Título: Auge do emprego às vésperas do pleito
Autor: Batista, Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 31/08/2010, O País, p. 10

País bateu recorde de vagas formais, e número agora deve crescer menos. É preciso ainda investir em qualificação

Ceará e Goiás estão à beira de entrar em um grupo seleto: o dos estados que têm mais de um milhão de empregos formais. Assim, a dupla vai se somar, até o fim do ano, a São Paulo, Minas Gerais, Rio, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Bahia e Pernambuco este já um neófito entre seus pares, tendo alcançado a marca no governo de Luiz Inácio Lula da Silva. O aumento da lista é uma amostra da forte inclusão de trabalhadores no mercado formal: de dezembro de 2002 a julho deste ano, foram mais 11,089 milhões de carteiras de trabalho assinadas.

Ter o documento criado por Getúlio Vargas assinado ainda é um símbolo de independência financeira e estabilidade. E certamente contribui para uma nota boa ao governo, que se traduz em votos para a candidata do PT ao Planalto. No total, o número de pessoas com emprego formal passou de 23,567 milhões no último mês do governo Fernando Henrique Cardoso para 34,656 milhões no mês passado, incremento de 47% no período.

Isso sem contar o forte crescimento do serviço público, que, se aquece a economia, preocupa alguns especialistas sobre o inchaço da máquina

País tem de resolver problema de qualificação Para completar o bom momento, há um outro fato: o país atravessa um período de crescimento dos salários acima da inflação. Apenas entre 2004 e 2008 últimos dados disponíveis no IBGE , a renda média do trabalhador cresceu 17,3% acima da inflação.

O país vive hoje o auge do seu crescimento na abertura de vagas formais. Acredito que novos empregos continuarão a ser criados nos próximos anos, mas dificilmente serão repetidos os ótimos números deste ano afirma Alcides Leite, professor de economia da Trevisan Escola de Negócios, lembrando que neste ano há uma combinação de forte aumento de consumo, investimentos e habitação.

O economista Marcelo Neri, da Fundação Getulio Vargas (FGV), ressalta que os números de ano eleitoral são geralmente os mais percebidos pelo povo.

E lembra o saldo de geração de empregos formais no país entre janeiro e julho deste ano: 1,65 milhão, o melhor resultado da série histórica para os primeiros sete meses do ano, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).

Alcides Leite estima que os investimentos em infraestrutura e habitação tendem a puxar o aumento de vagas nos próximos anos. Mas, para isso, será necessário resolver o problema da baixa qualificação da mão de obra brasileira: Na mão de obra, o gargalo já começa a ser sentido.

Na opinião de Clemente Ganz, diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o forte crescimento do emprego nos últimos anos mudou até a pauta de luta dos trabalhadores: No governo de Fernando Henrique Cardoso, os sindicatos lutavam para impedir a flexibilização dos direitos trabalhistas.

O discurso é que o emprego formal como conhecíamos estava morto. Hoje, vemos que ele está mais forte que nunca. A luta é por redução na jornada de trabalho, e 97% das categorias, neste ano, conseguiram reajustes iguais ou acima da inflação medida pelo INPC disse.

Formalização, a exemplo de serviço doméstico, é desafio O especialista reconhece que ainda há muito a ser feito, principalmente na melhoria da qualidade da mão de obra e na formalização do emprego. Ele cita os desafios de casos clássicos, como as vendedoras de cosméticos em casa e os trabalhadores que prestam pequenos serviços, por exemplo pedreiros e encanadores de reformas caseiras.

Precisaremos repetir a experiência que facilitou o registro de domésticas explica.

O economista Joaquim Elói Cirne de Toledo, entretanto, é mais crítico em relação a esses números. Para ele, o governo errou ao criar empregos incentivando o consumo, em vez de obter mais vagas com obras de expansão de infraestrutura, ou seja, investimentos: Tínhamos de ter direcionado a economia para crescer com qualidade, com aumento de poupança e investimento.

Além disso, focar na nova economia, em inovação, e não em commodities.

Neri não descarta também o fator Lula no eleitorado: Getúlio Vargas era chamado de pai dos pobres. Lula não é o pai da classe média. Lula é a nova classe média. Um símbolo do sujeito que fez a ascensão social. Não é só a questão do dinheiro no bolso.