia em 4 de abril de 2008, aumentar o total dos vencimentos dos diretores e membros dos conselhos fiscal e de administração para R$ 9,8 milhões. Em outras palavras, em menos de um ano, os salários dos diretores e demais executivos subiram 32,41%.

Levando-se em conta que em 2007 os diretores da estatal receberam R$ 710 mil, no ano seguinte o salário médio deles teria ficado em R$ 940 mil por ano, o que dá uma média de R$ 78,32 mil por mês. De acordo com a assessoria de imprensa da Petrobras, os vencimentos dos diretores somente foram congelados pela assembleia de acionista em abril deste ano. ¿Os salários dos diretores são os menores do mercado¿, disse ainda Gabrielli à rádio.

O presidente da estatal afirmou que, incluindo o 13º salário, os vencimentos mensais dos diretores em 2007 era de R$ 54 mil e não RS$ 60 mil como o Correio/Estado de Minas havia divulgado. Mas os documentos da Receita Federal obtidos pela reportagem mostram que o 13º não está incluído no montante de cerca de R$ 710 mil recebido pelos executivos em 2007.

Bolada De acordo com informações prestadas pela estatal à Receita, a bolada se refere apenas às verbas de salários, férias, participação no lucros das empresa e outros bônus. A papelada mostra, por exemplo, que o diretor de Operações da empresa, Guilherme de Oliveira Estrella, recebeu, além de R$ 701.764,79 de vencimentos, R$ 153.361,63 da Petrus (fundo de Pensão da Estatal) e R$ 84.648,24 de 13º salário.

Oposição cobra CPI

Daniela Lima Cadu Gomes/CB/D.A Press - 27/5/08 Dias: ¿Não estamos discutindo a legalidade, mas a moralidade¿

Depois da revelação do Correio de que a remuneração de diretores da Petrobras chega a R$ 710 mil ao ano, a oposição subiu à tribuna do Senado para cobrar a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigará a estatal. A CPI perdeu força após denúncias sobre os atos secretos e agora virou moeda de troca para sustentar a posição do presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP). Ontem, o peemedebista deu um sinal claro ao governo de que não irá enfrentar a crise sozinho. Disse, em nota, que é alvo de acusações, entre outros motivos, por ser aliado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O governo não quer a CPI da Petrobras, e, sendo ela inevitável, vai estabelecer limites para as investigações. Para isso, precisa do PMDB, maior bancada do Senado, para segurar a apuração.

O vice-líder do PSDB na Casa, senador Álvaro Dias, fez pronunciamento em que criticou a alta remuneração dos diretores da estatal. ¿Não há dúvida de que deve ser legal, afinal os atos foram praticados em função de normas estabelecidas pela empresa, com o aval do Executivo. Nós não estamos discutindo a legalidade. Nós estamos questionando a moralidade¿, criticou o senador tucano.

Dias fechou o discurso dizendo que a CPI tem como função colocar luz sobre atividades da Petrobras ¿para chegar ao conhecimento da população, que pressiona e exige providências¿. O problema é que a Petrobras é uma das bases do governo federal no que diz respeito a investimentos. Prova disso é dispositivo inserido pelo Executivo na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), em tramitação na Câmara, que exclui a estatal da meta de superávit primário para o setor público em 2010. Na prática, isso quer dizer que a empresa fica livre para fazer investimentos, apoiar projetos sociais e, em parceria com a União, financiar obras, sem ter de economizar para ajudar o governo a pagar juros da dívida.

Qualquer ameaça à imagem da empresa é controlada pelo governo federal. Puxando o presidente Lula para a crise no Senado, Sarney mostra que pode fazer a diferença no andamento da CPI.

Memória Comissão parada

A CPI da Petrobras nasceu depois das denúncias de que a estatal estaria financiando e patrocinando organizações não governamentais e instituições ligadas a dirigentes do PT. Além disso, a oposição no Senado acrescentou diversos outros artifícios para realizar a investigação. Alguns deles são processos de auditoria que tramitam no Tribunal de Contas da União, onde a empresa é suspeita de irregularidades, desde administrativas até fraudes em licitações.

Mas as motivações da oposição cresceram na mesma proporção que as denúncias contra a empresa. A cada caso novo, os senadores apontavam um indício para coletar as assinaturas necessárias e instalar a CPI. O estopim foi a suspeita de que o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, estava patrocinando festas juninas no interior da Bahia para entidades comandadas pelo PT. O dirigente foi acusado de beneficiar as instituições com vistas à possível candidatura ao Senado. Gabrielli negou a pretensão.

Outro argumento que a oposição pensou usar foi a Operação Águas Profundas, realizada em julho de 2007 e que teve como objetivo apurar fraudes em licitações para ancoradouro de plataformas.

Eu acho... Fotos: Bruno Peres/CB/D.A Press

¿Sei que como eles estão fazendo a gestão do patrimônio público, precisam ganhar bem, mas não vejo por que esse valor ser tão alto.¿

Bruno Carneiro Soares, 19 anos, estudante de Direito

¿Eu acho um absurdo um diretor da Petrobras ganhar R$ 700 mil por ano. Penso isso porque tomo como base o meu salário e o de milhões de pessoas.¿