Título: Aposta brasileira no Peru
Autor: Nogueira, Danielle; Ordoñez, Ramona
Fonte: O Globo, 02/08/2010, Economia, p. 17
Projetos de Vale, Votorantim e Eletrobras triplicam investimentos de empresas nacionais no país
A estabilidade político-econômica e a possibilidade de se ter uma saída para o Pacífico estão atraindo cada vez mais empresas brasileiras para o Peru. A última tacada foi da Votorantim Metais, que no fim de junho fez uma oferta avaliada em US$ 419,5 milhões por uma fatia na mineradora Milpo. Na próxima quintafeira, a Vale inaugura a mina de fosfato Bayóvar, no departamento de Piura, sua primeira operação no país e que demandou investimentos de US$ 566 milhões. E a Eletrobras estuda participar de sete hidrelétricas por lá, orçadas em cerca de US$ 12 bilhões.
As três iniciativas vão quase triplicar, para US$ 20 bilhões, os investimentos de multinacionais verde-amarelas no país desde 2003, início do governo Lula.
Segundo levantamento do Conselho Empresarial Brasil-Peru, as empresas brasileiras injetaram US$ 7 bilhões em território peruano de lá para cá, considerando operações de fusão e aquisição.
A criação do conselho empresarial, em dezembro de 2009, e cuja presidência no lado brasileiro está a cargo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), é por si só um sinal do maior apetite dos empresários brasileiros pelo Peru. Entre as companhias que já fincaram raízes por lá estão a siderúrgica Gerdau, a Petrobras, a Ambev e a própria Votorantim.
O principal atrativo do Peru é sua economia. Entre 2002 e 2008, seu Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos) cresceu a taxa média de 7%. Em 2009, quando muitas nações latino-americanas apresentaram retração por causa da crise econômica global, o país avançou 0,9%.
A projeção da Comissão Econômica para América Latina (Cepal) para 2010 é de expansão de 6,7%, o que coloca o Peru entre os cinco países com maior crescimento este ano na região. Os demais são Brasil (7,6%), Uruguai (7%), Paraguai (7%) e Argentina (6,8%).
Acesso mais fácil a mercado chinês
Além disso, frisa o diretor de Relações Internacionais da Fiesp, Thomaz Zanotto, a inflação é baixa, as exportações robustas garantem saldo comercial positivo e há respeito à legislação.
Não à toa, o país recebeu o grau de investimento, chancela de investimento seguro concedida por agências de classificação de risco, em 2 de abril 2008, antes mesmo do Brasil.
O Peru é um país que está dando certo na América do Sul. Há estabilidade econômica e institucional, o que cria um ambiente favorável aos negócios diz Zanotto.
A indústria de mineração é um exemplo dessa estabilidade de regras, na avaliação do pesquisador do Departamento de Relações Internacionais do Ipea Pedro Silva Barros. Ele lembra que no governo de Alberto Fujimori (1990-2000) foi aprovada uma legislação para o setor com forte estímulo fiscal: as empresas só pagariam os impostos diretos devidos após a maturação do investimento, ou seja, quando o dinheiro desembolsado fosse recuperado.
Desde então, essa estrutura tributária foi mantida e ampliada, apesar de seus sucessores, Alejandro Toledo (2001-2006) e o atual presidente Alan García, no poder desde 2006, serem de correntes políticas opostas.
A legislação favorável às mineradoras é um chamariz para as empresas, além das grandes reservas minerais, ainda pouco exploradas.
Foi nesse contexto que a Votorantim Metais iniciou suas operações no Peru, em 2004, com a aquisição da refinaria de zinco Zinc Cajamarquilla. No ano seguinte, comprou uma fatia da mineradora Milpo, ampliada para 34,93% em 2008. Agora, tenta assumir seu controle. A Vale, por sua vez, venceu a licitação da mina de Bayóvar em 2005. A capacidade de produção é de 3,9 milhões de toneladas por ano de rocha fosfática, que será usada na produção de fertilizantes. O objetivo é atender, prioritariamente, o Brasil, que hoje importa metade do fosfato consumido.
Não estão descartadas, porém, exportações para outros países.
A perspectiva de usar os portos peruanos para alcançar o mercado asiático, especialmente a China, também é um dos fatores que vêm estimulando investimentos brasileiros no Peru. Além disso, o país tem acordo de livre comércio com o Nafta, bloco que reúne EUA, Canadá e México.
O eixo do Pacífico deve ser o de maior crescimento no século XXI. A questão logística é fundamental para entender esse movimento de empresas brasileiras para o Peru diz o historiador Daniel Chaves, do Laboratório Tempo Presente da UFRJ.
É com o Peru que o processo de integração regional na área de infraestrutura está mais adiantado. A construtora Odebrecht encabeça dois projetos.
Com 704 quilômetros, a rodovia Interoceânica Sul vai ligar a cidade de Iñapari, na fronteira com o Acre, aos portos de Ilo e Matarani, na costa peruana. A conclusão da obra é prevista para dezembro de 2010. A empreiteira também lidera as obras da IIRSA Norte, que ligará os dois países por meio de rodovia e hidrovia. No total, a empresa tem sete projetos em execução que somam US$ 2,2 bilhões.
Estatais apostam em integração regional
A Eletrobras também está apostando no projeto de integração regional.
Estuda construir sete hidrelétricas no Peru, totalizando US$ 12 bilhões. A que está em estágio mais avançado é a usina de Iñambari, de 2.200 megawatts (MW), ou 30% da capacidade instalada do Peru. Os investimentos são estimados em US$ 2,5 bilhões, dos quais US$ 1,5 bilhão será da Eletrobras. Além dela, participam do consórcio Furnas e a construtora OAS. O estudo de viabilidade da hidrelétrica será concluído no próximo ano. A Petrobras também quer desenvolver um polo petroquímico no Peru, em parceria com a Braskem. A previsão de investimento é de cerca de US$ 2 bilhões.
A viabilidade do projeto, no entanto, depende de a Petrobras comprovar no país a existência de reservas significativas de gás natural, que será a matéria-prima do polo. A estatal atua no Peru há 14 anos, onde produz 15,2 mil barris diários de petróleo e gás.