Título: No dia seguinte, alívio e queixas
Autor:
Fonte: O Globo, 07/08/2010, O País, p. 18

Dilma comemora performance no debate; Serra encontra eleitores e Marina reclama dos adversários Maria Lima, Míriam Hermes e Sérgio Roxo

SÃO PAULO e BOM JESUS DA LAPA (BA).

Passado o sufoco do debate de quintafeira à noite, na TV Bandeirantes, Dilma Rousseff ontem não escondia o alívio de ter passado pelo teste sem nenhum tropeço mais grave. Em longa e bem-humorada entrevista, ela deixou claro ter gostado de sua performance.

Bem mais relaxada que nos encontros anteriores com a imprensa, Dilma cantou, riu, fez gracinhas, e disse que os jornalistas são mais bichos-papões que o tucano José Serra.

Não deixou de criticar Serra, que, na sua opinião, não soube defender o governo Fernando Henrique Cardoso.

No início da entrevista, enquanto jornalistas e cinegrafistas brigavam por espaço, Dilma aguardou cantando Domingo no parque, de Gilberto Gil : O rei da brincadeira, ê José! O rei da confusão, ê João! Um trabalhava na feira, ê José!.

Uma jornalista perguntou se ela estava feliz com o debate: Não estou triste nem estou feliz.

Estou fazendo campanha. Não posso é realizar a fantasia de vocês.

Dilma admitiu que ficou nervosa: É uma coisa muito formal, toca a orquestra, fica você ali diante daquela formalidade, você fica nervosa.

Ela ficou nervosa e confusa, por exemplo, diante da pergunta de Serra sobre retirada de apoio do governo das Apaes.

Tenho uma característica que para uns é qualidade, e para outros defeito: quando me perguntam alguma coisa, eu tento responder. Eu tentei responder... depois olhei meus papéis e vi que as Apaes saíram de uma situação não institucionalizada e passaram a integrar os recursos do Fundeb. As Apaes não estão abandonadas.

Ao ser questionada se iria parar de falar no presidente Lula, já que no debate só mencionou seu nome na segunda parte, ela brincou, usando uma expressão mineira: Nem vê! Eles podem querer, mas não vou deixar de falar no presidente Lula de jeito nenhum! Não vou abrir mão disso, não! Sobre como será a participação de Lula no programa de TV, a partir do dia 17, ela brincou de novo: Its a big surprise! Aguardem! Em Bom Jesus da Lapa, na Bahia, Serra fez caminhada por ruas próximas ao santuário no dia mais movimentado da romaria, que este ano deve reunir cerca de 450 mil pessoas.

Acompanhado do candidato a governador da Bahia pelo DEM, Paulo Souto, e de grande comitiva de políticos, o tucano apareceu justamente no horário que as pessoas aguardavam a passagem da procissão, com a imagem do Bom Jesus, ponto alto dos festejos.

Ele foi simpático e, para desespero dos assessores, várias vezes se afastou da comitiva para falar com pessoas nas calçadas.

Fiquei surpresa, mas achei legal.

Eu já tinha estado com eles (da comitiva) em Itabuna disse a advogada Ana Maria Muniz.

Serra também entrou em uma farmácia, onde perguntou ao balconista Rafael Richard se vende muitos remédios genéricos. Apesar do plano de entrar no santuário de pedra calcária, a comitiva foi barrada porque se atrasou e a procissão já estava saindo. Serra acatou e saiu pela lateral, subindo pela escadaria da torre em estilo medieval, de onde acenou para os romeiros.

Poucos perceberam que se tratava de um candidato à Presidência.

Quando percebeu quem causava aquele alvoroço, o romeiro Alfredo Alcântara se alegrou e fez questão de levar uma foto de recordação: Vou levar para meu filho.

Serra disse que vai pedir a Santa Rita, que não tem altar no santuário, que me dê forças na Presidência para ajudar a juventude do Brasil. Ele destacou duas preocupações fundamentais: o combate às drogas e tratamento dos usuários, pois existem poucas iniciativas públicas neste sentido, bem como a profissionalização técnica dos jovens para que tenham acesso ao mercado de trabalho.

Em São Paulo, a verde Marina Silva recebeu ontem um documento com propostas de políticas públicas elaboradas pelo Conselho Nacional da Juventude.

Ela disse que saiu do debate descontente. Para ela, Serra e Dilma se preocuparam com o confronto em lugar das troca de ideias, e Plínio de Arruda Sampaio tentou rotular os rivais para não discutir propostas.

O Brasil precisa do encontro.

Chega de embate. O que se revelou foi a lógica da situação pela situação e da oposição pela oposição.

Para comentar a postura de Plínio, que a chamou de pollyanna e ecocapitalista, Marina usou a ironia.

Isso não me atinge porque na época de ler Pollyanna eu ainda era analfabeta disse, referindo-se ao clássico da literatura infanto-juvenil Pollyanna, que deu origem ao adjetivo.

Ela só se alfabetizou aos 16 anos.

Marina lembrou de seu aliado Chico Mendes (1944-1988) e disse que ele sempre enfrentou resistência no grupo do PT do qual Plínio fazia parte: Esses rótulos, eu vi eles acontecerem com o Chico Mendes há mais de 20 anos, quando a gente começou a luta socioambientalista no Acre. Era o mesmo grupo, dentro do PT, que dizia que ele era serviçal dos americanos.