Título: Igreja no combate à corrupção
Autor: Augusto, Leonardo
Fonte: Correio Braziliense, 05/07/2009, Política, p. 6

Por orientação da CNBB, padres pedem a fiéis que assinem projeto de lei para barrar a candidatura dos fichas-sujas

Párocos de Belo Horizonte aproveitam as missas para buscar adesão dos eleitores católicos à proposta que já tem 800 mil assinaturas

Os padres brasileiros se transformaram em ¿cabos eleitorais¿ na caça a 500 mil assinaturas de apoio a um projeto de lei de iniciativa popular que poderá revolucionar o processo de escolha do presidente da República, governadores, senadores, deputados, prefeitos e vereadores no país. A proposta impede a candidatura de condenados pela Justiça já em primeira instância, além de tornar o acusado inelegível por oito anos. Cerca de 800 mil eleitores já assinaram o projeto, que pela legislação precisa ter 1,3 milhão de adesões ¿ 1% do eleitorado brasileiro ¿ para ser enviado à Câmara dos Deputados. Hoje, a inelegibilidade ocorre somente depois de esgotada toda possibilidade de recursos à Justiça.

A determinação para que os padres arrebanhem apoio ao projeto partiu do comando da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). O pedido por assinaturas é feito ao fim das missas, sobretudo aos fins de semana, quando é maior a presença de fiéis. Os padres distribuem as fichas de adesão ao projeto e pedem que sejam devolvidas preenchidas no sábado ou domingo seguinte. Com a estratégia, aplicada nos cerca de 40 mil templos que possui no Brasil, a Igreja Católica foi a responsável por aproximadamente 90% das 800 mil adesões ao projeto alcançadas até o momento, conforme dados da CNBB.

Este, no entanto, é o número já contabilizado. Segundo o secretário executivo adjunto da Comissão Brasileira Justiça e Paz da CNBB, Daniel Seidel, um grande volume de fichas já foi enviado à sede da confederação em Brasília, mas ainda não foi somado por falta de pessoal. ¿Estamos precisando de voluntários para ajudar na contabilização¿, declara. Ainda conforme Seidel, o total necessário de adesões será alcançado em agosto. O texto impede ainda a candidatura de ocupantes de cargos nos poderes Executivo e Legislativo que, diante de possível condenação na Justiça, se afastam dos postos para não se tornarem inelegíveis.

O secretário adjunto afirma que a decisão da CNBB em participar da campanha, chamada ¿Ficha Limpa¿, foi uma forma de pressionar para que a reforma política seja realizada no país. ¿Só uma pressão maior da sociedade pode fazer com que o Congresso Nacional se posicione sobre o assunto¿, argumenta Seidel. Mas há ainda outro motivo. Há dez anos foi aprovado pelos parlamentares o primeiro projeto de lei de iniciativa popular, que previa punição para candidatos que utilizavam da compra de votos para se elegerem, movimento também capitaneado pela CNBB. O sucesso da campanha anterior, motivou a atual.

A coleta de assinaturas teve início em maio de 2008. O planejamento da confederação, e das outras 40 entidades que participam da busca por adesões, prevê o envio do texto ainda este ano para aprovação pelo Congresso. Assim, o projeto já passaria a valer em 2010, quando serão eleitos o presidente da República, dois terços do Senado, deputados federais e estaduais.

Assim que chegarem à Câmara dos Deputados, onde a votação será em turno único, todas as fichas serão conferidas. Pela legislação, as adesões a um projeto de lei de iniciativa popular necessitam nome e número do título de eleitor. É preciso ainda que, o 1,3 milhão de assinaturas sejam de moradores de pelo menos cinco estados, com pelo menos 0,3% do eleitorado de cada um. Depois da conferência, comprovado o cumprimento de todos os pré-requisitos, o texto terá que passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Em seguida, vai a plenário. Os passos seguintes são a apreciação, também em turno único, pelo Senado e o envio do projeto para sanção do presidente da República.

Histórico O projeto de lei de iniciativa popular que previa punição para compra de votos foi aprovado com rapidez pelo Congresso. Foi apresentado à Câmara dos Deputados em 10 de agosto de 1999 e aprovado em 21 de setembro. No Senado, a apreciação aconteceu dois dias depois, e a sanção, pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, no dia 28.

Três iniciativas semelhantes ao que está em fase de coleta de assinaturas já tramitam no Congresso. Nenhuma, porém, é de iniciativa popular. Foram apresentadas pelo senador Pedro Simon (PMDB-RS). Uma prevê a inclusão de reputação ilibada entre as condições para elegibilidade. Outra nega candidatura a políticos que respondam a processo judicial. A terceira prevê, além de reputação ilibada, idoneidade moral para candidatos. Os textos foram apresentados em 2007 e 2008, mas, até o momento, não chegaram ao plenário.

O número AMEAÇA 228 dos 594 deputados federais e senadores estariam impedidos de disputar as eleições de 2010 em caso de aprovação, ainda este ano, do projeto de lei de iniciativa popular

ONG defende modificações Jose Varella/CB/D.A Press - 12/3/04 Abramo: propõe barrar os políticos condenados em segunda instância

O diretor executivo da organização não-governamental Transparência Brasil, Cláudio Abramo, defende o impedimento da candidatura de quem foi condenado pela Justiça, mas em segunda instância, e não na primeira, como prevê o projeto de lei de iniciativa popular. ¿Processos judiciais podem ter problemas. É importante que as sentenças em primeiro grau sejam examinadas pelos tribunais de Justiça¿, avalia. ¿É necessário ter mais segurança, já que a decisão é drástica. Para Abramo, o texto, nesste sentido, precisa ser alterado no Congresso Nacional.

O professor de direito constitucional José Alfredo de Oliveira Baracho Júnior acredita que dificilmente o projeto de iniciativa popular será rejeitado pelo Congresso Nacional, principalmente pela pressão da sociedade embutida na iniciativa. ¿Não é fácil conseguir 1,3 milhão de assinaturas. Se não houver problemas formais, como falta de dados de quem assinou o texto, ou informações em duplicidade, são grandes as chances de aprovação da proposição¿, argumenta. Para Baracho, o projeto desfaz uma ¿encruzilhada política¿. ¿O texto resolve um problema (inserido dentro da reforma política) que as instituições não conseguem equacionar¿, diz.

Apesar de estar entre as entidades que pedem adesão ao projeto de lei de iniciativa popular que impede a candidatura de condenados em primeira instância, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) diverge de pontos do texto. Segundo o vice-presidente da seção Minas Gerais da entidade, Luiz Cláudio Chaves, o correto seria a suspensão depois de esgotada a possibilidade de recursos, como previsto hoje. No entanto, a entidade defende mais velocidade no andamento dos processos, o que também está previsto no projeto de lei de iniciativa popular. ¿O que queremos é um aperfeiçoamento do texto quando estiver em tramitação no Congresso¿, afirma. (LA)