Título: Explicações em pequenas doses
Autor: Guilayn, Priscila
Fonte: O Globo, 06/09/2010, O Mundo, p. 21

A declaração de cessar-fogo que o ETA divulgou, ontem, não faz mais do que confirmar uma expectativa criada, há meses, desde que os aliados sul-africanos e irlandeses da esquerda basca a exigiram, em Bruxelas, em março. No entanto, o comunicado do ETA esclarece pouco, não especifica a duração do cessar-fogo ou o seu alcance. E sequer responde às reclamações dos aliados internacionais da esquerda basca, em março, clamando por um cessar-fogo permanente e verificável por organismos internacionais. Ele tampouco impõe condições. O comunicado é, portanto, o primeiro passo, ao qual se seguirão outros, que deverão esclarecer as grandes incógnitas que o texto de ontem não especifica. Será um processo de explicação em pequenas doses.

O ETA precisava aliviar a pressão que vem sofrendo sistematicamente da esquerda basca desde que, em fevereiro, suas bases aprovaram maciçamente a proposta de Arnaldo Otegi, Rufi Etxeberria e Rafael Diez Usabiaga, de promover um ¿processo democrático por vias políticas e pacíficas¿.

Desde fevereiro até o verão (no Hemisfério Norte) , a pressão foi num crescendo, de tal modo que em alguns círculos se dava por certo que o ETA declararia o cessar-fogo em setembro. A esquerda basca precisava que, agora, o grupo providenciasse o lançamento de uma campanha a favor de sua legalização e, assim, participar das eleições municipais de 2011.

O comunicado do ETA, no entanto, não esclarece mais nada. E pode-se deduzir que não existe no grupo uma posição clara de abandonar definitivamente as armas, condição que o governo impõe para dar credibilidade ao processo e abrir uma nova etapa na qual se abordem questões como o futuro dos presos do grupo.

Tudo parece indicar que, com o cessar-fogo, o ETA quer ganhar tempo para decidir seu futuro: ou curvar-se aos desejos, não só do governo, mas também da esquerda basca de que abandone definitivamente as armas; ou usar esse tempo para tentar rearmar-se, como aconteceu em tréguas anteriores. Tal incógnita faz com que essa declaração de cessar-fogo tenha sido acolhida com enorme ceticismo, em comparação com as declarações anteriores. Nas próximas semanas, as coisas irão se esclarecer.

LUIS R. AIZPEOLEA é articulista do ¿El País¿