Título: Ayres Britto: humor fortalece democracia
Autor: Brisolla, Fabio; Souza, André de
Fonte: O Globo, 28/08/2010, O País, p. 12

Com liminar que suspendeu censura, programas humorísticos já prometem campanha mais engraçada

BRASÍLIA e RIO. O ministro Ayres Britto, do Supremo Tribunal Federal (STF), classificou ontem de censura o dispositivo da lei de 1997 que proibia as emissoras de TV e rádio de fazer humor com os candidatos a cargos eletivos durante o período eleitoral.

Segundo ele, a liberdade de imprensa também deve ser aplicada ao humor.

O humor, pelo menos no meu juízo cautelar, é atividade de imprensa. Isso implica uma conjugação de opinião crítica e de arte, de maneira que o humor concorre, e muito, para o fortalecimento da democracia. Isso é sinal de maturidade democrática. Em todo o mundo, o humor é reconhecido como expressão de liberdade de imprensa disse Ayres Britto, frisando que criticar e ironizar são atividades inerentes ao humor.

Anteontem à noite, o ministro deu liminar favorável a uma ação da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert), que pede a revisão de trechos da lei eleitoral aprovada em 1997. Ayres Britto suspendeu o dispositivo que proibia o humor, e esclareceu os limites de outro que impede a veiculação de propaganda política: Proibir propaganda política não significa proibir fazer críticas. Não pode é bancar candidatura explicou Ayres Britto, reforçando que opinar e criticar está liberado na TV e no rádio, desde que não descambe para a promoção de candidaturas.

O ministro pretende levar a ação ao plenário do Supremo na próxima quarta-feira. Frisou que tomou a decisão em 24 horas após a ação ter chegado ao STF: Foi uma decisão em caráter de emergência, porque estamos em campanha eleitoral.

Uma demora poderia significar um prejuízo até irreparável explicou Ayres Britto.

Caricaturas de candidatos tinham saído de cena Na decisão, Ayres Britto destacou ainda a importância da atividade jornalística, inclusive a de cunho humorístico.

Segundo ele, a utilidade social do jornalismo excede seus erros, a compensar, de muito, eventuais excessos desse ou daquele escrito, dessa ou daquela charge ou caricatura, desse ou daquele programa.

Com a suspensão da censura ao humor durante a campanha, os programas humorísticos já preparam alterações em seus roteiros. O Casseta & Planeta, da Rede Globo, pretende resgatar terçafeira as imitações dos presidenciáveis Dilma Rousseff, José Serra e Marina Silva.

Os personagens tinham saído de cena para evitar problemas com a lei que proibia o uso de trucagem, montagem ou outro recurso de áudio ou vídeo que, de qualquer forma, degradem ou ridicularizem candidato, partido ou coligação. A mudança ocorreu após a liminar concedida anteontem pelo ministro Ayres Britto, vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu os efeitos do texto relativo a sátiras em televisão e rádio.

Humoristas comemoram resultado da passeata Uma eventual infração poderia resultar em multa de até R$ 200 mil. O potencial prejuízo alterou os planos do programa CQC, da Band, que descartou o uso de cartuns, como o tradicional nariz de palhaço, inserido sobre rostos de candidatos entrevistados pelo programa.

As brincadeiras voltarão ao roteiro.

Todo trabalho dos cartunistas gráficos do CQC foi anulado nessa primeira parte da campanha. Assim como o efeito broxante da intimidação trazida pela ameaça de uma regra estúpida avaliou Marcelo Tas, apresentador do CQC. Não pretendemos retaliar, chutar baldes, por conta da decisão do STF. Mas apenas voltar ao trabalho, sem neuras de sermos atormentados pelo inconveniente fantasma da censura.

A decisão é uma vitória da democracia, que fortaleceu o princípio constitucional das liberdades de expressão e de imprensa destacou Daniel Slaviero, presidente da Abert, que entrou com a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo.

No domingo passado, os humoristas fizeram uma passeata na Praia de Copacabana contra a legislação eleitoral e conseguiram apoio de entidades internacionais de defesa da liberdade de imprensa, como o Repórteres Sem Fronteiras. Participantes da passeata ontem se disseram surpresos com a celeridade da decisão do ministro do Supremo.

Não esperava uma resolução tão rápida (do Supremo).

Estou feliz, não só pela mudança, mas por sentir que nós, cidadãos, temos o poder de contribuir para a sociedade disse Bruno Mazzeo.

Helio de La Peña, do Casseta, já brinca com a situação: Não imaginava ter uma resposta tão rápida. Não queremos derr ubar governo, nem eleger ninguém, só queremos fazer piada. O próximo passo do movimento dos humoristas é a liberação do beijo gay em novelas, a eleição de uma mulher como Papa e, quem sabe, um travesti na seleção brasileira.

Num dia de piadas pelo Twitter, Helio lançou a candidatura à Presidência do humorista Fábio Porchat, organizador da passeata.

Já comecei a formar meus ministérios de comediantes.

Sérgio Malandro ficará na inteligência do governo e Helio de La Peña será a minha Dilma Rousseff. E, claro, não faltarão aloprados no meu governo anunciou Porchat.