Título: Para além das UPPs
Autor: Batista, Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 31/08/2010, O País, p. 10

Nos últimos dias, os candidatos à Presidência da República fizeram declarações que recolocam a segurança pública como mote das próximas eleições: José Serra prometeu criar o Ministério da Segurança; Dilma Rousseff defendeu a expansão das UPPs para o país como um todo; e Marina Silva propôs investir em inteligência, combater a impunidade e estabelecer um plano de carreira para as três polícias (Militar, Civil e Federal).

No Rio de Janeiro, as UPPs fazem parte do programa de um dos candidatos (Sérgio Cabral) e é um dos temas da campanha eleitoral, como ficou claro após o episódio do Hotel Intercontinental, quando diversos especialistas foram chamados a se posicionar acerca da pertinência de uma UPP na Rocinha como forma de se evitar a ocorrência de novos eventos de natureza semelhante.

Contudo, é preciso ter em mente que as UPPs não são capazes de resolver questões que ultrapassam a prevenção do delito, tais como o que fazer com os criminosos que atuam na área do ponto de vista jurídico-penal. Para isso, os policiais que trabalham nessas áreas necessitam da ajuda de outros organismos como a Polícia Civil, o Ministério Público, o Judiciário e o Sistema Penitenciário. Para que os crimes detectados nessas áreas sejam esclarecidos e os criminosos sejam adequadamente identificados e investigados, é preciso também repensar as atividades de polícia judiciária.

A Polícia Civil necessita de investimentos para que possa ter o seu padrão operacional modernizado. Isso é importante porque, atualmente, no Rio de Janeiro, a taxa de esclarecimento de crimes violentos (como o homicídio doloso) é de 8%. E o tempo que leva para apuração da responsabilidade de um indivíduo é, em média, de 538 dias. Apontar um responsável pela prática de um delito, de maneira rápida e eficiente, é o primeiro passo para que o suspeito de um crime possa ser adequadamente processado e punido pelos demais órgãos que integram o sistema de justiça criminal.

Por fim, é preciso atentar para a importância de políticas de encarceramento que sejam não apenas condizentes com os tratados internacionais, mas que visem ainda à ressocialização e à reintegração do detento à sua área de origem, que, muitas vezes, serão áreas ocupadas pelas UPPs. Apenas dessa forma evitar-se-á a reprodução do círculo vicioso de criminalidade praticada por alguns indivíduos, já que os dados oficiais indicam que 82% dos egressos do sistema penitenciário voltam a reincidir no estado do Rio de Janeiro.

Portanto, para que o próximo governo seja capaz de reduzir os índices criminais, para além do investimento na expansão e melhor atuação das UPPs, será necessário, ainda, um maior investimento nas demais agências que compõem o sistema de justiça criminal. Apenas dessa forma, os crimes e criminosos identificados pelos policiais que trabalham nas áreas atendidas pelas UPPs poderão ser processados, punidos e reintegrados às comunidades pacificadas.

LUDMILA RIBEIRO é socióloga e pesquisadora do CPDOC/FGV

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