Título: O lado bom do dólar fraco
Autor: Bôas, Bruno Villas; Rodrigues, Lino
Fonte: O Globo, 17/09/2010, Economia, p. 33

Desvalorização reduz em R$ 10,8 bi dívidas de empresas brasileiras em moeda estrangeira

RIO e SÃO PAULO

O tombo na cotação do dólar, que tem levado o governo a estudar medidas para segurar a queda, está reduzindo o endividamento das empresas brasileiras.

Segundo estudo da Economática, a desvalorização do dólar a partir de junho encolheu em R$ 10,85 bilhões a dívida em moeda estrangeira de 159 companhias que têm ações em Bolsa. Isso significa que as empresas podem ter ganhos financeiros com a baixa da moeda e aumentar seus lucros no terceiro trimestre.

Segundo o estudo da consultoria, que teve como base o balanço das empresas no segundo trimestre deste ano, o endividamento encolheu de R$ 231,11 bilhões no fim desse período para R$ 220,26 bilhões até a última quarta-feira. Esse recuo ocorre porque uma dívida de US$ 1 milhão, por exemplo, custaria em junho R$ 1,8 milhão para ser paga, considerando a cotação do dólar no dia 30 daquele mês (R$ 1,80). No atual patamar do câmbio (R$ 1,72), pagar essa mesma dívida custará R$ 1,72 milhões.

O dólar desvalorizou-se 4,7% neste terceiro trimestre, a maior queda desde o mesmo período de 2009 diz Einar Rivero, da Economática.

Alex Agostini, da Austin Rating, afirma que as empresas brasileiras tendem a antecipar o pagamento da dívidas para aproveitar o movimento de queda, principalmente as que têm planos de investimento: Essas empresas poderiam, assim, pegar novos empréstimos no próximo ano, quando, acredita-se, as linhas de financiamento devem ser recompostas em volumes e ter prazos mais longos.

Segundo o levantamento, os setores com maior impacto da variação cambial são petróleo e gás (R$ 2,947 bilhões), mineração (R$ 1,438 bilhão), alimentos e bebidas (R$ 1,291 bilhão) e siderurgia (R$ 1,203 bilhão).

Captação lá fora cresce 157% no ano

Individualmente, a maior beneficiada foi a Petrobras. Seu endividamento em moeda estrangeira encolheu R$ 2,93 bilhões desde junho, segundo a pesquisa.

Curiosamente, a capitalização da estatal tem sido apontada como uma das razões para a recente valorização do real, por estar atraindo estrangeiros para o país. Outra gigante, a Vale, também teve um recuo significativo no endividamento: R$ 1,42 bilhões. Segundo Rivero, isso é natural, em vista do tamanho das duas empresas.

Para Roberto Padovani, estrategistasênior do WestLB do Brasil, a folga no caixa pode, por outro lado, incentivar os empresários a buscarem mais financiamento no exterior: É natural agora que o país se endivide mais em dólar, o que vai aumentar a dívida externa privada brasileira.

E isso pode ser perigoso.

De acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), as captações externas de empresas e instituições financeiras somaram US$ 24,2 bilhões nos primeiros sete meses deste ano, 157,84% acima do captado no mesmo período de 2009 (US$ 9,28 bilhões). Se consideradas as captações de agosto até agora, o volume atinge US$ 31,068 bilhões em todo o ano passado, foram US$ 32,18 bilhões.

Segundo a Anbima, com as emissões fechadas este mês, até o dia 22, quando está prevista uma operação de US$ 400 milhões do banco Cruzeiro do Sul, as empresas brasileiras já captaram no mercado externo US$ 4,4 bilhões. Cerca de 70% do montante emitido reforçaram o caixa de empresas como Odebrecht (US$ 500 milhões), Vale (US$ 1 bilhão) e Oi (US$ 1 bilhão). O restante foram captações de bancos.

Na comparação com os primeiros oito meses de 2008, antes do acirramento da crise global, o volume de recursos captados pelas companhias brasileiras triplicou este ano. Naquele período, o total de papéis lançados no exterior somou US$ 11,07 bilhões.

O momento é bastante competitivo diz o vice-presidente da Anbima, Alberto Kiraly.