Título: Quem escolhe o governador de Minas são os mineiros
Autor: Vasconcelos, Adriana; Fabrini, Fábio
Fonte: O Globo, 27/08/2010, O País, p. 14

Antonio Anastasia, candidato à reeleição, minimiza apoio de Lula a seu principal adversário

Adriana Vasconcelos, Fábio Fabrini e Helena Celestino

Enviados especiais

BELO HORIZONTE. Assim como a presidenciável petista, Dilma Rousseff, o governador de Minas, o tucano Antonio Anastasia, está confiante de que conseguirá ser reeleito a despeito de seu perfil técnico e de sua pouca experiência eleitoral. Embora nas pesquisas ainda esteja atrás de seu principal adversário, o peemedebista Hélio Costa, Anastasia vem conseguindo reduzir essa vantagem na medida em que o eleitorado o identifica como candidato de seu poderoso padrinho político no estado, o ex-governador Aécio Neves.

Sua trajetória de crescimento, porém, não está sendo acompanhada pelo candidato do PSDB à Presidência, o que tem levado a cúpula nacional do partido a pressionar o governador mineiro e seu padrinho político a se empenharem mais na ajuda a José Serra. Mas Anastasia deixa claro que ele e Aécio não poderão ser responsabilizados por um eventual fracasso na eleição nacional, até porque o candidato a presidente da República do partido vem caindo também em outros redutos tucanos. E apresenta uma tese de que a transferência de votos se dá de maneira mais eficaz na horizontal, ou seja, de governador para candidato a governador ou de presidente para candidato a presidente.

Foi na biblioteca do Palácio das Mangabeiras, onde mora atualmente, que o governador Anastasia recebeu O GLOBO para falar sobre sua candidatura à reeleição. Enquanto cumpria mais um compromisso de campanha, um grupo de empresários o aguardava para uma reunião do Conselho Estratégico da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg). É em meio a essa jornada dupla que ele vem tentando vencer o desconhecimento junto ao eleitor e se apresenta como a continuação da bem avaliada gestão iniciada há oito anos por Aécio Neves.

?¿ O GLOBO: Acredita que seu crescimento nas pesquisas possa ajudar a alavancar Serra?

?¿ ANASTASIA: Acho que sim, até porque os indicadores do governador Serra aqui em Minas ainda são maiores do que os meus. Contra mim, havia o desconhecimento. Na medida em que as pessoas me conhecem mais, confiam mais, é claro que, quando reiterarmos a necessidade de votação no nosso candidato à Presidência, isso deverá ter efeito.

?¿ O GLOBO: A sua trajetória é de alta, a dele é de queda. ?¿ ANASTASIA: Costumo dizer que ninguém coloca cabresto nos eleitores. Um eleitor é soberano e faz a composição presidente, governador, deputado e senador como bem quer. O que nós, candidatos, podemos fazer é argumentar, mostrar, debater, discutir. Mas a decisão é dele.

?¿ O GLOBO: Então há o risco de prevalecer o chamado Dilmasia? ?¿ ANASTASIA: Aí só o resultado da eleição é que vai dizer. Se depender do nosso esforço, não. Prevalecerá a vitória do Serra em Minas e no Brasil todo. E a nossa vitória também, assim como de nossos candidatos ao Senado.

?¿ O GLOBO: Serra é um candidato difícil de carregar? ?¿ ANASTASIA:Aqui não tenho notado isso. Tenho viajado com ele aqui, e a mesma recepção positiva que estamos tendo também é dada a ele. Claro que um pouco menos do que a dada ao Aécio, que aqui é um fenômeno, tem um carisma muito forte.

?¿ O GLOBO: Desenha-se uma guerra de padrinhos em Minas. Quem pode mais, Aécio ou Lula? ?¿ ANASTASIA: Os eleitores fazem bem as distinções. Especialistas dizem que a transferência de apoios tem limite, mas elas ocorrem nas esferas horizontais: de presidente para candidato a presidente e de governador para candidato a governador. E nós vimos isso em eleições recentes. O Lula se empenhou à exaustão nas eleições municipais de São Paulo (e perdeu). O eleitor é soberano. Em Minas mais ainda. Quem escolhe o governador de Minas são os mineiros. Agora cada candidato tem todo o direito de colocar aí os seus trunfos, os seus apoios. Faz parte do jogo democrático.

?¿ O GLOBO: Isso não reforça a tese de que Aécio não pode fazer muito pelo Serra... ?¿ ANASTASIA: Essa tese teria esse desdobramento, mas não nos impede de fazer o esforço que estamos fazendo.

?¿ O GLOBO: Se o senhor for eleito e Serra perder, essa derrota poderá ser debitada na conta do PSDB mineiro? ?¿ ANASTASIA: Não. Acho que de forma alguma. Nós estamos trabalhando à exaustão. Mas a decisão cabe ao eleitor. Difícil, então, falar que a culpa é de A ou de B. Até porque essa tendência atual de queda do nosso candidato, que eu espero que seja revertida, não está ocorrendo só em Minas. Em São Paulo, também houve uma queda. O partido então terá de olhar essa questão nacionalmente. Se o Alckmin ganha em São Paulo e o Serra não, a culpa será do Alckmin? Eu acho que não. São situações que têm de ser vistas. Uma coisa é eleição para governador, outra é para presidente.

?¿ O GLOBO: Se o candidato a presidente fosse o Aécio, a situação nacional do PSDB hoje seria diferente? ?¿ ANASTASIA: Essa é uma pergunta difícil de ser respondida.

Só se eu tivesse uma bola de cristal. Naturalmente, nós desejamos lá atrás, não só eu como os 20 milhões de mineiros e outros brasileiros, que o candidato fosse ele. Mas o próprio governador achou que era mais adequado se retirar da disputa e abrir a vaga para Serra. Eu espero que ele um dia seja candidato e seja presidente.

?¿ O GLOBO: Além do desconhecimento, pesa contra sua candidatura a falta de experiência política. ?¿ ANASTASIA: Eu não vejo problema nenhum nisso. Primeiro, porque acho que tenho imensa experiência política. Vivo na política desde que me formei. Posso não ter experiência na politicagem, mas na política tenho plena. Na administração, no conhecimento pleno, no convívio, na decisão política. Segundo, as pessoas gostam de quem tem conteúdo. Eu sou acusado de ser técnico. Isso para mim é elogio, não ofensa.

?¿ O GLOBO: O candidato de oposição o acusa de estar usando a máquina do estado, ainda que disfarçadamente. Diz que está conciliando as agendas de campanha e de governador. ?¿ ANASTASIA: Ele desconhece que eu não fiz nenhuma viagem oficial, nas últimas semanas, para o interior. Ao contrário do que está ocorrendo no campo nacional. Até porque eu acho estranho aqueles que dizem que o governador é governador até as 18h. Eu sou governador 24 horas por dia. Neste momento, estou dando uma entrevista como candidato, mas, se o telefone tocar e aconteceu algum problema, eu imediatamente tomo uma decisão. O que não pode é utilizar a estrutura de governo para a campanha. E eu não usei em nenhum momento.

?¿ O GLOBO: Ele insinua que o Palácio da Liberdade pressiona os prefeitos... ?¿ ANASTASIA: Nós fizemos um governo de oito anos muito aplaudido e extremamente descentralizado. Basta conversar com os prefeitos. Nós fizemos estradas, casas populares. Então, os prefeitos têm um reconhecimento, que não é só deles, mas da população também. A popularidade do governador Aécio, de 90%, é fruto de um trabalho. Não é uma coisa que caiu do céu. Então é natural que esses prefeitos queiram continuar esse bom sistema e não trocar por alguma coisa incerta. Agora, parece que ele tem esse mantra. Falou isso em 90, em 94 e já deve estar antevendo que vai perder, e por isso está falando isso de novo.

?¿ O GLOBO: Qual a diferença principal da sua candidatura para a de Hélio Costa? ?¿ ANASTASIA: É uma diferença abissal. É uma diferença de experiência, visão de mundo, visão de administração, de prioridades, de comportamentos. São dois projetos completamente diferentes.

?¿ O GLOBO: Como o senhor define cada um deles? ?¿ ANASTASIA: Politicamente, o projeto deles é um projeto que veio de fora para dentro. Urdido fora de Minas e imposto. O PRB tinha feito a convenção nos apoiando, e houve uma intervenção aqui. Além da interferência no próprio PT. Já o nosso é projeto genuinamente mineiro. Segundo, há uma questão de visão do que é governo, de princípios, de expectativas. As pessoas conhecendo um lado, quem está lá, e, conhecendo quem está aqui, os mineiros farão a distinção.

?¿ O GLOBO: O senhor está falando dos aliados dele como o ex-governador Newton Cardoso, que responde a 20 processos? ?¿ ANASTASIA: Eu não vou citar nomes. Sou governador do estado e estou disposto a manter o nível. Agora o mais importante de tudo são as propostas, os projetos. Eu vejo no campo adversário todo tipo de propostas, que são quiméricas, ilusórias. Promete ao mesmo tempo fazer amplos reajustes de servidores e redução drástica de impostos. Não vejo ainda nenhuma proposta deles de profissionalização do serviço público, relativa a metas e resultados.

?¿ O GLOBO: Um estudo recente da Fundação João Pinheiro mostra índices muito ruins do Norte de Minas como o de esgotamento sanitário, que seria de apenas 30%. Este ano, o senhor enfrentou uma greve de professores, por causa de salários próximos do mínimo. Isso não reforça a crítica do PT de que o PSDB governa para poucos. ?¿ ANASTASIA: A pergunta é boa porque me permite desfazer algumas lendas. O que é uma política social é aquela que engloba várias outras: saúde, educação, habitação, alimentação e segurança pública. Minas é hoje primeiro estado, pelo Ideb, na educação pública. Saneamento, o próprio GLOBO publicou um ranking em que aparecemos em terceiro lugar. Sou o primeiro a reconhecer que temos de avançar em todas as áreas. Na saúde, conseguimos reduzir a mortalidade infantil e materna a indicadores pelos quais antecipamos as metas do milênio na ONU.

?¿ O GLOBO: E no funcionalismo? ?¿ ANASTASIA: Quando entramos no governo, o estado não pagava em dia, não tinha 13º salário e não havia plano de carreira. Conseguimos colocar tudo em ordem. Podem dizer que é obrigação, mas em 15 anos nunca ninguém havia feito. A remuneração do professor era composta por diversas parcelas, exatamente em razão de 40 anos de confusão, até chegar ao valor de ingresso que é de R$ 935 por 24 horas. É pouco, mas muito acima do piso nacional. Resolvemos juntar tudo numa parcela única e passamos para R$ 1.340, aumento de 40% para 24 horas, e para R$ 1.650 para 30 horas (para efetivar ano que vem).

?¿ O GLOBO: Seu adversário alega que parte dos ganhos sociais do estado se deve a projetos federais.

?¿ ANASTASIA: O país cresceu, é verdade. Mas nós conseguimos crescer mais porque tivemos um diferencial de atuação. Criamos um ambiente favorável ao investimento, onde o estado passou a ser vantajoso pela segurança jurídica, pela estabilidade, pela parceria do governo. O que o governo federal fez aqui? Pagamento dos benefícios obrigatórios por lei, o Bolsa Família, que é um bom projeto. Onde estão os projetos inovadores? O Minha Casa Minha Vida entregou 600 casas no Brasil para os que ganham até três salários mínimos. Nós entregamos 25 mil com recursos do estado.

?¿ O GLOBO: O senhor está gostando de fazer campanha? A mosca azul já o picou? Gosta de palanque? ?¿ ANASTASIA: Eu gosto de fazer campanha. Eu gosto de governo, de administração pública. Mexo com isso há quase 30 anos. Fiz a campanha, em 1990, do Hélio Garcia. Gosto de palanque, até porque sou professor, embora a situação seja bem distinta, o hábito de falar ajuda muito.

?¿ O GLOBO: Que tipo de papel o ex-governador Aécio terá num eventual governo seu? ?¿ ANASTASIA: Ele é o líder político do estado. Não só meu como de um grande grupo. E continuará sendo pelo seu capital político e pelo reconhecimento dos mineiros. Agora o dia a dia do governo será, como já é hoje, de responsabilidade plena do governador. Claro que vou ouvilo, assim como as demais lideranças políticas do estado.

?¿ O GLOBO: O senhor criticou aliados de seus adversários. A presença do senador Eduardo Azeredo, envolvido no mensalão mineiro, em sua campanha o incomoda? ?¿ ANASTASIA: De maneira alguma, ele é senador e candidato a deputado federal. E vai ser um dos mais votados. Esse é um julgamento (de Azeredo) muito subjetivo.