Título: Fidel Castro, em versão light, de volta ao púlpito
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Fonte: O Globo, 04/09/2010, O Mundo, p. 30

Ex-presidente faz seu primeiro discurso público em 4 anos, curto e sem abordar questões de Cuba

FIDEL CASTRO fala a milhares de jovens na Universidade de Havana: discurso durou apenas 45 minutos

HAVANA

De quepe e uniforme militar verde-oliva e acompanhado do filho e de um guarda-costas, o ex-presidente de Cuba Fidel Castro discursou ontem pela primeira vez em público desde julho de 2006. Aos 84 anos e recuperado de uma doença - mantida sob segredo de Estado - que o afastou do poder após uma hemorragia intestinal, o ex-líder falou a milhares de jovens na Universidade de Havana, num discurso que, ao contrário de suas antigas oratórias de até cinco horas, durou apenas 45 minutos. A volta ao púlpito, no entanto, não envolveu temas internos, e Fidel concentrou-se apenas em sua teoria de uma iminente hecatombe nuclear.

O ex-presidente falou da mesma escadaria onde, há 60 anos, iniciou sua carreira política. Dali, Fidel alertou sobre a possibilidade de uma carnificina nuclear se, como acredita, Estados Unidos e Israel atacarem o Irã por causa de seu programa nuclear.

- O problema dos povos de hoje em dia, digamos, de mais de 7 bilhões de seres humanos, é impedir que tal tragédia ocorra - afirmou ele. - Coube a Cuba a dura tarefa de advertir a humanidade sobre o perigo real que está enfrentando - disse Fidel, de pé e com uma voz clara.

Cerca de 10 mil pessoas, a maioria delas estudantes, se reuniram sob as escadarias e nas proximidades para ouvir o discurso do homem que comandou Cuba por 49 anos. O pronunciamento é a última das recentes aparições de Fidel. Na Universidade de Havana, a multidão gritava "Fidel, Fidel, Fidel" e aplaudia vários trechos de sua oratória.

Nas últimas semanas, o ex-líder deixou quatro anos de problemas médicos para trás e participou de pequenos atos públicos, incluindo uma sessão especial do Parlamento para discutir sua teoria sobre a guerra nuclear. Ontem, afirmou que "o tempo que a Humanidade tem é incrivelmente limitado", acrescentando que um grupo de ex-analistas da CIA concorda que existe o risco de um ataque americano e israelense contra alvos dentro do território iraniano, o que desencadearia um grave conflito mundial. Para o ex-líder, se a guerra começar, 50% do petróleo mundial pode ficar comprometido, já que o produto é transportado na região onde se daria o conflito.

Mais um dissidente cubano chega a Madri

O comandante de Cuba, que no passado destilava longas oratórias sobre o heroísmo, a revolução, o socialismo, entre outros temas, parece passar por uma fase mais light, falando sobre sua doença, fazendo discurso mais curto e assumindo responsabilidade pelo que considerou errado nos anos em que liderou o país. No início da semana, disse, numa entrevista ao jornal mexicano "La Jornada", que se sente "ressuscitado" após a recuperação de sua doença.

"Cheguei a estar morto. Já não desejava viver... Quero lhe dizer que está na frente de uma espécie de ressuscitado", afirmou ele ao diário.

Numa segunda etapa da entrevista, assumiu a culpa pela onda homofóbica empreendida por seu governo há quase cinco décadas, quando marginalizou os homossexuais e os enviou a campos de trabalho agrícolas forçados, acusando-os de serem "contrarrevolucionários".

Ontem, o ex-preso cubano Alfredo Domínguez Batista, de 48 anos e membro do Movimento Cristão de Libertação, chegou a Madri, acompanhado de sete parentes. Ele é o segundo de um novo grupo de seis opositores ao regime cuja libertação foi anunciada semana passada.