Título: Assistencialismo está se esgotando
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Fonte: O Globo, 19/09/2010, Opinião, p. 6

A extrema pobreza vem diminuindo no Brasil e há um numeroso extrato social na base da classe média (a chamada classe C) em ascensão.

O crescimento econômico, a geração de empregos formais, a inflação controlada são alguns dos fatores que impulsionam essa melhora.

Mas, embora os indicadores sociais estejam evoluindo, a comparação das versões mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE, chama a atenção para uma tendência que merece reflexão dos futuros governantes do país: o ritmo de redução da desigualdade, medida tecnicamente pelos índices de Gini, está perdendo força. Em artigo no GLOBO, o ex-presidente do IBGE Sérgio Besserman mostra que de 2004 a 2009 esse índice teria passado de 0,547 para 0,518 (quanto mais próximo de zero menor é a desigualdade), uma variação que não é proporcional à redução da pobreza e sensação de mais bem-estar pela população.

Besserman afirma que o impacto positivo dos programas assistencialistas para a diminuição da desigualdade está se esgotando.

Há, inclusive, restrições de ordem fiscal que levam a se prever o esgotamento deste tipo de política.

Diante da perspectiva de continuidade do crescimento econômico, com geração de empregos e inflação controlada, o eixo das políticas públicas deveria se deslocar nos próximos anos do assistencialismo para programas mais estruturantes.

A ênfase na educação e na qualificação profissional é o caminho para que se possa avançar mais na redução da desigualdade, ensina a experiência internacional.

A opinião pública tem cobrado essa ênfase dos governantes, e será difícil que daqui para a frente os três níveis de governo (federal, estadual e municipal) releguem a educação para segundo plano.

No entanto, a tentação para se prosseguir dando prioridade ao assistencialismo permanecerá muito grande, haja vista os dividendos eleitorais que tais programas deverão render no pleito de outubro, como já renderam em 2006.

Mas a tentação política encontrará barreira nos próprios orçamentos públicos. A demanda por recursos governamentais somente aumentará para setores como educação, saúde, infraestrutura e não será possível conciliar tantas prioridades simultaÉ proneamente, pois a carga tributária também atingiu seu limite, o que obrigará os governantes a fazerem escolhas.

Como o assistencialismo não poderá ser abandonado de uma hora para outra, portas de saída terão de ser criadas para que esses programas se esvaziem à medida que a extrema pobreza encolha, e o ritmo de redução da desigualdade volte a ganhar força.

No curto e médio prazos é possível identificar essas portas em oportunidades criadas em consequência de escassez de mão de obra. Para aproveitá-las, as camadas mais humildes da população precisam se qualificar profissionalmente, em todos os níveis, do básico ao técnico. E o esteio de tudo é a educação.

Em suma, como a redução da desigualdade é uma aspiração da população brasileira, o caminho a seguir é o das políticas estruturantes, e não o do assistencialismo puro e simples