Título: Ouro na areia
Autor: Oswald, Vivian
Fonte: O Globo, 29/08/2010, Economia, p. 35

Economia das praias do Rio já movimenta R$ 7 bi e emprega 200 mil

BRASÍLIA e RIO

Com um Produto Interno Bruto (PIB) estimado em pouco mais de R$ 1 bilhão, a economia que se desenvolve das areias às calçadas ao longo dos mais de 50 quilômetros de praias do Rio de Janeiro vai entrando para a formalidade e ganhando ares de bom negócio, com sustentabilidade. Se incluídas as receitas de hotéis e restaurantes da orla, a chamada economia da praia movimenta pelo menos R$ 7 bilhões ao ano na cidade, de acordo com estimativas do Sebrae-RJ. E deve crescer: a partir de 20%, por ano, com a proximidade da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas do Rio.

Uma força-tarefa iniciada no fim de 2007, a partir de mapeamento do SebraeRJ sobre os negócios da praia e novas oportunidades, começou rearrumando os espaços das barracas na areia hoje padronizadas e numeradas e já envolve em todo o Estado do Rio uma ampla cadeia produtiva de 200 mil trabalhadores diretos e indiretos, de ambulantes a funcionários de hotéis e restaurantes, passando por geleiros, distribuidores de bebidas e alimentos, transportadores, pescadores, massoterapeutas, personal trainers e professores de vôlei e surfe.

Esses grupos dividem e disputam o espaço da praia, que recebe dois milhões de pessoas em um único fim de semana de sol, segundo o Sebrae. E o mais importante: ganham dinheiro.

Cerca de 2.500 barraqueiros, que sequer documentos ou conta em banco tinham, agora possuem CNPJ e recebem empréstimos do Banco do Brasil (BB) para ampliar os negócios. A condição para obter o dinheiro é fazerem cursos de administração das finanças pessoais e de idiomas. O mesmo é feito com dois mil ambulantes que circulam nas areias. Com renda média mensal que chega a R$ 1.200, eles são, agora, oficialmente pequenos empreendedores.

Pescadores farão passeios de turismo

Raimundo Bezerra, de 37 anos, comemora as mudanças. Pegou empréstimo de R$ 5 mil no BB para comprar um baú, acoplado ao seu carro.

Ali, as coisas, agora, vão mais higienizadas e em maior quantidade, sem risco de estragar. Tive que inteirar um pouco. Estou aguardando para fazer o curso de finanças e o de idioma.

Quero fazer inglês, só o basiquinho, para atender melhor os turistas diz Bezerra, destacando que os banhistas aprovaram as novidades.

Um dos fios condutores desse megaprojeto, o BB criou, em dezembro de 2007, o Programa Desenvolvimento Regional Sustentável (DRS) Economia da Praia, implementado por sete agências na Zona Sul. A iniciativa, que tinha como foco os barraqueiros, foi ampliada e firmou parcerias com as associações de comerciantes da praia e de moradores, o Sebrae, a Prefeitura do Rio e o Instituto-e. Todas essas instituições se reúnem semanalmente.

O programa visa a capacitar os pequenos empresários com cursos de empreendedorismo, gestão de fluxo de caixa, associativismo, gestão ambiental e de resíduos. Aos poucos, os negócios da praia estão usando máquinas para ler cartões, o que era impensável.

Mais de R$ 1 milhão em linhas de microcrédito de 48 meses com juros de 0,95% ao mês foram concedidos aos barraqueiros do Flamengo a Ipanema.

A ideia é ampliar as linhas até o Recreio e a outros profissionais.

Para tudo isso, foi preciso regularizar a situação dos comerciantes. O BB diz que o maior problema era a falta de legalização na prefeitura para usar o espaço público das areias. A insegurança e falta de voz levou esses trabalhadores a atuar como gafanhotos: exploravam o máximo hoje, por não saberem o dia de amanhã. Isso contribuía para falta de investimentos e mau trato ao meio ambiente.

O projeto levou os trabalhadores a se organizarem em associações, que formaram a Pró-Rio. Eles ganharam poder de barganha na negociação com o governo e os fornecedores. Já podem comprar mais por preços melhores.

Juntos negociaram ainda com uma marca de cerveja o kit-barraqueiro, que custa R$ 9 mil. A empresa fornece cadeiras e barracas de sol, alugadas na areia. Para não poluir o visual, nada tem logotipo. O presidente da Associação de Comércio Legalizado de Praia, Paulo Juarez da Silva, afirma que a situação mudou e os negócios melhoraram: A associação hoje tem uma sede com computadores. Estamos organizando os nossos negócios.

As ações vão potencializar a qualidade dos serviços, elevar a renda dos trabalhadores, promover o turismo e a proteção ao meio ambiente. Estamos desenvolvendo também um grande plano de marketing diz Sergio Malta, superintendente do Sebrae-RJ.

Diante dos ganhos que poderão ter com a limpeza e a organização das atividades da praia, grandes hotéis e restaurantes da orla começam a se envolver nesse processo.

O ambiente na praia está melhor.

Ainda há muito a ser feito. É uma situação de ganha-ganha para todos.

As receitas de hotéis e restaurantes devem crescer garante o presidente do sindicato de hotéis e restaurantes do Rio, Pedro de Lamare.

Os pescadores de Copacabana são os próximos a entrar no programa. No DRS da Economia da Praia, o BB já iniciou as discussões de um projeto para envolvê-los com o turismo. A ideia é que façam passeios panorâmicos e visitas guiadas na Reserva Ambiental das Ilhas Cagarras, como alternativa aos períodos da baixa estação.

Com recursos da Fundação Banco do Brasil, o Instituto-E também está formando 50 empreendedores da praia (barraqueiros) e 50 trabalhadores em hotéis, quiosques e restaurantes da orla de Copacabana para serem brigadistas do meio ambiente. No dia 18 de setembro, todos os participantes do projeto da Economia da Praia devem se reunir no Dia Mundial da Limpeza no âmbito do movimento Clean Up the World, que tem o Rio como uma das cidades escolhidas este ano.