Título: Credibilidade imprensa, apesar do on-line
Autor: Batista, Henrique Gomes; Passos, José Meirelles
Fonte: O Globo, 20/08/2010, O País, p. 3

Congresso de Jornalismo debate ainda difusão de informações oficiais pelos governos

O desafio dos jornais impressos em preservar seu prestígio e influência, e o do jornalismo em manter a sua qualidade na era digital, foi o assunto mais debatido ontem no primeiro dia do oitavo Congresso Nacional de Jornalismo, no Rio de Janeiro. A conclusão, ainda preliminar, é a de que, por um lado, apesar da expansão da internet e dos meios digitais, continuará havendo espaço para impressos. E, por outro, as empresas que os editam e que, ao mesmo tempo, exploram o noticiário on-line, deverão ter em breve nova concorrência, que, além de lhes causar impactos financeiros, poderia colocar em risco a vida democrática.

Trata-se da formação de joint-ventures entre companhias de telecomunicação e governos, com o propósito de produzir e difundir informações de seu próprio interesse. Tal perigo ronda, em especial, a América Latina ¿ como disse o sociólogo Demétrio Magnoli, colunista do GLOBO e de ¿O Estado de S. Paulo¿, no painel ¿O futuro da democracia e o jornalismo¿:

¿ Vem sendo difundida a teoria de que os jornais são como partidos que fazem parte de um jogo político. Ela surge numa época em que volta a ideia de que o Estado deve falar diretamente às pessoas, evitando a mediação. Essa teoria política dá base a um projeto de jornalismo estatal em curso na América Latina, buscando criar uma imprensa alternativa principalmente nos meios eletrônicos. Fusões na área de telecomunicação poderão, dessa forma, se tornar uma concorrência à imprensa, pois tais empresas se tornariam fornecedoras de notícias que o Estado quer que sejam divulgadas ¿ disse Magnoli, integrante do Grupo de Análises de Conjuntura Internacional, da USP.

Ao seu lado, Otavio Frias Filho, diretor de Redação da ¿Folha de S. Paulo¿, reforçou a tese mencionando exemplos ¿ ¿Putin (Rússia), Ahmadinejad (Irã), Chávez (Venezuela), Evo Morales (Bolívia) e Rafael Correa (Equador)¿ ¿ como uma ¿erupção de governantes autoritários, populistas, que, embora mantendo a aparência de democracia, manietam os poderes Judiciário e Legislativo¿, além de buscar controlar a imprensa.

A transição por que passa a imprensa ficou clara quando se analisaram prós e contras da internet. Houve acordo unânime sobre um conceito: o de que nem toda a informação é notícia; e nem tudo vale a pena imprimir. Joshua Benton, diretor do Laboratório Nieman de Jornalismo, da Universidade de Harvard, exaltou o fato de a internet tornar mais fácil e rápida a pesquisa de dados para reportagens, assim como o baixo custo de distribuição de informações e, principalmente, o fato de esse meio ampliar a audiência para as notícias.

Magnoli destacou a credibilidade das empresas jornalísticas. Ele se referiu ao fato de que muito material on-line não é confiável. Deu como exemplo um recente furo de reportagem de um site, o WikiLeaks, que depois de obter 90 mil documentos secretos do Pentágono sobre a guerra no Afeganistão buscou o amparo de três publicações tradicionais ¿ ¿The New York Times¿, ¿The Guardian¿ e ¿Der Spiegel¿ ¿ para divulgá-los.

Frias definiu como saudável a competição com os meios digitais:

¿ Ela vai nos forçar a mudar.

Para Robert Thomson, diretor de Redação do ¿Wall Street Journal¿, o importante é os jornais reconhecerem o valor do conteúdo que possuem e não entregá-lo gratuitamente na internet, como tem sido feito pela maioria deles:

¿ É preciso voltar ao básico, em que as pessoas apreciam o conteúdo o suficiente para pagar por ele. Se você acredita em jornalismo, e em torná-lo relevante, não importa o formato que ele tenha. (José Meirelles Passos)