Título: Garotinho: MP vai recorrer para dobrar pena
Autor: Souza, Dicler de Mello; Dutra, Marcelo
Fonte: O Globo, 26/08/2010, Rio, p. 23

Promotor diz que ex-secretário de Segurança também deveria ser condenado por formação de quadrilha

Dicler de Mello e Souza, Marcelo Dutra e Sérgio Ramalho

Procuradores da República vão entrar com recurso na Justiça Federal defendendo a condenação do ex-governador e ex-secretário de Segurança Anthony Garotinho por formação de quadrilha armada, agravante que pode dobrar a pena de dois anos e seis meses por formação de quadrilha a que o político foi sentenciado anteontem pelo juiz Marcelo Leonardo Tavares, da 4ª Vara Criminal Federal. No entendimento do procurador Leonardo Cardoso de Freitas, se Garotinho e o ex-chefe da Polícia Civil Álvaro Lins dividiam o comando da quadrilha, não faz sentido que apenas Lins tenha sido condenado por formação de quadrilha armada:

- Com exceção dos três integrantes do bando condenados apenas por lavagem de bens (a ex-mulher de Lins, Luciana Gouveia; a atual, Sissy Bullos, e o pai desta, o ex-vereador em Barra Mansa Francis Bullos), os demais também deveriam ter sido condenados por formação de quadrilha armada.

Autor de denúncias comemora a condenação

Caso a Justiça aceite a tese do Ministério Público Federal (MPF), as penas de Garotinho, Ricardo Hallak - sucessor de Lins na chefia de Polícia Civil -, do ex-delegado Daniel Goulart e dos ex-inspetores Alcides Campos Ferreira, Fábio Menezes de Leão, o Fabinho, e Mário Franklin de Carvalho, o Marinho, podem aumentar em até três anos.

Responsáveis pelas denúncias que levaram a Polícia Federal a desencadear, em 2006, a investigação sobre o bando chefiado por Garotinho e Lins, os delegados da Polícia Civil Alexandre Neto e Maurício Demétrio classificaram a condenação do grupo como um avanço.

- A sentença dá a dimensão da organização criminosa montada dentro do governo do Rio na gestão da família Garotinho. É importante lembrar que essa quadrilha tinha ramificações em outras esferas do poder público que ainda precisam ser investigadas, mas o resultado do trabalho da Polícia Federal é um avanço contra a corrupção no Rio - acredita Alexandre Neto.

Em setembro de 2007, meses após fazer as denúncias, Alexandre foi alvo de um atentado em Copacabana. Na ocasião, o delegado foi atingido por vários tiros no braço quando entrava em seu carro.

Outro autor de denúncias contra a quadrilha, o delegado Maurício Demétrio chegou a receber proteção após sofrer ameaças de morte. Para ele, a condenação foi um passo importante para o resgate da credibilidade das instituições no Rio. Contudo, o delegado não esconde a frustração com o fato de os condenados não terem sido efetivamente presos.

Advogados de Álvaro Lins já entraram com recurso

Os advogados de Álvaro Lins entraram ontem com um recurso apelando da sentença, que o condenou a 28 anos de prisão. O advogado de Garotinho, Mauro Coelho, disse que vai recorrer até amanhã.

Anthony Garotinho, que esteve em Barra Mansa nesta terça-feira, onde fez corpo a corpo com eleitorado, afirmou que o processo em que foi condenado "não tem cabimento".

- Como posso participar de uma quadrilha e não ganhar nenhum benefício. Judicialmente, não haverá problema com a minha campanha, pois a condenação foi de primeira instância. Estão tentando me derrubar. Quero saber do que fui acusado, porque até agora não sei. O medo deles é a minha liderança nas pesquisas - afirmou Garotinho.

Já o médico e ex-vereador de Barra Mansa Francis Bullos, sogro do ex-deputado estadual Álvaro Lins, disse ontem que preferia recorrer preso, da sentença que o condenou por lavagem de bens:

- Preferia aguardar o resultado do recurso preso, tamanha a indignação com que recebi essa decisão da Justiça.

O ex-vereador disse que o juiz não deu valor às provas documentais que ele apresentou durante o processo e não permitiu que ele oferecesse uma perícia contábil dos seus bens:

- A Polícia Federal queria prender o Álvaro, e não investigar para saber se ele era inocente ou culpado. A PF queria, com isso, atingir na época Anthony Garotinho, que o nomeou Chefe da Polícia Civil.

Bullos garantiu que o genro está morando no Rio, e não em Barra Mansa. Também afirmou que ele e Lins não pretendem nunca mais se candidatar a cargos políticos.

- Ele (Lins) vem à cidade, duas ou três vezes por semana, porque leciona no curso de Direito do Centro Universitário de Barra Mansa (UBM). Quando tem tempo, costuma me visitar aqui em casa - disse Bullos, que mora no bairro Santa Rosa, de classe média alta.

O médico também acusou a PF de ter omitido evidências que desmentiriam a ligação do genro com contraventores:

- Pela acusação, Álvaro protegia Rogério Andrade e a máfia dos caças-níqueis. Porém, foi omitida em juízo uma gravação do telefonema em que meu genro é informado da prisão de Andrade e responde: "Maravilha, menos um". Que proteção é essa?

Sobre a condenação por lavagem de bens, ele alega que apenas pediu a Ricardo Hallak, então subordinado de Lins, para comprar-lhe um Toyota, no Rio. Segundo o médico, única concessionária de Barra Mansa que vendia esse tipo de veículo havia fechado. Ele também contesta que pertencesse de fato a Lins o apartamento que comprou na Rua 5 de Julho, em Copacabana. Bullos acrescentou que os reais motivos de sua condenação foram ser sogro de Lins e ter apoiado Garotinho durante uma campanha eleitoral, e disse que vai entrar com uma ação contra a União.