Título: Liberdade destaca país na América do Sul
Autor:
Fonte: O Globo, 21/08/2010, Opinião, p. 6
Como aconteceu com Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, os candidatos Dilma Rousseff, José Serra e Marina Silva, depois de fazerem pronunciamentos no Congresso da Associação Nacional dos Jornais (ANJ), o oitavo, realizado no Rio, subscreveram a Declaração de Chapultepec.
O documento, com o nome da cidade mexicana em que foi aprovado em 1994, num encontro da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), é vigorosa defesa das liberdades. O primeiro dos dez itens do texto dá o tom de seu conteúdo: "Não há pessoas nem sociedade livres sem liberdade de expressão e de imprensa. O exercício desta não é uma concessão das autoridades; é um direito inalienável do povo."
O fato de os dois presidentes dos últimos quatros mandatos, mais o que deverá tomar posse em janeiro de 2011, formalizarem compromisso com as liberdades constitucionais - logo, com a democracia - coloca o Brasil em grande destaque positivo numa América do Sul em que o chavismo emanado da Venezuela sufoca sociedades de Norte a Sul.
Sequer escapou a Argentina, onde o casal Kirchner manipula instrumentos de poder a partir da Casa Rosada para dobrar os dois maiores grupos que praticam o jornalismo independente no país, "Clarín" e "Nación". Tudo faz, ao arrepio da lei, para estrangular fontes privadas de receita desses grupos - anunciantes, assinantes -, de modo a subjugá-los ao Estado.
Com nuances próprias, o mesmo objetivo de acabar com a independência editorial de empresas de comunicação por meio da redução da multiplicidade de suas fontes de faturamento - imprensa sem receita privada pratica jornalismo sem liberdade - é perseguido de maneira mais evidente ou menos, a depender do caso, em quase todo o continente, por grupos ligados a esta onda de neopopulismo autoritário - uma redundância - que vem do Norte.
Por óbvio, o rito de assinatura da Declaração precisa se consubstanciar em práticas condizentes com a liberdade de expressão e de imprensa. Na Era Lula, menos devido ao presidente e mais em função da existência no seu governo de assentamentos neopopulistas de frações da esquerda antidemocrática, soou algumas vezes o sinal de alerta contra ameaças à Carta (Ancinav, Conselho Nacional de Jornalismo, "Programa de Defesa dos Direitos Humanos"). Porém, até pela sensatez presidencial, houve bem-vindos recuos.
Mesmo que não ocorressem, ou não ocorram, as instituições republicanas brasileiras dão tranquilizantes demonstrações de vigor. Numa delas, o Supremo pulverizou o entulho autoritário da Lei de Imprensa, assinado em 1967 por Castello Branco, na ditadura, lei tornada cadáver pela Constituição de 88, mas cujo esqueleto ficou no armário até agora. A democracia com suas características de tolerância e convívio entre contrários é uma obra em constante aperfeiçoamento. Prova de como ainda há muito o que fazer é o fato de o jornal "O Estado de S.Paulo" estar sob censura prévia judicial desde o ano passado, proibido de noticiar operação policial em torno de Fernando Sarney.
Sinal positivo dos tempos é o fato de a ANJ ter colocado em sua agenda a autorregulamentação, princípio correto de sociedades avançadas. Não se precisa mesmo de tutela.