Título: Expandindo as fronteiras
Autor: Beck, Martha; Setti, Rennan
Fonte: O Globo, 10/09/2010, Economia, p. 31

Dólar baixo e ganho de renda aumentam viagens e turismo deve bater recorde este ano

Martha Beck, Rennan Setti e Lino Rodrigues

BRASÍLIA, RIO e SÃO PAULO

A entrada de milhões de brasileiros na chamada nova classe média composta por quem ganha entre R$ 1.115 e R$ 4.807 por mês vai fazer com que o setor de turismo bata um recorde em 2010. De acordo com o ministro do Turismo, Luiz Barreto, o total de desembarques domésticos em aeroportos este ano será o maior da história: 63 milhões de passageiros.

No ano passado, esse total foi de 56 milhões. Embalados pelo real forte, os turistas brasileiros também estão viajando para fora como nunca. Os gastos de brasileiros no exterior têm subido mês após mês e, em julho, bateram o recorde de US$ 1,536 bilhão, segundo dados do Banco Central. Nas operadoras de turismo, já há pacotes em falta para o fim do ano para os destinos mais populares, como Buenos Aires.

Este será o melhor ano já registrado para o turismo no mercado interno disse o ministro do Turismo ao GLOBO, lembrando que, dos 63 milhões de passageiros previstos para este ano, entre 10% e 12% são pessoas que nunca haviam viajado de avião. É a nova classe média que tem viajado, especialmente dentro do país. A indústria brasileira do turismo tem um novo segmento que está sendo descoberto.

Preço de passagem cai 40% desde 2002

Até julho, o número de desembarques domésticos registrou crescimento de 33% em relação ao mesmo período em 2009, chegando a 37,2 milhões de passageiros. Já o total de desembarques internacionais somou sete milhões, ficando 23% acima do obtido no ano passado.

A nova classe média também está reforçando o turismo por meio de cruzeiros realizados na costa brasileira, lembrou o ministro. Segundo ele, enquanto em 2009 a ocupação de quartos nessa atividade atingiu 500 mil, o montante deve subir para 750 mil este ano. Barreto afirmou que, enquanto a economia brasileira deve crescer entre 7% e 8% em 2010, o setor de turismo deve ter alta entre 14% e 15%: E esse quadro tende a melhorar ainda mais com a chegada de eventos como Copa do Mundo e Olimpíadas.

Apesar do forte aquecimento do mercado, os preços das passagens aéreas estão mais baixos. Dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) mostram que a tarifa média cobrada pelas companhias aéreas no mercado doméstico está em R$ 269,22 em 2010, quase 40% abaixo da cobrada em 2002, de R$ 444,85. Segundo o ministro, essa diferença se deve ao aumento da competição no mercado: Há cinco anos, duas empresas dominavam o mercado brasileiro, tinham 95% do total. Agora, o mercado está mais equilibrado. Mas isso não quer dizer que não haja margem para novas reduções. As passagens ainda são caras na alta temporada, por exemplo.

O levantamento da Anac apontou queda de 7,72% no valor médio das passagens aéreas entre os meses de maio e junho de 2010, que passaram de R$ 270,27 para R$ 249,40. Este é o menor valor registrado neste ano e o mais baixo desde junho de 2002 (R$ 229,04). Em comparação a junho de 2009, a queda ficou em torno de 6%.

O levantamento da Anac considera 67 rotas domésticas.

As operadoras de turismo comemoram os bons resultados. A CVC, uma das maiores do país, estima que seu crescimento em 2010 será de 20% o que significa que terão embarcado, até o fim do ano, 2,5 milhões de pessoas pela companhia.

A expectativa é dobrar o volume anual de vendas em 2014.

O gerente de produtos da Marsans Viagens, Paulo Pimentel, afirma que a operadora expandiu as receitas em 47% em 2009. Em 2010, espera-se crescimento de 30%.

Com o amadurecimento do mercado turístico, as viagens estão fazendo parte do orçamento doméstico das famílias. Com isso, ocorre o que nunca tínhamos visto antes: o brasileiro está planejando viagens, comprando antes. A maior parte das vendas ainda é feita 45 dias antes do embarque avaliou Pimentel.

Procura grande em pacotes para 2011

Na loja carioca da Stella Barros Turismo, os dois grupos de viagem para o Dia da Criança na Disney (US$ 3.500 por 11 noites, tudo incluído) já estavam fechados. Um terceiro está sob consulta. Segundo o diretor comercial, Ricardo Molter, mais da metade dos pacotes de fim de ano também já foram vendidos.

Na agência SóViagens, não é mais possível comprar pacotes promocionais para o réveillon em Nova York. A situação já é parecida para o feriado de Tiradentes de abril do ano que vem.

A família de Cássio Távora Cavaco, de 53 anos, tem aproveitado a situação econômica favorável nos últimos anos para saciar um desejo antigo: conhecer a Europa. Após a primeira viagem ao continente, em 2005, o destino já se repetiu três vezes. No mês que vem, ele e sua mulher, Rosane, embarcam rumo à Alemanha.

É uma conjunção de fatores.

Nossa moeda está mais forte, estamos ganhando mais e nossos filhos já estão criados. Além disso, como temos mais dinheiro no bolso, os estrangeiros nos tratam melhor durante as viagens. Isso faz com que a gente tenha vontade de voltar disse o engenheiro, cujos destinos, antes de 2005, estavam restritos a países da América Latina.

Agências vendem 20% mais este ano

A queda de preços se reflete também em uma margem de lucro menor das agências. Carlos Alberto Amorim Ferreira, presidente nacional da Associação Brasileira de Agências de Viagem (Abav), queixa-se de que, em 2010, enquanto as vendas devem crescer 20%, o lucro do setor deve ter alta inferior, de 15%.

Ferreira lembra que as agências de turismo não são mais o único meio de o turista programar suas férias. Hoje, as companhias aéreas vendem bilhetes promocionais diretamente ao passageiro, e as operadoras de turismo, que fecham pacotes completos, às vezes sem o intermédio de agências, estão se expandindo. Além disso, a internet tem sido um importante canal de vendas para a atrair o público mais jovem, driblando a figura do tradicional agente de viagens.

A época está boa para o nosso negócio, mas, por causa da concorrência, estamos trabalhando mais e ganhando menos resumiu o presidente da Abav.