Título: Uma saída para os impasses da Saúde
Autor:
Fonte: O Globo, 11/08/2010, Opinião, p. 6

Região com críticos indicadores de saúde, a Zona Oeste do Rio ganhou no fim de semana a quinta unidade do programa Clínicas de Família, projeto da prefeitura que prevê a implantação de 23 novos postos até 2012. Trata-se de uma experiência que, nos quatro centros de atendimento já em funcionamento, tem mostrado uma realidade até então impensável na região, com atendimento personalizado, consultas com hora marcada e suporte de tecnologia.

São itens que costumam aparecer apenas em palanques eleitorais, mas que começam a sair do nível das promessas de candidatos, quase nunca cumpridas, para o plano da realidade, em razão do gerenciamento compartilhado com Organizações Sociais.

Graças a tal sistema, o poder público se livra de amarras burocráticas e corporativas que emperram o funcionamento da máquina, transferindo para as OSs, sociedades sem fins lucrativos, a prerrogativa de contratar médicos, dentistas e agentes de saúde aprovados em concurso público, mas pelo regime de CLT.

Por conta desse vínculo empregatício adicional, o servidor pode se subordinar voluntariamente às OSs, em troca de uma remuneração extra. Em contrapartida, fica submetido a regras inexistentes no serviço público, mas comezinhas no mundo da eficiência da iniciativa privada, como avaliação de desempenho, prêmio por eficiência, busca de metas e cumprimento de carga horária.

Os benefícios do sistema são evidentes nos dois lados do balcão.

Para os pacientes, ficam serviços mais rápidos e eficazes. Os servidores, por sua vez, são contemplados com melhores condições de trabalho e salários mais atraentes que os da rede tradicional. No Rio, por exemplo, um médico contratado para o posto inaugurado no fim de semana ganha R$ 9 mil por 40 horas semanais de trabalho, contra R$ 1.800 que se paga por 24 horas a um profissional iniciante da rede convencional.

Apesar das inegáveis vantagens, as OSs apenas engatinham no Brasil. O modelo está em implantação no Rio, em Minas, Bahia e Pará. Em São Paulo, o sistema parece consolidado. Um estudo de profissionais do Banco Mundial e da USP mostrou, em 2008, que a despesa médica por alta de paciente em hospitais paulistas administrados por Organizações Sociais custava US$ 2.892, contra US$ 4.272 nas unidades públicas. Os centros operados por OSs atendem 25% mais pacientes, a um custo anual 10% menor. Os estabelecimentos de gerenciamento compartilhado apresentam custos de internação 25% menores e índices de produtividade 42% maiores. São números pujantes (mas que, não obstante, implicam manter, pelo poder público, dispositivos de supervisão para evitar o desastre de o sistema ser minado por ações deletérias de parceiros mal intencionados). Mesmo assim, a adoção das OSs em escala ampla no país encontra resistências, principalmente nas correntes companheiras assentadas em interesses corporativos e com voz influente no Planalto. É uma oposição com força suficiente para ter desautorizado até o mesmo o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, um entusiasta das OSs que viu sua proposta de implantação do sistema na rede de saúde do país ser bombardeada no Congresso, até que fosse deixada na pilha de projetos engavetados.